Danilo Dunas é cantor, compositor e poeta.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Como geralmente trabalho de 13h a 22h, a não ser que eu tenha algum compromisso, costumo acordar tarde, de 11h a 12h, de maneira que passo a maior parte das minhas manhãs dormindo.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Sinto que escrevo melhor de madrugada. É quando a maior parte das ideias vêm e consigo aproveitar o ambiente solitário e silencioso de casa, deitado na cama ou em uma espreguiçadeira para escrever. Não tenho nenhum ritual específico de preparação para a escrita.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Não escrevo todos os dias nem me imponho uma meta de escrita. Escrevo quando vem a inspiração. Sinto angústia e uma sensação ruim de improdutividade quando passo muito tempo sem escrever, mas já percebi que a angústia é maior diante de uma folha em branco quando não se tem pelo menos uma ideia inicial suficientemente forte que me motive a desenvolver uma nova letra ou poema. Por essa razão, não gosto de me forçar a escrever e gosto de encomendas com temas pré-definidos. Sinto-me desafiado e ao mesmo tempo já tenho um ponto de partida, a parte mais difícil.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
A partir do momento que tenho uma ideia inicial, coloco palavras-chave que gostaria de incluir na letra ou no poema e já esboçar possíveis rimas. Então começo a rascunhar os versos como se estivesse em um jogo de liga-pontos, sudoku ou palavras cruzadas. Trata-se de um exercício quase matemático, uma vez que valorizo muito não só as rimas, mas também o ritmo e a métrica de cada verso e mexendo em um, muitas vezes tenho que mexer nos demais para manter a estrutura. A sensação é de que a letra ou o poema já existem e cabe a mim, como um detetive, encontrá-los por trás da página em branco. O clichê já diz que escrever é 10% inspiração/intuição e 90% transpiração.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Como escrevo letras e poemas, o único projeto longo que tenho são cordéis. Mesmo nesse caso, não costumo fazer todas as décimas no mesmo dia. No Cordel da Copa de 2018, por exemplo, o prazo se impunha pela própria natureza dos acontecimentos. Pelo menos uma décima (ou mais, dependendo do volume de coisas que queria dizer) tinha que ser feita até a véspera do jogo comentado, expressando minhas expectativas sobre ele, e outra décima ou conjunto de décimas deveria ser feito preferencialmente no mesmo dia do jogo, o mais próximo possível de seu fim, com minhas impressões sobre ele, para que os versos funcionassem como uma espécie de mesa redonda. No caso da peleja que realizei com Glauco Mattoso, em que escrevia as décimas respondendo às décimas escritas por ele, havia um prazo de três dias para cada resposta, estipulado unilateralmente pelo próprio Glauco. Já tive letras em que travei por meses, tendo escrito apenas o primeiro ou o último verso. Cheguei a sentir angústia, mas acabei relaxando e deixando a ideia decantar. Quando finalmente senti necessidade e confiança para retomar as letras, escrevi o resto delas – longas, diga-se de passagem- de uma única vez. No caso de parcerias musicais, quando a música do parceiro vem antes, costumo ser rápido em colocar a letra, seja porque a própria música já me dá a métrica e ritmo e algumas vezes o parceiro já chega com o tema, o que facilita bastante, seja porque me sinto desafiado e ansioso para corresponder às expectativas do parceiro, chegando a entregar a letra no mesmo dia. Fico com receio de que, se deixar pra depois, acabarei me distraindo com outras coisas, perdendo o impulso do momento e deixando de escrever, o que já aconteceu.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Reviso minhas letras e poemas várias vezes, até porque é muito mais rápido do que revisar romances e contos. Como costumo escrever de madrugada, é comum que eu, no dia seguinte, mais descansado e atento a pequenos detalhes, faça uma revisão e mude uma ou outra palavra. Costumo mostrar o que escrevo para duas pessoas antes de divulgar para o público, principalmente para ver se as ideias que quis passar estão claras e para pedir suas opiniões caso tenha duas opções de palavras ou versos e esteja indeciso de qual seja a melhor. No caso de parcerias musicais, o parceiro é sempre o primeiro a ler a letra.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Prefiro escrever à mão em um bloquinho de papel ou papel sulfite, sem linhas. Meu processo criativo polui bastante as páginas, pois costumo escrever todas as ideias para ir depois descartando-as, riscando os versos que não usarei, sublinhando os versos escolhidos, até para destacá-los na página cheia de palavras espremidas, e usando flechas para indicar inversões da ordem dos versos ou palavras e para ligá-los. A vantagem é que o meu processo criativo inteiro fica registrado no papel e não dependo de tomadas e bateria, podendo escrever em qualquer lugar. Além disso, acho mais confortável escrever no papel do que no computador, deitado na minha cama, na rede ou numa espreguiçadeira, quase como se estivesse em um divã. Acho a tela do celular pequena, sua luz não facilita a introspecção, a internet pode fazer com que eu me distraia e perca o foco e a velocidade com que teclo no celular, ainda mais quando sou atrapalhado pelo corretor automático, é menor do que a com que escrevo à mão, o que pode fazer com que algumas ideias se percam pelo caminho. Além disso, o fato de eu não poder riscar os versos, sobrepor uma palavra à outra para depois escolher a melhor e fazer flechas facilmente unindo duas palavras no meio de várias outras espalhadas é uma desvantagem do computador e do celular. A vantagem do celular é poder registrar ideias quando estou fora de casa e a vantagem do computador é usar a internet pra pesquisar rapidamente temas e palavras, enquanto escrevo no Word. Quando começo a escrever no celular, quase sempre termino à mão ou no computador. Quando escrevo à mão, sempre passo a limpo no computador, para salvar com segurança e compartilhar por e-mail com interlocutores.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativo?
Na maioria das vezes minhas ideias vêm de filmes, de situações vividas por mim ou vividas por amigos e algumas vezes vêm de fatos noticiados pelos jornais. Um dos hábitos que cultivo para me manter criativo é ir ao cinema. Como também gosto muito de escrever paródias, é sempre bom ouvir música para ampliar o meu repertório de canções potencialmente parodiáveis. Algumas poesias mais escatológicas e pornográficas surgiram da provocação de amigos ou do meu desejo de provocar ou simplesmente de me divertir.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesmo se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Sinto que houve pouca ou quase nenhuma mudança no meu processo de escrita ao longo dos anos. Por essa razão, não tenho conselhos para dar a mim no passado, o que não significa que não tenha escrito letras e poemas que hoje em dia ache ruins.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Gostaria de realizar um projeto de mais fôlego. No campo das letras, um musical, em que todas as letras ajudassem a contar uma mesma história. No campo da poesia de cordel, gostaria de contar uma história épica, baseada em fatos reais, ou realizar uma espécie de noticiário diário. Outro projeto que gostaria de realizar é um texto teatral, independentemente de ser um musical ou não. Não tenho de cabeça um livro que gostaria de ler e ainda não existe.