Isa Prospero é tradutora, preparadora e revisora.

Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Sou freelancer, então minha rotina depende dos trabalhos que tenho naquele período. Em geral acordo cedo, tomo uma bela dose de cafeína, faço um pouco de exercício físico e adianto os frilas o máximo possível (ou, quando estou entre trabalhos, aproveito para escrever). Tento me organizar para ter os fins de semana livres, daí acordo consigo ler e escrever mais de sábado e domingo.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Com certeza pela manhã! Adoro acordar cedo e começar a fazer coisas o quanto antes. Não tenho um ritual de preparação, mas às vezes escuto músicas que associei a cada história para entrar no clima. Para o projeto atual escolhi uma trilha sonora instrumental, então deixo tocando enquanto escrevo.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Meus hábitos mudaram bastante. Meu primeiro trabalho publicado foi escrito junto com uma amiga e abandonamos o livro na metade por vários meses antes de retomá-lo. Algumas histórias escrevi num período muito concentrado (várias horas de escrita todos os dias), outras – até contos pequenos – levaram semanas ou meses para serem terminados. Participei do Nanowrimo vários anos e descobri que uma rotina de esforço intenso num curto período funciona pra mim, principalmente se eu já tenho um projeto em mente, mas também houve vários períodos em que não escrevi absolutamente nada.
Agora estou tentando manter uma regularidade e escrever – mesmo que só um pouco – todos ou quase todos os dias. Não tenho uma meta em palavras, porque isso varia muito dependendo do dia e do projeto: tento apenas escrever/editar por determinado tempo. Sou mais produtiva quando tenho um período maior disponível, então os finais de semana rendem mais.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Para contos curtos, começo a escrever e vejo onde vai parar. Para qualquer história mais longa ou contos mais complexos, faço um planejamento, que começa com a construção do mundo, se necessário, que é desenvolvido junto com a trama e os personagens, e por fim divido a história em cenas ou capítulos. Também escrevo muitos excertos e diálogos nessa etapa, que podem ou não terminar na história. Pela experiência, vi que esse é o método que funciona melhor para mim: preciso ter uma ideia clara de como os grandes problemas da trama vão se resolver e quais os principais momento da história antes de começar. Caso contrário, geralmente empaco no meio da escrita e tenho que voltar à etapa de planejamento e revisar minhas notas. Passo da pesquisa/planejamento para a escrita quando tenho essa estrutura pronta. Não é muito rígida – sempre descubro coisas durante a escrita, é uma das minhas partes preferidas do processo – mas preciso desse guia para seguir em frente.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Boa pergunta, ainda não tenho uma resposta clara! A procrastinação talvez seja o que mais me atrapalha, pois sou perfeccionista (pior ainda, revisora) e é difícil continuar os primeiros rascunhos sabendo que eles não estão bons, por mais que saiba que isso é parte normal do processo. Quanto não corresponder às expectativas, me preocupo mais quando sou convidada a participar de algum projeto pois não quero decepcionar os outros envolvidos; fora isso, tento não ligar muito se as pessoas gostam ou não das histórias pois é inevitável que alguém vá odiar.
Ultimamente venho combatendo essas travas tentando me focar não em metas específicas (terminar um livro até mês tal ou escrever tantos contos neste semestre) e sim naquela rotina de escrever um pouco todos os dias. Tento só cumprir essa meta diária, sem me preocupar demais com o futuro. Assim é inevitável ir avançando aos poucos e a pressão é menor do que pensando nos resultados, que podem parecer distantes e inatingíveis. Como em geral tenho um outline, também me lembro das cenas que vão chegar e que estou animada para escrever e assim me empolgo para continuar.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Se me deixar, não paro mais – mas hoje em dia foco mais nas etapas de edição, com base nas opiniões de leitores beta. Antes costumava não mostrar meus textos para ninguém até ter revisto muitas vezes. Nos últimos tempos relaxei nesse sentido, especialmente porque tenho três ou quatro leitores betas regulares e experientes que sei que vão me ajudar a melhorar o texto. Percebi que é mais eficaz já ter uma leitura de fora no começo do processo, que vai apontar os problemas maiores, do que ficar editando e revisando algo que talvez precise de uma mudança estrutural.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Os primeiros rascunhos sempre no computador – tenho uma enorme preguiça de passar o texto para a tela. Mas muitas vezes faço o planejamento e a construção de mundo em cadernos, porque consigo me concentrar mais sem as distrações do laptop.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativa?
Não tenho hábitos, mas anoto tudo que me ocorre (ideias de personagens, cenários, tramas ou qualquer outra coisa) num arquivo para não esquecer. Fora pessoas e eventos da minha vida, as ideias geralmente vêm enquanto leio ou assisto outras coisas – talvez pelo meu histórico de leitora e escritora de fanfic, estou sempre buscando caminhos alternativos para as histórias que consumo – e muitas vezes quando leio não ficção (livros de história são ótimas inspirações). Às vezes abro esse arquivo e vejo se posso combinar duas ou mais dessas ideias em uma história.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesma se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
A maior diferença é que, quando comecei a escrever na adolescência e início da idade adulta, não sabia o que estava fazendo em termos de técnica – então o que eu diria, sem falta, é estude escrita criativa. A partir do momento que passei a conhecer mais sobre a forma de histórias, diferentes estruturas, criação e desenvolvimento de personagens etc., meu modo de pensar em histórias mudou completamente e o processo ficou muito mais tangível. Ainda tenho dificuldades, claro, mas esses conhecimentos me deram estratégias para identificar e resolver problemas.
Outra coisa seria me envolver o quanto antes com a comunidade de escrita brasileira. Conhecer outros autores, acompanhar as comunidades literárias e ler as obras dos meus contemporâneos é algo que passou a me incentivar muito a continuar, além de me manter informada sobre as discussões do meio e as oportunidades disponíveis no mercado.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Estou flertando com a ideia de uma novela de fantasia histórica há tempos e espero começá-la em breve, além de muitas outras ideias naquele arquivo que cresce todos os dias…
Não sei qual livro gostaria de ler – em geral descubro lendo mesmo, quando topo com algo que não sabia que queria, mas parece ter sido feito para mim.