Edison Freitas é escritor, assina como Evandro Lopes.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Minha rotina como escritor é de saltos diários, não há um horário específico, embora, à noite, eu reserve algumas horas para escrever.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Tudo depende do momento. Quando a ideia surge, vem sempre numa onda frenética e eu tenho de me entregar a isso e registrar o máximo possível. O processo nunca é o mesmo. Às vezes, vou escrever já com o corpo do texto pronto, de cabeça, noutras vezes acontece de algo me inspirar: alguma coisa dita por alguém, um evento na rua, ou mesmo coisas intrínsecas minhas que me motivam: angústias, reflexões sobre a vida, uma paixão, ou mesmo tentar registrar o momento social, onde tento usar todos esses elementos juntos, e mais a crítica, seja à falta de humanidade ou mesmo para relatar ou chamar a atenção para um fato que me indigne ou me encante. Não existe uma explicação clara, vai acontecendo e deixo-me levar pelo estímulo, sem contestá-lo. Depois, sim, racionalmente verifico se o que escrevi tem alguma chance de se transformar em literatura, e então é muito trabalho de reescrita. Se existe uma fórmula, é a seguinte, para mim, ao menos: nunca desperdiçar uma inspiração. Registre-se tudo, depois se faz a triagem do que “presta” ou não.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Como disse, primeiro a ideia e o registro. Isso acontece em algumas horas. Após, quando me proponho a editar um livro, trabalho durante quatro horas, geralmente entre sete e onze da noite, seis dias por semana. Durante o dia, com o texto impresso, releio e faço anotações à caneta.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Meu jeito é um tanto caótico, as coisas vão acontecendo. Não aconselho a ninguém fazer o mesmo.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
A procrastinação acontece quando estamos inseguros se o que estamos escrevendo tem validade. Se tivermos certeza de que o texto tem valor, se não literário, pelo menos humano, isso nos dá motivação de fazê-lo melhor. Aprendi que devemos escrever inicialmente para nós e saber que o escritor nunca é um ser único, ele tem muitos dentro de si; quando se escreve com esses “muitos” certamente agradaremos a muitos e a outros não conseguiremos tocar. O leitor tem classificações que não podemos atingir ao mesmo tempo. Existe o leitor que lê por entretenimento, outro pode ser aquele que deseja uma boa conversa com o autor e ainda há aquele leitor crítico, que além de entreter-se e, portanto, desejar uma boa história, também é crítico em relação à forma (esses são os mais difíceis de agradar, pois têm muita leitura e acabam relacionando o nosso texto aos de grandes escritores. E os grandes escritores são, na maioria, intimistas e sobretudo subjetivos. Esses leitores são, normalmente, pessoas de mais idade, acostumados aos clássicos. Leitores jovens já têm uma dinâmica diferente, preferem o objetivo ao subjetivo.) Difícil é agradar a todos, o melhor é, sabendo-se disso, termos uma boa história – de preferência dinâmica e com um subtexto – , um relativo domínio do idioma, alguns conceitos básicos de forma e por fim desenvolver um estilo próprio. A ansiedade quanto aos textos mais longos se aplica quando este texto é complexo e tem profundidade psicológica. A técnica, para quem tem, facilita, pois existem métodos a serem seguidos que ajudam bastante.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Normalmente tenho colaboradores, pessoas em quem confio e recebo suas opiniões e críticas de bom grado. Aliás, a humildade faz com que cresçamos nesse aspecto. Eu, particularmente, aceito até mesmo as críticas negativas, nas quais percebo uma intenção de desmotivação. Mesmo assim, retiro disso algo que me possa fazer evoluir. Pois não acredito que esteja pronto e desconfio de que nunca estarei.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
No computador.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativo?
Isso é algo inexplicável. Porém, como já me referi, às vezes sinto necessidade de expor meus pensamentos sobre situações que me incomodam, como, por exemplo, a situação do país, ou mesmo em relação ao comportamento humano, mas tento fazer isso ficcionalmente, nunca de forma direta, panfletária. Sempre há algo de mim mesmo nisso tudo, embora, ao cabo, eu não consiga me ver claramente, pois fui além de mim, incorporando aspectos de outros tantos, quando introjeto os seus sentimentos e jeitos de ser.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesmo se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Agora me sinto mais crítico de mim mesmo e acredito que estou aprendendo a conter meus impulsos. Contendo-os, acredito que esteja me tornando mais claro e objetivo. Mas ainda não completamente. É necessário um bom talento para se dizer o muito no pouco. Ainda não cheguei lá, mas persigo esse objetivo.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
No meu caso, um romance que seja absolutamente realista, franco e honesto. Excelentes romances já existem, basta ler Saramago, Dostoiévski, Faulkner, Graciliano, entre outros.