Helena Arruda é poeta, contista e ensaísta, doutora em Literatura Brasileira pela UFRJ, autora de “Mulheres na ficção brasileira: aproximações e distanciamentos” (2016).
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Meu dia começa com os movimentos das janelas. Adoro poder abri-las. As janelas me dão a sensação da liberdade, da amplidão do mundo, ou do que me espera do outro lado, no dentro-fora da vida. Como moro nas montanhas, no mato mesmo, necessito ver as árvores, as bromélias e orquídeas, que coleciono. Isso é quase uma oração. Também não começo meu dia sem uma xícara de café e uma passada de olhos pelas redes sociais – o que não é uma constante, já que toma muito do pouco tempo que se tem na vida. E ainda há os e-mails e outros compromissos do dia a dia. Há também uma volta pelo quintal, um olhar mesmo para a natureza e para meus três vira-latas, uma caminhada para pôr ideias em ordem, e mesmo a atividade física para suportar as mazelas diárias. Mas não há uma regra, tudo pode mudar de lugar, de ares, de paisagens. As coisas mudam o tempo todo e isso vai depender de onde estou, dos meus desejos. Na verdade, não sou metódica, não me apego a rotinas, não gosto de regras, sou rebelde e, por isso, sou um tanto caótica naquilo que me proponho a fazer. Mas no fim, ou no começo, depende da perspectiva, sempre me encontro. Acho que as ideias surgem dessa forma, meio despretensiosamente. E, quando surgem, sempre busco uma forma de anotá-las, de não me desgrudar delas. Parece antiquado, em tempos de tanta tecnologia, mas gosto de andar acompanhada dos meus bloquinhos de papel. Então acho que capturo imagens e consigo transferi-las de alguma forma para o papel. Isso não deixa de ser um método. Mas na minha escrita tudo se move, como na minha vida. Gosto de poder migrar, da liberdade que conquistei.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Não tenho rituais de preparação. A escrita vem, às vezes devagar, noutras, como uma enxurrada, um “brain storm”, mas aí é a hora de anotar e de selecionar o que vale. Na poesia acontece muito isso. Não há hora ou lugar para o poema.
Quanto ao horário de escrita, acho que de manhã produzo mais e melhor. Estou mais ativa, mais desperta, mais animada mesmo. Sinto que também depois das 17 horas até de madrugada são horários em que minha atividade cerebral está mais intensa e o desejo de produzir aumenta. Durmo muito pouco. Leio muito. Leio todos os dias. Especialmente ficção e poesia. Mas também leio crítica literária, filosofia e teoria. Acho que a escrita vem de muitas fontes, mas, sobretudo, das leituras, e há leituras que me fazem escrever palimpsesticamente, como um desdobramento mesmo. Isso ocorreu comigo quando fiquei um mês sem voz, após uma cirurgia para retirada de um nódulo, daí que devorei alguns livros, entre eles, Tropical sol da liberdade, da Ana Maria Machado. Naquele momento, a escrita dela me provocou tanto que escrevi meu primeiro livro de poemas, Interditos, lançado pela Editora Batel, em 2014. Ler Tropical sol da liberdadefoi como expurgar a minha dor junto com a da personagem central, que por coincidência tem o meu nome. Enfim, escrevo desde a adolescência, mas só a partir dessa experiência, tive vontade de me dizer, ou de dizer meus próprios “interditos”. Fui produzindo o livro como uma forma de respostas às minhas próprias interrogações. Ele foi sendo gestado devagar, seja por uma frase que me despertava, por uma palavra, por uma cena que imaginava, por fragmentos. Escrita é isso: imaginação. A técnica acho que vem com o tempo, com o amadurecimento. Acho que o que mais interessa ao escritor é o motivo, o que desperta o desejo de registrar, de não perder as ideias, de querer mesmo aprisioná-las no papel. Contudo, as experiências de vida são fundamentais. Viver intensamente experiências, sejam quais forem, é agregar ideias, imaginação, criatividade. Não acredito que a escrita se dê apenas na reclusão da mesa de trabalho, mas, essencialmente, no mundo. O “teto todo seu” a que Virgínia Woolf se refere é mesmo fundamental, principalmente se se quer viver da escrita, todavia, sem as experimentações, a meu ver, de nada adianta a solidão necessária para a criação. Escrever é ir e voltar. É uma gangorra. É movimento. E, como diz o poeta André Ricardo Aguiar, de quem “roubei” o verso que está na minha tese de doutorado, num poema e também tatuado no meu braço: “Toda palavra é cicatriz”.