Fernanda Chazan é escritora de livros infantis, juvenis e new adult.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Levanto cedo, dou play em alguma das minhas várias playlists de música instrumental e preparo um belo café-da-manhã. Para mim, é fundamental alimentar-se de maneira saudável se queremos começar o dia com o pé direito. Como tranquila, sem pressa, e em seguida dou início à minha rotina de cuidados. Escovo os dentes, lavo o rosto, passo meus creminhos diurnos e protetor solar. Visto-me como se fosse sair para trabalhar na rua, é meu compromisso comigo mesma, já que sou minha própria chefe. Depois, arrumo a casa e levo minha cadela para passear. Só então me sento no meu escritório, consulto minha agenda e começo a cumprir as tarefas do dia. Não consigo fazer nada sem antes cuidar dos meus templos: meu corpo e minha casa.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
De manhã e à tarde. No meio tempo, paro para fazer um chazinho, um café ou uns bons mates argentinos. Tomar infusões quentes me fazem sentir melhor. Também paro religiosamente ao meio-dia para cozinhar meu almoço, sempre visando uma alimentação equilibrada e saudável. Comer porcarias, para mim, é enfiar goela abaixo o bloqueio criativo. Para escrever, procuro estar em silêncio absoluto e com o celular em outro cômodo da casa. Também acendo velas e incensos sempre que posso.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Tento escrever quatro dias por semana. Sempre em algum dos dias úteis, agendo o que tiver para fazer longe de casa. Assim resolvo tudo de uma só vez e, no resto dos dias, posso trabalhar tranquila. Reservo os fins de semana para estar com minha família, ir ao teatro, ao cinema ou a uma exposição de arte. Raramente escrevo aos sábados e domingos. Quanto às metas de escrita, sim, tenho metas de escrita diária. No entanto, trato de não enlouquecer caso uma vez ou outra não consiga cumprir com o número de palavras estipuladas. A escrita, acima de tudo, tem que ser prazerosa. O mundo já nos causa muitas dores de cabeça. Que a arte não seja uma delas!
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Faço outlines de cada um dos personagens principais e, também, da história geral. Antes de começar a escrever, estudo os temas que irei abordar como pano de fundo. Busco bibliografias confiáveis e raramente consulto a internet, exceto em casos específicos. Leio enquanto vou montando os outlines e marco com post-its os pontos que certamente terei que consultar em algum momento futuro. Ao longo da escrita, sempre que tenho dúvidas, recorro aos post-its, às anotações e, caso seja necessário, releio o livro que tomei como referência.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Acredito que a insegurança e o medo são nossa maneira boicotar nossos sonhos e projetos. Já bastante escutamos palavras de desincentivo provindas dos outros, é importante que não sejamos mais uma voz nesse coro de boicote. Quanto à procrastinação… simplesmente sento o bumbum na cadeira e faço o que tenho que fazer. A escrita é meu trabalho. Se um médico não exerce a medicina não pode ser considerado médico. Se um arquiteto não exerce a arquitetura não pode ser considerado arquiteto. E se um escritor não exerce a escrita – que me desculpe quem discorda – não pode ser considerado escritor. A procrastinação, para mim, é sinônimo de irresponsabilidade. É claro que uma vez ou outra, temos problemas pessoais que nos fazem desanimar e diminuir o ritmo de trabalho. Isso é compreensível, é lógico, e a pausa nesses momentos é necessária se quisermos manter nossa saúde mental em bom estado. Quando falo de irresponsabilidade, refiro-me ao “ah, mas posso fazer amanhã, então deixo para depois… hoje vou ali ver uma série na Netflix”.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Muitas, muitas, muuuuuitas vezes! Quase sempre mostro meus textos em português à minha amiga pessoal e admirável escritora, Carolina Mancini. Já os textos que escrevo em espanhol, mostro à minha noiva, que é argentina e também escritora.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Tenho meus bons e velhos caderninhos, canetas coloridas, post-its e uma lousa na qual faço linhas do tempo e escrevo tópicos importantes que me guiam ao longo da escrita. Mas o livro, de fato, escrevo todo no computador.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativa?
Minhas ideias vêm de todos os lugares, cada experiência que vivencio, cada história que escuto e cada lugar que visito. Acredito que a criatividade está ligada à saúde, em todos os aspectos, portanto trato de cuidar da minha saúde mental e emocional – fazendo terapia junguiana –, da minha saúde física – mantendo uma vida ativa e uma alimentação equilibrada –, da minha saúde intelectual – estudando, lendo e nunca deixando de aprender –, e por fim, mas não menos importante, da minha saúde espiritual – acendendo velas, incensos, agradecendo ao Universo e tratando de me conectar com as energias criadoras diariamente.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesma se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Evolui muito, não somente como escritora, mas também como ser humano. Na minha opinião, a maturidade na escrita caminha de mãos dadas com a maturidade pessoal, na relação que temos com o mundo, a natureza e as demais pessoas. Se tivesse que dizer algo à Fernanda do passado, diria “dê tempo ao tempo, seja paciente, as coisas irão melhorar”. Isso se aplica à escrita e à vida como um todo.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Tenho projetos na manga, mas tento não pular etapas para não alimentar a ansiedade. A paciência é amiga da bela criação artística. A ansiedade, não. De qualquer forma, posso adiantar: tenho trabalhado em alguns projetos em espanhol, tratando de me jogar no mercado hispano-americano, tão cheio de pluralidade. Mas é claro que jamais deixarei de escrever em português. Este mês, inclusive, lançarei meu novo livro infantil em São Paulo, “Melissa e o Ogro Vegetariano”. Afinal, a boa filha à casa torna. Mesmo que seja para uma visita rápida. Quantos aos livros que gostaria de ler e ainda não existem… agora fiquei sem resposta. Honestamente, não sei.