Flávia Drummond Naves é escritora e psicanalista.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Sim. Acordo cedo e costumo ler ou escrever, antes de tomar um café e sair de casa.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
As manhãs me inspiram mais. Às vezes, escrevo à noite também.
Tenho alguns rituais de preparação para a escrita: a solidão, a leitura e a paisagem são essenciais pra mim. A paisagem pode ser a luz da manhã, a vista de uma pequena janela ou o interior da casa. Depois que começo a escrever, me distancio das pessoas naturalmente. A escrita me toma e fico muito envolvida nesse processo.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Leio todos os dias, mas escrevo mais em períodos concentrados, principalmente nos finais de semana.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Giorgio Agamben nos diz que para o escritor e o pesquisador é importante “a experiência de mergulho nas névoas da investigação c seus manuscritos ilegíveis”.
Escrevo na medida que leio. O meu pensamento conversa com o autor: concorda, discorda, articula ideias com outros autores e assim vai se desdobrando. Faço marcações, anotações no próprio livro ou num caderno de escrita.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Começo sem muitas idealizações, depois vou relendo e retificando. Faz parte do processo se perder nas investigações, mas a escrita me faz avançar. É uma experiência de ato poético que se desenvolve a partir da própria escrita. Escrever cria trilhas, inventa um caminho.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Reviso muitas vezes e sempre mostro para algumas pessoas antes de publicá-los. Esses primeiros leitores têm uma distancia maior da obra e ajudam o autor a experimentá-la de outra forma.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
O gesto da mão que escreve é importante para mim. Sinto o meu corpo mais envolvido na experiência poética. Utilizo o computador num segundo momento.
Quando escrevo artigos e tenho prazos curtos para cumprir, utilizo mais o computador porque facilita o meu trabalho de edição.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativa?
Filmes, livros e músicas são importantes para me manter criativa. Antes de me isolar para escrever, gosto de estar entre as pessoas, fazer interlocução com os colegas, ler e escutar experiências diferentes. Frequento lugares que valorizam a arte, a cultura e especialmente a literatura. Participo de saraus e oficinas de escrita. As viagens também me inspiram muito.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesma se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Acho que me tornei mais concisa. Com o tempo, conquistei a capacidade de transmitir de forma mais clara, sem perder a intensidade. Os primeiros textos foram importantes nesse processo e, se voltasse atrás, diria a mim mesma para não desistir. O trabalho frequente com a escrita e a leitura faz avançar.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Já escrevi poesias, contos, artigos e uma novela. Ainda não escrevi um romance. Gostaria de fazê-lo um dia. Quem sabe?
Acho que existem muitos livros que ainda não li. Uma vida não seria suficiente para ler os bons livros do mundo e os que ainda estão para nascer. É um processo infinito. Além de cada um de nós, os livros se desdobram de uma vida à outra, eternamente.