Filipe Mattos de Salles é fotógrafo, cineasta e professor do Instituto de Artes da UNICAMP.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Normalmente não tenho rotina fixa, faço as coisas conforme a necessidade e a oportunidade, mas como agora minhas duas filhas são pequenas, acabo entrando numa certa rotina que, acredito, seja passageira. Só o tempo dirá.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Sem dúvida à noite. Mas por causa das crianças, acabo tendo que escrever durante o dia também. Não há um ritual específico, apenas a maturação prévia do texto, que fico desenvolvendo antes de sentar e escrever.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Geralmente em períodos concentrados, pois só sento para escrever quando sinto que a ideia está madura, então durante o processo de maturação não escrevo a não ser tecnicamente, ou quando absolutamente necessário. Por conta disso, não posso ter uma meta diária, tenho apenas uma meta do conjunto, que é terminar o texto.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Para mim este processo é puramente mental. Leio muito sobre determinado assunto, tento esgotar determinadas possibilidades pensando sobre o assunto e, quando sinto que as ideias estão maduras, sento para escrever. Nesta hora, o mais difícil é a primeira frase, mas depois o resto deslancha com certa facilidade, porque já tenho em mente onde quero chegar. Para ajudar a começar a primeira frase, geralmente escrevo vários começos até achar um que me satisfaça. A pesquisa tem que estar pronta na minha mente, só aí eu sento para escrever e, neste caso, não tenho dificuldade.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Durante o processo de escrita não tenho problemas de travas, porque já tenho a ideia pronta, e a procrastinação geralmente acontece na etapa anterior, que é a da leitura e de desenvolvimento mental do texto. Às vezes as leituras são muito densas e saturam, então preciso parar e fazer outra coisa, até as ideias assentarem. Não tenho medo de não corresponder às expectativas porque as expectativas são apenas minhas, então depende de mim chegar onde eu quero. Se não correspondeu, sei que foi negligência própria. Projetos longos e curtos para mim não têm diferença no processo, porque trabalho da mesma forma, procuro desenvolver mentalmente antes a organização das ideias, e depois escrevo. No caso de projetos longos, a única diferenciação é que ele acaba saindo em etapas divididas.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Reviso várias vezes, sempre que termino um parágrafo releio, e mesmo assim de quando em quando faço leituras de partes e do texto todo, até sentir que está tudo ok. Normalmente não mostro a ninguém, mas não teria receio de mostrar se alguém quisesse ver. Apenas é um trabalho pessoal e, como ainda estou digerindo, não acho saudável ficar pedindo opiniões. Mas reitero que não teria problemas em mostrar.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Hoje faço tudo no computador. E tem coisas que faço diretamente em plataformas online (nuvem) como o Google Docs ou o OneDrive. Não tenho qualquer problema com a tecnologia, e mesmo meus rascunhos são eletrônicos. Esboços de ideias muito preliminares, que só tenho uma possibilidade de título, aí eventualmente anoto. Mas é raro.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativo?
Imagino que minhas ideias venham do mundo das ideias e do inconsciente coletivo. Ou, segundo as modernas teorias físicas, do holograma quântico, que é na verdade a versão das ciências físicas para explicar as informações e o conhecimento depositado no inconsciente coletivo. Fora isso, são articulações de coisas que eu ouço, leio e vejo, e procuro relacionar entre si, baseado em alguma problemática arquetípica.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesmo se pudesse voltar à escrita de sua tese?
Muita coisa mudou: minhas ideias estão mais seletivas, meu estilo literário está mais refinado e, conforme escrevo, vou melhorando – acho. Se eu pudesse voltar à escrita da minha tese, não sei o que mudaria, porque ela me pareceu bem completa para o que eu pretendia naquela época. Tão completa que até hoje escrevo sobre os paradigmas que mencionei na ocasião. Claro que as ideias acabam se refinando, e tudo o que escrevo depois são decorrências desta ideia original.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Escrever uma história da mídia, e um ensaio sobre a inspiração artística. Gostaria de ler algum livro que contasse a história épica de alguma civilização alienígena, mas que não fosse uma ficção.