Flor Priscila é escritora e compositora.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Começo meu dia procurando o que comer. Costumo dizer que meu dia só começa quando eu como alguma coisa. E desse momento em diante eu nunca sei o que pode acontecer. Minhas atividades são sempre variadas pelos caminhos entre trabalho, estudo e escrita.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Na verdade, eu não tenho nenhuma hora do dia específica para escrever. Quando tenho algum tempo vago durante o dia, me concentro em como estou emocionalmente, se meu corpo está disposto, se eu sinto que tenho palavras presas. Eu não diria que é um ritual, mas costumo ter uma jarra de água por perto sempre que vou escrever por um longo tempo. Sinto uma sede absurda quando estou criando alguma coisa.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Escrevo com mais profundidade em períodos concentrados quando se trata de romances e contos. Quando começo algum projeto novo mergulho naquele universo por dias, meses e até anos. Claro que, ao longo do tempo, surgem novas ideias, novos projetos e textos mais curtos. Já com textos em versos, eu tenho maior facilidade de adaptar o processo de escrita e revisão ao cotidiano acelerado. Não que poemas sejam mais “fáceis” de modo geral, mas numa fila de banco eu tenho maior facilidade em escrever versos, por exemplo, do que imaginar um novo capítulo de um romance. De qualquer forma, cada texto é um texto, entende? E mesmo quando eu me forço a escrever um pouquinho todos os dias, cada texto tem seu modo especial de vir ao mundo.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Meu processo de escrita não segue um padrão. O processo do meu primeiro livro de contos, chamado “A Marcha das Efêmeras” e o processo do romance “Uma Bandeira para Carlito”, demandaram energias, memórias, sentimentos e ritmos totalmente diferentes. Para mim, a memória é um gatilho para novas narrativas. Eu gosto de escrever partindo de recordações de pessoas, lugares, cheiros.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Sinceramente, eu não me cobro muito quando sinto que não tenho nenhuma ideia borbulhando na cabeça. Busco estimular minha criatividade com atividades físicas e artísticas. E procuro nas pessoas, nas ruas ou na natureza aquele detalhe que pode vir a desencadear uma ideia. Mas, tento barrar qualquer tipo de pressão negativa. Aprendi a respeitar meu corpo, minha sensibilidade. Escrever não é tão fácil quanto o senso comum prega, quem escreve sabe disso. Eu acredito que é justamente por isso que a pressão negativa não gera um bom material.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Reviso muitas vezes. Desconfio de tudo o que escrevo. Não mostro pra ninguém antes, quando eu acho que está “no ponto” eu mostro para alguém próximo e publico nas redes sociais.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Antigamente, quase todos os meus textos eram rascunhados e finalizados no papel. Eu só digitalizava o texto já pronto. Hoje, com a correria, o notebook e o celular são grandes parceiros.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativa?
A maior parte das ideias nascem de minhas memórias (lugares, pessoas, cheiros, sabores, encontros e desencontros). Acredito que a leitura do mundo é o principal hábito de quem trabalha com a escrita. Como eu não tenho um ritmo de vida que me permita escrever todos os dias no mesmo horário e no mesmo lugar, aprendi a memorizar os ambientes e pessoas para rascunhar depois. Ler muito, de tudo um pouco, é minha dica para se manter criativo.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesma se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Adquiri mais confiança e mais ousadia com o passar do tempo. Para a Flor dos primeiros versinhos eu diria “leia mais, acredite mais, ouse mais e respeite seu corpo e seus momentos de silêncio”.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Um projeto que tem me tomado muitas horas de reflexão é a biografia do meu pai e da minha mãe. Ambos nasceram na Bahia e viram em São Paulo uma oportunidade de melhorar a vida. Retirantes que não foram pincelados. Aos dezoito anos de idade, meu pai saiu da Bahia num pau-de-arara e chegou em solo paulistano com o coração cheio de esperança. Minha mãe tomou o mesmo rumo. São histórias que eu sinto que tenho que contar.