Daniel Zanella é editor do Jornal RelevO, impresso mensal de literatura.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Geralmente, começo o dia respondendo pendências relacionadas ao RelevO. São e-mails de assinantes e escritores, recados nas redes sociais, textos mais longos que sobraram do dia anterior. Nas horas vagas do dia, trabalho com as minhas dissertações de mestrado (Jornalismo na UEPG e Letras na UNIANDRADE) e entregas de textos acadêmicos, além de revisões e edições para o mercado editorial.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
De madrugada sempre “rendo” melhor. Consigo me concentrar mais e sou menos propenso às distrações. Funciono mal com barulho, com música e com conversas paralelas. A maior exigência para começar a escrever, contudo, é estar com a mesa de trabalho limpa.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Em períodos concentrados, principalmente quando preciso entregar trabalhos acadêmicos e fechar os espaços editoriais do RelevO. Sob pressão do prazo, fico mais produtivo.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Procuro primeiramente definir qual será o desenvolvimento do tema abordado, rascunhando uma estrutura. Após a produção dessa primeira versão, vou para as revisões ortográficas e para a análise de coesão e coerência do texto. Por fim, deixo o material descansar por, no mínimo, quatro horas e retorno depois para limpar o texto de cacoetes, de repetições ou da simples falta de qualidade editorial.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Tento pensar pela lógica do Jornalismo, de que não é possível não entregar. Quando atraso revisões pessoais para editoras e autores independentes, fico me martirizando e me sentindo muito mal. Aí, quando saio do poço do atraso, me sinto duplamente aliviado e culpado por ter atrasado. Sei que a procrastinação diminui a qualidade do material entregue, mas, ao mesmo tempo, trabalhar sob a pressão do tempo me deixa mais alerta.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Duas vezes, no mínimo. Os textos acadêmicos são geralmente revisados pelos meus orientadores. Os textos do RelevO passam por um crivo crítico do editor-assistente, o Mateus Ribeirete. Acato com certa facilidade os apontamentos e as falhas apontadas na minha produção pessoal.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Acredito que as tecnologias auxiliam nos processos de pesquisa e de edição. Sempre escrevo no Word e salvo em pastas relacionadas ao assunto do texto. Busco ter tudo organizado para poder voltar ao material sem perder tempo para localizá-lo.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativo?
Geralmente, as ideias que surgem para o que preciso fazer são oriundas da pressa em ter de resolver o problema e na imersão em textos teóricos, quando alguns conteúdos parecem se conectar com outros – aí acontece o tal “estalo”. Como não escrevo ficção, minhas ambições com a escrita são acadêmicas e jornalísticas, passando pelo domínio de repertório e busca por alguma plasticidade de estilo.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesmo se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Bem, penso que estou menos ingênuo do que quando era mais jovem. Acreditava em ideais românticos de produção, bebia e escrevia, dava pouco tempo para o texto descansar, lia menos do que hoje. Com mais critérios e maior base crítica, consigo ter um distanciamento do que produzo e também sou satisfeito por produzir menos, o que evita, ao meu modo de ver, errar mais.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Gostaria de escrever uma biografia e de ler Guerra & Paz.
Ao dar início a um novo projeto, você planeja tudo antes ou apenas deixa fluir? Qual o mais difícil, escrever a primeira ou a última frase?
Geralmente, planejo, levantando etapas do projeto. Considero mais difícil a etapa inicial, quando ainda não é possível saber se o projeto vai se efetivar. Com volume de produção, é possível delinear melhor os caminhos, editar, descartar, aprimorar o que já foi feito, até perceber mais claramente se o projeto tem realmente potencial de realização.
Como você organiza sua semana de trabalho? Você prefere ter vários projetos acontecendo ao mesmo tempo?
O RelevO, impresso de literatura que edito desde 2010, centraliza as atividades da semana de trabalho. Primeiramente, deixo todos os afazeres do jornal em dia, desde a logística até os compromissos como editor, de palestras às participações em feiras. Depois, começo a colocar em dia os frilas com edição, revisão e preparação de originais. Por fim, no tempo que sobra neste janeiro já algo lúgubre, estudo para o mestrado (defendo a dissertação em fevereiro) e o doutorado de Teoria Literária (em processo de seleção). Tem sido assim nos últimos dois anos com o mestrado e nos últimos dois meses com o doutorado.
O que motiva você como escritor? Você lembra do momento em que decidiu se dedicar à escrita?
Hoje, não tenho aspirações como escritor ESCRITOR. O que faço é produzir o volume de texto que o jornal precisa (editorial, páginas de humor, textos de posicionamento editorial em outros espaços, como as redes sociais, responder entrevistas). Lembro de começar a escrever na infância a partir do impacto que os primeiros textos me causaram. No período em que, infelizmente (para os outros), fui cronista, a referência principal era Rubem Braga.
Que dificuldades você encontrou para desenvolver um estilo próprio? Algum autor influenciou você mais do que outros?
Não creio ter um estilo próprio. O que escrevo não é original e é oriundo de minhas referências literárias e jornalísticas, de Rubem Braga a Anton Tchekhov, do Twitter aos anúncios de televisão. Cada novo livro e cada nova leitura também deixa um rastro difícil de medir. Pode ser um rastro na forma de uma expressão ou na forma singular de um autor de enxergar o mundo.
Você poderia recomendar três livros aos seus leitores, destacando o que mais gosta em cada um deles?
Rubem Braga: 200 crônicas escolhidas. O ápice do lirismo a partir da trivialidade.
John Hersey: Hiroshima. Disso de saber narrar e juntar com precisão uma palavra na outra.
João Bosco: O futuro da ideia de autor. A consciência de que estamos num jogo pesado e confuso.