Ian Viana é poeta, sociólogo e namorado das Cobras Corais.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Sou um obcecado pela ritualização do cotidiano. Como afirmei em entrevista para Floriano Martins, levanto, bato três palmas para meu Exu, faço minhas orações ao Sol, nosso Astro-Rei, realizo minhas leituras e saio para o dia como quem vai para o Selva. Me imagino como um tupinambá indo para a caça. Me sinto uma criança sonhando com a vida adulta.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Escrevo sempre que a Cobra ensandece no meu ouvido. Não há hora ou lugar. Especialmente no caso dos poemas. Quando se trata de prosa, procuro acender um cigarro, perfumar-me com alfazema e colocar uma bela roupa. Sempre em casa.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Sem metas para escrita. Menos competição e mais contemplação. Procuro ler cada vez mais. Sobre tudo. Busco referências nos que influenciaram meus autores preferidos. “Não siga a pegada dos antigos, procure o que eles procuraram”.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Minha pesquisa acaba atiçando a escrita. É como provocar uma cobra. Ela pode estar ali, quietinha, na dela, descansando em algum vale. Haverá sempre uma criança para brincar com ela, provocá-la, transformar-se em presa. A escrita é o momento do bote.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Já me desesperei. Hoje, sei que, assim como o amor, o processo pode não corresponder às suas expectativas. “Não se mate, Carlos. Sossegue”. O curta “A escuridão do tempo”, de Godard sempre me ajuda nessas horas. Vejam.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Quantas vezes meu Exu achar necessário. Às vezes Oswald aparece em meus sonhos dando alguns conselhos e safanões.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
À mão. Sempre. Sou um conservador, um amante do arcaico, uma força do passado, como diria Pasolini. Sou contra o Mickey pelo Curupira. Pela força do Folclore. Pelas mãos humanas no barro.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativo?
Minhas ideias se dividem em:
Herança e Tradição; Língua e Folclore; Crônica Política; Progresso Social; O livro, o jornal e a revista; A ilustração, caricatura, fotografia e cartaz; Sociologia e crítica; Literatura, Filosofia e Ciência; Artes Plásticas; Música e Dança; Cinema, teatro, circo e rádio; Arquitetura e revitalização urbana; Esportes; Panorama da emancipação nacional.
Meus hábitos se confluem na constante pesquisa sobre esses temas e a subsequente aplicação do colorido tropical ao cotidiano cinza.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesmo se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Fui me tornando amigo das cobras e incorporando o instinto víbora à minha escrita. Galgando dia após dia meu estilo literário. Diria: “mantenha seu coração quente e apaixonado.”
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Quero terminar o processo de revitalização do Setor Comercial Sul (Brasília), do qual sou fiel e militante, o qual se resume em festas, hortas urbanas, cultura e esperança aos esquecidos. Ainda quero fazer um filme. Algo que chegue aos pés de “Dragão da Maldade contra o Santo Guerreiro”, de Glauber. Ademais, quero um livro sobre o Xamanismo dos Moradores de Rua. Se ninguém escrever, terei que fazer.