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Não tenho metas diárias, mas estou tentando impô-las, agora que terminei meu doutorado. Na verdade, tenho alguns livros que já moram em mim há alguns anos, projetos que vou retomando devagar: meu primeiro romance, ambientado em Buenos Aires, um livro de contos, que está um pouco mais adiantado e um infanto-juvenil, todos iniciados antes ou durante o doutorado e interrompidos pelas pesquisas acadêmicas. Há também um de poesia a ser lançado ainda em 2019, pela Patuá, sob as bênçãos do Eduardo Lacerda, que tem um trabalho primoroso e é um dos grandes editores do Brasil na atualidade. Tenho mesmo muita coisa a ser feita e no meu caos quotidiano, tento achar uma ordem, porque ainda há a questão da política brasileira, da militância e da resistência aos mecanismos autoritários do poder, desde que o governo atual vem promovendo uma série de abusos, a exemplo do que vem ocorrendo com a cultura, a pesquisa, a educação, o meio ambiente, e não dá para fingir que nada está acontecendo no país, pois, antes de tudo, acredito no caráter ético, social e político da literatura, e não apenas no seu caráter estético. Além de ser mãe e querer um país melhor para as gerações atuais e futuras, fui também professora da iniciativa privada e da pública do estado do Rio por muitos anos. Profissionalmente, apesar de ter amado o que fiz, o processo de escrita estava sempre sendo postergado por ter que lecionar em muitas escolas e em muitos horários. Hoje quero que a escrita seja realmente um ofício e estou batalhando muito para isso. Acho que estou no caminho e que posso conseguir um lugar no sol dos trópicos, porque a vida é mesmo tecida de realidades ficcionalizadas.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Mover-me da pesquisa para a escrita não é fácil, mas, de verdade, acho muito prazeroso, pois é possível vislumbrar o momento da concepção, da gestação, do crescimento e do nascimento da narrativa, do enredo e das personagens, seja no conto ou no romance. E para quem já trabalha com pesquisa acadêmica, acaba sendo um pouco mais fácil, talvez, no quesito, compilação, método. Contudo, acho que para além da tomada de notas, da pesquisa, o problema crucial é a criatividade mesmo. A imaginação é fundamental, pois muitas vezes o excesso de pesquisa pode interferir no processo criativo, colocando travas e bloqueios, deixando-nos muito mais à mercê do real que da própria ficção. Acho que é uma questão de ponto de vista, do tipo de conto ou de romance que se vai desenvolver. Acho que a fase mais difícil da escrita é escolher por qual caminho seguir, montar a estrutura narrativa: enredo, personagens, tempo, o ponto de virada, caminhar para o final. Se for um romance histórico ou com dados históricos, há que se ter uma pesquisa mais apurada sim. Tudo dependerá da proposta de cada escritor. Na verdade, iniciar, para mim, é a parte mais difícil, saber exatamente sobre o que se quer escrever e se manter sem cair nos lugares comuns, nos clichês. É um trabalho exaustivo, muitas vezes, feito sobre apagamentos e reescritas, regado a cafés e a vinhos.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Atualmente lido bem com qualquer trava na escrita, porque acho que faz parte do próprio ato de escrever. A gente trava mesmo, é natural, depois destrava e segue e a coisa flui. Acho que é assim, como é na vida. A vida é feita de tropeços e caminhadas. Não seria diferente na produção da ficção. Procrastinar também faz parte, porque às vezes é o cansaço, o desânimo ou outros fatores, como algum problema de saúde, que chegam sem pedir licença e devastam sua vida. Também os filhos, a família, e mesmo os amigos, demandam muito, cobram sempre sua presença nos eventos, sua companhia. Escrever é um ato solitário e não é fácil estar sozinha com tantas demandas, sem contar as mídias sociais, tão necessárias