Guilherme Jardim Duarte é PhD student em Princeton.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Eu não tenho uma rotina matinal sempre. Ultimamente ando passando a noite em claro trabalhando, porque estou trabalhando num projeto interessante e quero terminá-lo logo. Em meus momentos mais disciplinados, porém, minha rotina matinal é fazer um café e já começar a escrever.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Eu sinto que trabalho melhor bem de manhã, embora eu não faça isso sempre. Não tenho um ritual claro, eu basicamente sento ao computador e começo a escrever. Tento desligar as redes sociais, porque sei que elas afetam minha ansiedade de escrita e eu perco tempo procrastinando.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Escrevo em períodos concentrados. Dito isso, ando escrevendo muito todos os dias porque estou com algumas ideias interessante que estou explorando. Não tenho meta de escrita, porque devido ao meu método, eu passo muito mais tempo editando que escrevendo. Pra ser sincero, eu tenho algumas metas de redução de páginas. Há dois anos atrás, descobri que escrevia demais e ao estabelecer um número máximo de páginas pra mim mesmo, meu processo de corte de palavras tornava o texto mais claro. Essa tática funcionou pra mim, não sei se funcionaria para os outros.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Isso é contra manuais acadêmicos, mas eu escrevo antes mesmo de coletar notas (ou baixar dados, criar gráficos). Sinto que se me coloco a fazer o contrário, eu começo a ter problemas com ansiedade de escrita, e passo a procrastinar. Fazer notas e ler artigos é muito mais fácil, então meu problema é que eu passo a fazer só isso e deixo de escrever.
Algumas vezes, eu empaco em algum problema teórico ou, como trabalho com metodologia, em algum teorema que eu não consegui provar, algum dado que faltou. Nesse momento, eu paro a escrita, resolvo o problema, e só então, eu volto a escrever.
Há outra coisa, muitas ideias boas eu só tenho ao escrever. Então começar antes de coletar notas é uma forma de ajudar minha pesquisa.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Eu sou bastante ansioso, então tenho problemas com isso o tempo todo. Algumas táticas pessoais:
a) Desligo redes sociais.
b) Coloco na cabeça que o ótimo é inimigo do bom, então prefiro ter algo a entregar que não ter nada. Sei que a probabilidade de eu ter algo excelente aumenta conforme a minha quantidade de escrita. Já ocorreu várias vezes de pessoas adorarem um texto que eu achei que estava péssimo, ou o contrário, achei que estava perfeito, e todos detestaram. Então de certa forma, as minhas expectativas não são boas preditoras de qualidade. A boa notícia é que as pessoas tendem a esquecer as coisas ruins que você fez e a se lembrar das boas, então no final esta estratégia funciona.
c) Paro de pensar e me obrigo a ir pra frente do computador. Se percebo que empaquei em alguma sessão, começo a escrever outra. Se não estou conseguindo nenhum dos dois, deixo o computador e passo a escrever a papel e caneta. Não consigo entender claramente a razão, mas sinto que se trabalho em coisas diferentes ao mesmo, rendo mais.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Muitas vezes. Pra mim, é a parte principal. Eu passo muito mais tempo editando, revisando, que propriamente escrevendo. É uma das minhas formas de lidar com ansiedade também. Às vezes, escrevo bastante sem mesmo saber direito o que estou escrevendo, e depois edito. É neste momento que eu penso que tenho minhas melhores ideias.
Eu também mostro meu trabalho pra outras pessoas. É fundamental isso. Às vezes, há coisas que eu deixei passar, alguma expressão em que fui muito agressivo, etc. Meus amigos conseguem identificar erros que eu não conseguiria. Também passo bastante tempo lendo artigos de amigos e conhecidos.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Tenho uma ótima relação. Escrevo no computador. Utilizo editores de terminal no linux. Uso software de controle de versão, como o git. Sempre que escrevo uma nova sessão, faço um commit e subo para o github. Todos os meus textos estão lá (em repositórios privados). Ter um controle de versão é ótimo, sobretudo para o processo de edição, e como edição é 90% do meu processo de escrita, isso se torna fundamental.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativo?
Sinto que tenho boas ideias ao tentar analisar artigos de outras pessoas e tentar formalizá-los. Tento pensar na teoria, em elementos que possam estar faltando. É muito comum achar alguma coisa relevante que passou despercebida e a partir daí consigo criar algo novo. Outra fonte de ideias, que é algo relacionado ao que eu falei, é tentar replicar análises de dados de outras pessoas. Sempre encontro algum problema.
Uma forma de me manter criativo também é tentar aprender novas metodologias, novos modelos de análise. Ao reescrever uma coisa em uma linguagem equivalente, sempre é possível identificar problemas que não tinham sido percebidos antes.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesmo se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Eu diria a mim mesmo “não pense, escreva”. Eu tinha muita ansiedade, procrastinava mais, e comecei a desenvolver minhas próprias técnicas pra lidar com isso.
Outra coisa que me ajudou na escrita científica foi ter trabalhado com jornalismo, porque me impulsionou a escrever de maneira clara.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Tenho várias ideias que eu gostaria de tocar e não o faço porque não tenho tempo. Estão anotadas num repositório que tenho aqui. Defino minha prioridade de acordo com o impacto que eu acho que esses projetos terão. Alguns eu também apelo para coautoria. Chamo algum amigo interessado para escrever.