Índigo é escritora e roteirista.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Sim, a rotina matinal é sagrada para a minha escrita. Começo com um bom café da manhã, com frutas, granola, mel e uma xícara bem grande de café. Então saio de casa e vou para o chalezinho onde montei meu escritório. Vivo num sítio.
Antes de começar o trabalho de fato, aguo a horta (aqui normalmente tenho ideias para a escrita do dia), em seguida escrevo meu diário, à mão. A escrita do diário funciona como um aquecimento para a escrita literária e como uma maneira de organizar meus pensamentos.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
De manhã. No entanto, se eu dormir após o almoço, posso voltar a escrever na parte da tarde.
Em noites de lua cheia, durmo com um bloquinho ao lado da cama porque é certo que vou acordar no meio da madrugada com um monte de ideias.
Sobre rituais, descobri um truque. Se a escrita está muito complicada, saio de casa e vou para um café na cidade. Nessas ocasiões costumo me vestir bem. Inventar um modelito diferente. Escrever num lugar público normalmente ajuda a destravar a história.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Escrevo diariamente, exceto nos fins de semana. Minha cota de criatividade diária é de duas horas por dia. Num dia de muita fertilidade, chega a três. Sou da linha devagar e sempre.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Para começar é preciso encontrar uma primeira frase convincente. Feito isso, o resto flui. Por outro lado, se você não tiver uma primeira frase poderosa, minha sugestão é começar de qualquer jeito. Não importa como. O importante é começar. Na prática, depois que você termina o texto, terá de voltar para o começo e reescrever inúmeras vezes. Então, tanto faz o modo como se começa. Sobre a pesquisa, ela acontece antes e durante a escrita. Na maioria das vezes, durante.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Vou ao cinema, leio livros que não tem nada a ver com o que estou escrevendo, faço pesquisa. A pesquisa é uma grande chave para resolver o bloqueio criativo. Normalmente, se um autor está bloqueado, é porque ele não tem o que dizer. Nesse caso, vá fazer pesquisa.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Muitas. Muitas mesmo. Não sei dizer quantas, mas reviso no computador, no papel e às vezes leio em voz alta. Faço diferentes leituras, fingindo ser diferentes pessoas. Leio fingindo que sou uma adolescente de 12 anos, ou que sou minha editora, ou minha agente, ou um autor ou autora que admiro muito. Cada uma dessas pessoas trás contribuições importantes.
Quanto a mostrar o texto, só mostro para a minha agente. Ela é sempre minha primeira leitora.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Sempre no computador. Mas a revisão é no papel, de preferência sentada na grama, com as costas apoiadas no tronco de uma árvore.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativa?
As ideias vêm do cosmos.
Para manter a criatividade eu cuido do jardim, varro folhas, podo plantas, cuido da horta, faço mudas. Existe uma relação direta entre escrita e jardinagem. Em ambos os casos, é um ato de criação que exige cuidados diários, dedicação e investigação. No caso do jardim, muitas vezes a questão é a qualidade da terra. Na escrita também. Na maioria das vezes, quando um livro dá errado, a solução está num lugar muito profundo.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesma se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
O que mais mudou é que eu aprendi a reescrever mais, planejar melhor e sair da minha própria cabeça. O que quero dizer com sair da minha própria cabeça? Lembrar que estou escrevendo para alguém. Manter em mente que alguém que não tem nada a ver com a minha pessoinha terá que se conectar com a minha história. O fato de ter estudado roteiro de cinema também teve um grande impacto na minha escrita. Ganhei fôlego. Mas acho importante dizer que no fundo o processo de escrita é sempre caótico. É rocambolesco, bagunçado, cheio de viradas inesperadas. Eu tento me organizar porque sou virginiana e me sinto bem com tudo organizadinho, mas na prática nada acontece conforme planejado.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Gostaria de escrever um livro em forma de diário. É meio brega, mas eu tenho vontade.
A lista de livros existentes que eu gostaria de ler é gigante. Tenho certeza que tudo o que quero ler já está disponível.