Fernando Raposo é escritor e ilustrador.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
A vida familiar nos condiciona a certos hábitos. Acordo antes das 6h e com os filhos em idade escolar, seguimos a rotina tradicional de toda família. Depois de cumprida esta primeira etapa do dia, posso me dedicar ao trabalho.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Sem sombra de dúvidas, sou mais produtivo durante o dia, em especial, pela manhã. Além de escritor, também trabalho com ilustração e direção de arte e já perdi a conta das ocasiões em que tive que “varar” a noite trabalhando…
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Depende. Não tenho metas estabelecidas, mas quando certos momentos da trama se consolidam em minha mente, escrevo com mais afinco. Quando idealizo um projeto, não sei ao certo como tudo será desenvolvido. O protagonista inicia sua jornada de um jeito e termina, muitas vezes, de uma forma completamente diferente do que imaginei. Escrever é um barato por conta dessa assimetria. Escrever não é uma linha reta.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Se uma ideia surge, eu anoto. Aquela pequena nota, pode evoluir, ou não. Antes de cada capítulo eu faço um esboço, uma pequena “timeline”. Este rascunho é a minha base para o capítulo que irei escrever. Pesquisar é relativo. Eu pesquiso quando, em algum momento, a minha história se encontra com algo que transcende o imaginário. Não há limites para a ficção, mas quando utilizamos elementos que fazem parte de nossa vida real, é sempre bom tomarmos o cuidado de uma pesquisa prévia.
“Hollen – Anjo Caído” (2015), foi o livro que mais consumiu horas de pesquisa.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Ao longo do tempo, as “travas” diminuem. Pelo menos acontece comigo. O meu primeiro livro foi sem sombra de dúvidas um grande laboratório. Tive um bloqueio criativo que durou alguns meses. Inicialmente me preocupou, mas quando desatei o “nó”, conseguir dar sequência ao projeto sem interrupções.
Quando se é um autor independente, ou seja, sem amarras contratuais, a procrastinação não pesa tanto, uma vez que não há cobranças externas. Ser independente, se por um lado, pode lhe conferir algum conforto, no que diz respeito a cobranças, noutro lado, pode lhe dar um arrefecimento criativo. A disciplina precisa ser levada a sério. Quando escrevo e soluciono os problemas dos personagens, penso nos leitores e imagino se tais soluções são razoáveis.
A ansiedade vai chegando com mais força durante o ápice da trama.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Sempre reviso o que escrevo. Escrever é reescrever. A quantidade de vezes é relativa.
O meu primeiro livro “Hollen – Anjo Caído”, por exemplo, passou por diversas revisões. Ele foi publicado em 2015. Em 2017, passou por uns ajustes, percebidos por leitores e parceiros literários. Atualmente, estou revisitando a obra, porque o livro vai completar cinco anos em 2020 e estou preparando uma segunda edição. Estou “atualizando a escrita”. Não gosto do termo “edição definitiva”, mas acredito que depois deste novo pente fino, o livro chegará bem próximo do ideal.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Interessante sua pergunta. Às vezes o trabalho só evolui com papel e caneta (risos). “Hollen – Estrela da Manhã” (2018) foi escrito à mão! Parece improvável, mas foi assim que aconteceu.
Gosto do papel e da caneta. Além dos livros, escrevo contos e geralmente, eles nascem no rascunho à mão.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativo?
Não tenho uma fórmula para as ideias. O que eu posso dizer é que uma ideia puxa a outra, ou seja, acredite nos “insights”. Já tive boas ideias com o meu filho pequeno no colo, o pondo para dormir, lavando a louça do café da manhã.
Se eu pudesse ser um pouco pragmático, diria que você precisa estimular o seu cérebro às ideias. Leia mais e leia autores diferentes, gêneros diferentes. Veja mais filmes e se atenha aos roteiros e suas soluções. Você vai alinhando o seu “motor”, ou seja, o seu cérebro a este universo de criatividade.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesmo se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
O meu “eu” de agora não é igual ao meu “eu” de outrora. O que eu quero dizer com isso? Nós mudamos. Com o tempo (isso é natural), a escrita evolui. A forma como desenvolve os personagens e suas personalidades vai se aprimorando.
Estou revisitando o meu primeiro livro (mencionado anteriormente), e estou mexendo bastante. Não estou alterando a trama, mas fazendo um belo polimento nas palavras.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Fazendo um resumo de minha jornada literária. gosto muito da ficção religiosa. A série “Hollen” é formada por “Hollen – Anjo Caído” (2015), “Hollen – Estrela da Manhã” (2018) e pelo inédito “Hollen – Espírito da Verdade” (ainda sem data de lançamento). Criação Divina (2017) é um “spin off” desta série também trabalha o gênero da ficção religiosa. TRAGO (2017) é uma fantasia urbana, explorando a paranormalidade e ocultismo.
Atualmente, trabalho em meu quinto livro, “O Primado Cavalariano” (2020), uma ficção fantástica medieval, inspirada nos jogos de RPG.
Estou satisfeito com o trabalho que faço, mesmo sendo um autor independente.
Não vou negar que almejo uma parceria com alguma editora tradicional, mas entendo que o mercado vive uma grave crise.
Gosto de ler, mas confesso que leio menos do que gostaria. Os livros de fantasia (e os seus subgêneros) me arrebatam.