na atualidade para o escritor divulgar seu trabalho e conhecer trabalhos novos, estar em contato com os leitores, com escritores, com os editores etc. O mundo te convoca o tempo todo. O escritor revela sua humanidade justamente no medo da solidão, na ansiedade de não dar conta de projetos longos. Eu mesma tenho três projetos ficcionais pela frente e mais a tese de doutorado, que a banca de professores sugeriu a publicação, como foi com minha dissertação de mestrado, que rendeu o livro Mulheres na ficção brasileira: aproximações e distanciamentos, também pela Batel. No momento procuro editora especializada para uma possível parceria, pois edições pagas são caríssimas, gerando ainda mais expectativas e maior ansiedade no escritor e/ou no pesquisador, pois vender livros atualmente num país com uma economia falida, como a brasileira, não tem sido tarefa fácil, principalmente quando lemos nas mídias que tantas livrarias conceituadas estão fechando suas portas, decretando falência, infelizmente. É desolador e deprime. Mas escrever é mais forte e independe de fatores externos. É uma necessidade, um vício. Acho que quando ponho minhas verdadese minhas mentirasno papel, expurgo todos os meus fantasmas, crio um universo paralelo. Criar universos bonitos ou feios é um ato de coragem e, nesse sentido, talvez, o escritor se sinta um pouco semelhante a deus. Capaz de atos de coragem. No meu caso, gosto de saltar de abismos para ver o que há lá onde antes eu não tinha acesso, ver o que há lá embaixo, o que há no escuro, no vazio, onde, antes do salto, eu não poderia enxergar. Trabalhar com projetos longos é isso: é saltar constantemente, não ter medo de altura. É consequência de escolhas. Lido bem com as escolhas e com as consequências. Sou uma mulher que sempre busco a liberdade, seja onde for.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Reviso inúmeras vezes, mas como escritora, com apagamentos e reescritas. E, apesar de revisar textos alheios, é impossível revisar o próprio. Sempre há muita parcialidade no olhar. Hoje sou mais exigente com isso, porque já ocorreu de publicar e depois encontrar algo a mais ou que poderia ter sido escrito de outra maneira. Tem aquela máxima de que quando o tempo passa, você relê e pensa: como foi que usei esta palavra, ou como não vi tal erro, sei lá… acontece. Na verdade, vejo que aquela história de tomar certa distância do texto e abandoná-lo por um período, antes da publicação, funciona mesmo.
Ultimamente, com a maturidade, tenho compartilhado textos com amigos da área, sejam em prosa ou poesia. Acho bem importante uma opinião alheia, um novo olhar. Sou muito aberta às críticas que me façam crescer enquanto pessoa, enquanto escritora. A história é mesmo ler, reler, escrever, reescrever até ter a certeza de que está pronto.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Antes escrevia em cadernos, blocos. Já tive dois moleskines que ganhei da minha mãe. Amo moleskines, mas de alguns anos pra cá, meu notebook é meu maior aliado. Tenho uma relação de amor e de ódio com ele, porque, às vezes, ele encrenca comigo e eu com ele, mas a praticidade de poder escrever, de reintroduzir palavras, expressões ou frases, apagar, trocar de lugar, mudar tudo, se for necessário, é um facilitador, o que não significa que abandonei o papel. Meus poemas continuam firmes no papel, aliás, em qualquer papel que esteja próximo de mim, na hora que bate aquele desejo de externar um sentimento do mundo. Em guardanapos de bares, por exemplo, sou mestra. Também sou mestra em perder muitos poemas, esquecidos dentro de livros, em bolsos de casacos, no fundo de uma bolsa. Meu caos interior faz isso comigo, confesso. Outro lugar onde meus poemas se escondem é em contracapas de livros, em espaços de livros que leio e com os quais dialogo. Outra forma de escrita que tem me ocorrido muito ultimamente é pela imagem, pela fotografia. Seja clicada por mim ou por outros, seja profissional ou não, a fotografia tem me levado ao texto. Uma relação que descobri bem recentemente e que tem me dado alguns textos mais intensos.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativa?
