Homero Silveira Santiago é professor do Departamento de Filosofia da USP.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
No período de aulas, acordo rigorosamente às 5h20, preparo o café e por volta das 5h30 acordo meu filho, que pega a perua escolar às 6h. Assim que ele parte, começo a trabalhar.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Trabalho melhor de manhã, sem dúvida, e aproveito este período para escrever. Normalmente o faço entre 6h e 10h. Propriamente dizendo, não há um ritual para escrever; no máximo repasso algumas notas (de leituras, coisas que me ocorreram, etc.) antes de começar. Até uns dois anos atrás, me era fundamental acender um cigarro, porém parei de fumar e hoje já não me é essencial.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Escrevo aos poucos. Não gosto de escrever por muito tempo, sobretudo porque sei que o resultado não será bom. Não o faço senão em caso de extrema necessidade. Já me aconteceu de ter de escrever por horas a fio, por dias, devido a obrigações.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Na verdade não “me movo”, pois por hábito sempre leio rabiscando o livro/xerox ou anotando coisas. Basicamente, a redação é uma etapa de elaboração dos rabiscos, após – o que para mim é fundamental – traçar um plano do texto a ser redigido; plano que quase nunca é respeitado. A escrita nos traz descobertas importantíssimas sobre nosso desconhecimento de assuntos que imaginávamos dominados.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Não costumo ter “travas”, é sempre meio automático e me esforço em redigir qualquer coisa, ao menos para ser retrabalhado no dia seguinte. O trabalho é de persistência. Ocorre de às vezes ficar muito tempo pensando em que vou escrever, tentando elaborar mentalmente um parágrafo; ou então buscando um termo sem encontrá-lo. Em geral, ao longo do dia surge a solução, estrutura do parágrafo ou palavra; anoto num papel, no celular ou em qualquer lugar, e guardo para repensar no dia seguinte.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Muitas vezes, e nunca acho que estão prontos. Só ficam assim quando o prazo acaba e tenho de entregá-los. Uma mania é, antes de enviar qualquer coisa, ler longos trechos em voz alta. Gosto de ouvir as frases, saber como soam. Quanto a mandar a outras pessoas antes da publicação, considero saudável, adoraria sempre fazê-lo, mas quase sempre é impossível; parte pelos prazos, parte porque acho um abuso ficar mandando coisas para as pessoas lerem (todo professor universitário, creio, já tem um bom número de páginas para ler).
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Sempre começo à mão. Vou entremeando com o computador. Sempre corrijo uma versão impressa.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativo?
Nenhum, e aliás nem me considero criativo; em geral só escrevo a partir de motivações (um livro que, um convite para colóquio, etc.). No máximo, o único hábito que tenho é anotar enquanto leio (ou no livro, ou num papel); é bom por um lado, por outro é ruim porque torna-se difícil respeitar os limites de páginas, sempre há mais material que espaço.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesmo se pudesse voltar à escrita de sua tese?
Antes eu escrevia, reescrevia tudo à mão; o computador entrou em cena e mudou isso. Se voltasse atrás, eu me poria menos dificuldades: quando redigi meu mestrado, sobretudo, ainda tinha ilusões de que aquilo era uma versão final. Hoje aprendi (para o bem ou para o mal) que todo texto é transitório. Não tenho mais ilusões quanto à busca da forma final e nem me aporrinho com isso. Chegou o prazo de entrega, o texto vai embora sem choro nem vela.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
São tantas as ideias que prefiro nem mencionar. Os livros que eu gostaria de ler são exatamente aqueles que (com sorte) resultariam de projetos e ideias que tenho, então igualmente prefiro calar.