Diego Fortes é diretor, ator e dramaturgo.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Assim que eu acordo, trato de fazer o café para mim e minha esposa. Logo, arrumo a cama, guardo as roupas e sapatos – deixo as coisas em ordem. Comecei por necessidade, mas percebi que as tarefas mecânicas eram uma boa maneira de alinhar as ideias. Geralmente, faço tudo isso ouvindo música ou notícias. Este breve exercício de organização ajuda bastante em épocas ansiosas.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Nunca entendi bem por quê, mas acho que eu escrevo melhor e mais profusamente nas últimas horas da tarde e começo da noite. Quanto ao ritual, acho que o máximo que eu faço é buscar isolamento. Não gosto que me vejam escrevendo. Quando eu escrevo em algum lugar público, sempre me sinto fazendo algo ilícito. Como o que eu mais escrevo é para teatro, sempre me pego dizendo as falas e fazendo careta na frente do papel ou da tela.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Não escrevo todo dia e escrevo mais quando tenho que escrever. Só pensei em metas com a corda no pescoço. Eu entendo e admiro os escritores que se propõe uma meta de páginas por dia, mas não funciona comigo. Me sinto muito mal quando pressinto que o que eu estou escrevendo é mais volume do que conteúdo. Me dá medo de ser chato. Aliás, tenho essa teoria de que escrever mal cansa muito mais do que escrever bem.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Quando há um objetivo bem delineado como escrever uma peça, acho que eu passo 90% do processo criativo lendo, pesquisando e pensando, pensando… Saio para andar, lavo louças, ouço músicas, bebo com amigos, a coisa nunca me abandona. Para mim, é preciso um tempo de organização mental para depois conseguir intensificar a escrita. É sempre difícil, não adianta. Mas criado o alicerce, o trabalho fica uma delícia: mudar cenas de lugar, lapidar as palavras, melhorar as falas. É o que eu mais gosto.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Mal.
Falando sério: ansiedade é uma prisão, um impedimento. Gosto daquela definição de estilo como o estado do escritor no momento da escrita. Portanto, o que eu escrevo no estado mental e emocional errado, geralmente, é descartado. É necessário buscar uma maneira de estar disponível e atento para a escrita. Feliz, talvez. E pensar nas expectativas é uma maneira bastante errada de criar, me parece. A ideia de se levar muito a sério também não me agrada.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Como eu disse, a revisão é a parte mais saborosa da escrita para mim. Reviso muitas vezes e, quando é teatro, faço mudanças durante os ensaios e durante a temporada. Aquela história de que o artista não conclui a obra, apenas abandona. E é muito raro mostrar para alguém que não seja a Luci Collin. Ela é uma das maiores escritoras que eu já conheci e acabamos criando esta relação de parceria. Eu com ela, claro! Ela tem muito pouco a aprender comigo. Tenho muita sorte de ter essa amizade.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Sempre no papel primeiro. Sempre. Não me lembro de nenhum texto que eu tenha começado direto no computador.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativo?
Não sei se chamaria de hábitos. É uma forma de viver, mesmo. Não saberia não ter ideias. Boas ou ruins. Mas não imagino uma maneira de bloquear as sensações, as impressões, os sonhos. Acho que estamos sempre tentando alcançar os limites que a linguagem nos permite.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesmo se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Ao longo dos anos, você desenvolve mais técnica, mais precisão, mais ferramentas. Sabe um pouquinho mais o que está fazendo. Sou avesso à ideia de que a técnica limita a espontaneidade. Penso o contrário. Mas me vejo, hoje, um pouco mais criterioso também – o que pode atrapalhar. Talvez dissesse: “divirta-se aí!”
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Eita, tantos! Mas o que me tem voltado à cabeça ultimamente é uma peça sobre a relação da mídia com o comportamento das massas. Me intriga o episódio da Guerra do Mundos na rádio, dirigida pelo Orson Welles. Lembro que quando soube disso, fiquei pensando: “Nossa, como as pessoas podem ter acreditado numa maluquice dessas?!” E, no entanto, hoje em dia…
Quanto ao livro que não existe, talvez os contos psicografados de Jorge Luiz Borges. Queria saber o que o mestre tem para contar do lado de lá.