Minhas ideias vêm de várias fontes, além de frases impactantes, de leituras, de constantes diálogos com a literatura, elas vêm da observação do mundo, das pessoas, das viagens, daquilo que se apresenta como novidade diante do meu “novo” olhar também, da natureza, do caos urbano, das obras de arte, da fotografia, como disse anteriormente, da memória. Aliás, a rememoração é uma constância nos meus escritos. Outra fonte são os amigos, diálogos, as vivências com pessoas que me são especiais têm sido uma fonte inesgotável de ideias, com outros escritores, outros poetas, as trocas, as experiências de vida mesmo.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesma se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Do início até aqui, acho que não mudou só a escrita, mas, especialmente, a percepção do mundo. A maturidade traz esse olhar de uma pessoa mais vivida, mas calejada, mais velha, mais experiente. É um processo natural eu acho. É um amadurecimento conjunto: da mulher e da mulher que escreve, que pesquisa, que trava inúmeras lutas na vida, que batalha diariamente para se manter. Da mulher que necessita mostrar que veio, que chegou seu momento. Sou aquela escritora que sabe que há o momento de escrever e de abandonar o poema, ou o conto, ou o romance. Deixar que amadureçam para voltar a eles, sem a pressa da enxurrada, mas sendo um riacho que corre entre as pedras, lapidando-as.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Um projeto que ainda vou fazer é de levar livros a lugares onde não há acesso. Estou trabalhando nisso, buscando parcerias. Fundar um projeto de rodas de leitura para populações carentes, especialmente para mulheres. Trabalhei com jovens por trinta e dois anos. Agora quero trabalhar com mulheres em situação de risco e com imigrantes também. Levar leitura a essas pessoas. No mais, é terminar os livros que iniciei. Quero ler uma infinidade de livros que existem e ainda não consegui. Mas, sem pretensão, o meu romance é um livro que quero ler, por isso estou escrevendo. Há um ditado que diz: se ainda não há o livro que gostaria de ler, escreva o seu próprio. Mais ou menos isso. Risos!
Ao dar início a um novo projeto, você planeja tudo antes ou apenas deixa fluir? Qual o mais difícil, escrever a primeira ou a última frase?
Cada projeto é um novo desafio. Acho muito mais difícil iniciar do que dar continuidade, ou pôr o ponto final, e, por isso, sou mais de deixar a escrita fluir, mas é necessário ter, minimamente, um esquema interno ou mesmo no papel, um roteiro do que se deseja, no caso da prosa. A verdade é que escrevo todos os dias, sejam frases soltas, ideias, versos ou poemas inteiros, não passo um só dia sem escrever, e sem ler. Entretanto, não faço planos de escrever tantas laudas por dia, ou de escrever de forma sistemática, como alguns fazem, porque comigo não funciona, especialmente se for poesia. A poesia é que chega até mim. Eu nunca a procuro. Ao contrário, às vezes, até fujo dela.
Como você organiza sua semana de trabalho? Você prefere ter vários projetos acontecendo ao mesmo tempo?
Eu simplesmente não organizo, mas preciso muito começar a fazer isso. Gosto de ter vários projetos acontecendo concomitantemente sim, porque acho interessante ir costurando tudo, ou trocando as agulhas conforme o tecido. Muitas vezes é necessário tomar distância de um projeto para voltar a ele depois. Nesse entremeio sempre surge algo novo: algum convite para palestra (já fui duas vezes à Fliminas para falar de literatura), tenho sido convidada para publicar em revistas literárias, como a Gueto, a Ruído Manifesto, a Bibliofilia Cotidiana, e, recentemente, a Ser MulherArte, também para algumas antologias, entre outros convites que vão surgindo. Na época do meu doutorado, por exemplo, eu dei início a três projetos, como disse na outra entrevista, e consegui concluir o livro de poemas Corpos-sentidos (prelo), Patuá. Esse livro foi acontecendo dentro de mim, paulatinamente, como um presente, e uma necessidade. Os outros projetos eu começo a retomar agora, pois a prioridade à época era a escrita da tese. Contudo, iniciei 2020 trabalhando intensamente e consegui escrever meu quarto livro, o terceiro de poemas: A mulher habitada [ou: cadernos do fim do dia], que será diferente dos outros, porque vai dialogar com outras artes, como ilustrações, ou fotografias, (ainda estou em processo de decisão). Acho bem interessante todas as possibilidades artísticas.
