Francisco Gomes é poeta e músico, autor de “O Despertar Selvagem do Azul Cavalo Domesticado” (2018).

Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Por ser autônomo, a não ser que aconteça algum imprevisto, sempre leio e faço anotações depois do café. Essa é minha rotina matinal.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Quando se trata de Poesia, que é o meu caso, não existe um horário específico. Como a Poesia vem antes do poema e por ser a revelação do Inesperado, então respeito e obedeço ao fluxo natural do que chega pra mim através do “De repente”, do “Susto”, do “Inesperado”, do “Desconhecido”. Não quero dizer com isso que sou refém da “inspiração”. Não tem nada a ver. Apenas quero dizer que, diferente de uma crônica, que basta ter um tema para desenvolvê-la, a Poesia está num local especial — não quero dizer que seja algo divino ou superior — e que não depende de um tema para ser materializada. Não faço poema por encomenda. A Poesia acontece. E pronto. Quando meu “transbordamento poético” acontece, costumo fazer algumas anotações, como frases e palavras soltas. Depois, sem pressa, vou realizando a feitura do poema, lapidando… Esse processo de feitura — que alguns chamam de “transpiração” —, dependendo de como a Poesia se revelou, pode demorar até três anos. Tenho poemas guardados que ainda não considero prontos. Estou sempre pesquisando, lendo, contemplando… A Poesia é exigente e, mesmo urgente, não tem pressa. Meu ritual é não ter pressa.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Vai depender do meu “transbordamento poético”. Ultimamente, estou tentando concluir outro livro de poemas que iniciei há três anos. Tem poemas que fiz em um dia, mas tem outros que levaram meses e anos. Com Poesia, feliz ou infelizmente, não dá pra ter meta de escrita diária. Assim penso e vivencio na prática.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
O interessante é que comigo, não sei dizer o porquê, os poemas que faço são para serem publicados em livro, em conjunto. Todos os meus livros, até agora, surgiram de “sopros epifânicos”: temas e estruturas dos poemas. Sempre estou escrevendo um livro de poemas, ou seja, cada poema escrito se torna um fio condutor para o próximo poema. E os poemas “solitários”, aqueles que “destoam” do Todo, guardo ou publico em revistas, jornais, sites, coletâneas etc.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Comigo não tem essa de procrastinação ou medo de não corresponder às expectativas. Sobre a ansiedade, sou ansioso por natureza (risos). Lidar com a Poesia é o que mais gosto de fazer. Tudo tem seu tempo. Tudo tem sua hora. Tudo tem sua vez. Assim também é com a Poesia. Ela acontece, aí eu aconteço.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Inúmeras vezes. E considerados prontos também. Além de revisar, quase sempre modifico alguma coisa: verso, palavra, pontuação…
Além de rigoroso com o meu trabalho poético, não mostro para ninguém antes de publicá-lo nem durante a feitura.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Não tenho nenhum problema com a tecnologia, mas para mim é prazeroso escrever. Papel e caneta são companheiros inseparáveis. Só utilizo o computador quando os manuscritos estão concluídos.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativo?
Realmente, não faço a menor ideia. Mas acredito que a sensibilidade ajuda muito. E sobre cultivar algum hábito para se manter criativo, não tenho. Apenas procuro fazer, na medida do (im)possível, aquilo que gosto, por exemplo: música, livros, café e cinema (não necessariamente nessa ordem).
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesmo se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Acredito que quase tudo. Quando do processo de escrita do meu primeiro livro — Poemas Cuaze Sobre Poezias —, eu tinha uma ânsia inexplicável para “terminá-lo”. Com o passar do tempo, ainda bem, pelo menos pra mim, não sinto a necessidade do imediato em “terminar” ou publicar um livro. Sem mencionar, é claro, o próprio estilo de escrever, que vai apurando até chegar ao ponto de alguém ler um poema e, de imediato, identificá-lo como seu, ou seja, a sua identidade está impressa no que escreve. Se eu pudesse voltar à escrita dos meus primeiros poemas… sinceramente, eu não diria nada. Faria tudo de novo. Digo isso sem modéstia e sem arrogância.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Recentemente, há alguns meses, relancei em formato digital o CD “Diafragma – Poemas em áudio”. Eu gostaria de repetir a dose, mas agora com material inédito. Quem sabe em 2021 o “Diafragma II” aconteça…
Um livro que eu gostaria de ler e que não existe… (risos). Quando concluí a leitura de O Arco & A Lira, de Octavio Paz, pirei. Ficou aquele gostinho de “quero mais!”. Seria maravilhoso poder ler um “O Arco & A Lira II”.