Gustavo Jugend é poeta e contista, autora de Arabesco e doutorando em filosofia pela UFPR.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Fala José! É um prazer poder conversar com você sobre literatura. Eu começo meus dias de maneira muito banal. Levanto cedo e ando um pouco até uma panificadora onde como um misto e tomo um café, de preferência forte. Depois trato de trabalhar na minha pesquisa em filosofia que é o que anda colocando pão (mas nem tanto) na mesa. Mesmo assim, sempre deixo um documento em branco pronto, caso a escrita poética possa aparecer.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Olha, se dependesse de mim, o mundo funcionaria de madrugada; uma médica esses dias me chamou de noturno, e eu, claro, pensei no Fagner.
Não, eu não tenho nenhum ritual. Só tento deixar meus sentidos e meu ânimo alerta, nunca sei quando um texto pode eclodir.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Eu me esforço em escrever todos os dias, até pra não perder a relação com a palavra. Mas nem sempre é possível. De toda a forma, a leitura de poesia é diária; religiosamente.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Minha escrita “científica” é resultado de muita leitura, e muitas anotações. Depois é tudo corte e costura. Mas te confesso que que muitas vezes a sensação é a de estar fazendo às vezes de Atlas.
A da escrita literária não tem planejamento nenhum. Sempre que planejei o texto, seja conto, seja poema, foi um fracasso. Eu escrevo de enxurrada, e talvez por isso os textos sejam curtos, e por isso eu tenho tanto trabalho na revisão. Faço uma primeira versão do poema com “um filete de sangue nas gengivas”, me afasto por um tempo, e depois faço um trabalho de engenharia, tentando dar ritmo, melodia, substituindo palavras mal colocadas e períodos mal formulados. Normalmente, só depois disso dou um título ao texto.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Mal. Meu analista é um herói. Mas é importante, como disse, sempre escrever, mesmo que seja para apagar. A palavra tem de sempre estar na carne.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Reviso algumas, tudo depende. Mas conversar com alguém antes de publicar é essencial pra mim; sobretudo por sofrer de péssima autocrítica. Eu sempre acho que meu texto é terrível.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Eu não escrevo nada à mão, sobretudo por não entender minha própria letra. Comigo é, de preferência, no computador.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativo?
As ideias para os textos literários podem vir de qualquer lugar. Não que eu ache que qualquer coisa é arte, mas nunca sei o que pode me despertar a palavra. Um dos casos mais inusitados foi um poema que nasceu de um verso de uma música do Johnny Cash que eu sempre entendia errado. Um dia me dei conta e transformei o verso errado em verso meu.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesmo se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Com o tempo meu texto passou a ter menos trama, e mais imagens, imagens impregnadas de afeto. Alguém disse que hoje sou mais poeta que contista, mas essa diferença, no limite não se mantém. Mais que demais, acho que meu texto tem melhorado.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Eu gostaria muito de um dia escrever uma novela, ou mesmo um romance. Já tive várias ideias, mas nunca foi pra frente. Acho que é culpa das enxurradas.