O que motiva você como escritora? Você lembra do momento em que decidiu se dedicar à escrita?
A leitura é um grande motivador, mas há outros, como o sentimento do mundo, já diria Drummond. Nasci com uma espécie de inquietação. A escrita me chama, eu vou. Quanto ao momento em que iniciei, foi na adolescência, mas, profissionalmente, iniciei somente em 2014, quando tive coragem de dar aquele salto no abismo e publicar meu primeiro livro.
Que dificuldades você encontrou para desenvolver um estilo próprio? Alguma autora influenciou você mais do que outras?
Acho essa pergunta super interessante e importante, porque a cada novo projeto a gente vai mudando, vai amadurecendo não só na idade, mas no processo, na feitura de tudo. Com a escrita, não é diferente. Com esse quarto livro, A mulher habitada [ou: cadernos do fim do dia], ainda sem editora, fui descobrindo uma outra forma de escrever poesia: muito mais imagética. Percebi que minha poesia foi amadurecendo à medida que eu necessitava buscar certas imagens fora de mim, para depois trazê-las para dentro. Colocá-las ali, bem no centro do poema. Essas imagens desfilam pela mitologia grega, pelo patrimônio cultural e imaterial do Brasil, pelas montanhas e pelo mar, pelas cidades caóticas, pela zona rural e também pelas margens. Quanto às influências, todos nós as carregamos, não há como fugir. Sou devota do Drummond, da Hilda Hilst, do Quintana e de muitos outros (as) poetas. Acho difícil listar. Na prosa, muitas autoras e autores me influenciam também. Então vou citar alguns autores nacionais que considero fundamentais: Clarice Lispector, Machado de Assis, Graciliano Ramos, Lima Barreto, Guimarães Rosa. Na literatura recente, destaco Elvira Vigna como uma das minhas autoras prediletas.
Você poderia recomendar três livros aos seus leitores, destacando o que mais gosta em cada um deles?
Claro! Mas não é tarefa fácil elencar apenas três, porque são inúmeros os livros que me rondam quotidianamente, sejam em prosa ou poesia, sejam de teoria literária ou de filosofia. Enfim, vou eleger três romances da literatura brasileira.
A paixão segundo G.H., de Clarice Lispector, por ser um romance que sempre me leva a mergulhos profundos, abrindo caminhos para mecanismos intrínsecos da psique, abordando temas como o medo, a solidão, a morte, o abandono, a superação. Clarice contribuiu enormemente para minha formação enquanto leitora e escritora.
A ficcionista, de Godofredo de Oliveira Neto, porque no romance o leitor pode percorrer os árduos caminhos de como escrever ficção, já que o romance traz à baila importantes recursos metaficcionais, ou seja, a personagem central é uma ficcionista. O autor aponta de forma divertida e até irônica, temáticas fundamentais da teoria literária, incluindo a morte do narrador e do leitor. É um livro que subverte.
Como se estivéssemos em palimpsesto de putas, de Elvira Vigna, por trazer à tona relações humanas em todas as suas fragilidades e complexidades: a personagem central narra seus encontros com prostitutas a uma colega de trabalho. Ou seja, as personagens vignianas são sempre homens e mulheres com os quais nos deparamos quotidianamente nas ruas, no trabalho, na sociedade, enfim. Gosto dessa da forma livre e fluida da escrita de Vigna. Li todos os seus romances. Também li todos os romances godofredianos. Recomendo toda a obra de ambos os escritores.