Daniel Rodrigues Aurélio é mestre em Ciências Sociais (PUC-SP) e diretor editorial da Barn Editorial.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Esta pergunta me alcança em plena pandemia do Covid-19, quando todas as rotinas e padrões que estabelecemos estão sendo colocados à prova. Em épocas mais, digamos, amenas, costumo acordar cedo, por volta das seis e meia, sete da manhã, tomo um café (dois cafés, três cafés…), leio notícias na internet e ajudo meu filho a se preparar para a escola. Depois, trabalho até o meio da tarde – momento em que preciso me reabastecer de cafeína –, vou buscar o moleque na escola e sigo em frente. Intercalo trabalhos e projetos mais autorais com o estúdio editorial que tenho em sociedade com minha esposa.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Gosto muito de trabalhar pela manhã. É quando minha mente está arejada e as ideias organizadas. Sou um operário das letras, então meu ritual de escrita é basicamente me sentar na cadeira e pesquisar, pesquisar, ler, reler, escrever, escrever, revisar, escrever…Com contas a pagar e filho para criar, aprendi a ter disciplina em qualquer situação, em qualquer local.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Não estabeleço nenhuma meta de escrita. Adapto-me às circunstâncias. Cada projeto tem seu ritmo, suas peculiaridades.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Pesquisa e escrita caminham juntas. Estão em constante diálogo. Quando faço anotações já vou dando forma à estrutura do texto, ao passo que ao escrever vou abrindo novas veredas de pesquisa – trata-se do ajuste fino de estilo e conteúdo. Nesse sentido, fala mais alto minha formação de sociólogo. Procuro me guiar pela ideia de “artesanato intelectual” proposta por C. Wright Mills (1916-1962).
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Neste exato momento estou com dificuldades para responder às perguntas desta entrevista. Sinto que estou aquém do esperado. Em geral lido bem com a pressão e os prazos, mas tenho uma autocrítica feroz, vez ou outra paralisante. Penso que a trava ou o bloqueio, que pode envolver questões psicológicas que não domino, tem natureza um tanto diversa da procrastinação. Se estamos falando daquela navegada pela internet, que quase sempre se alonga mais do que manda a prudência, então sou todos os dias um irremediável procrastinador.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Reescrevo, reviso, edito e reviro meu texto inúmeras vezes, mesmo que tenha outros leitores no decorrer da produção editorial. Aliás, entendo como algo que faz parte do processo de colocar as ideias no papel – digo, no editor de texto. No entanto, para meu desespero, assim que recebo o texto publicado – em livro ou revista –, meus olhos miram imediatamente uma canelada gramatical, aquele pisão no estilo, quase sempre imperceptível para o leitor, mas um pecado mortal para mim. E então já estou pronto para redigir a errata.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Raramente escrevo à mão. No máximo, anoto esquemas mentais bastante precários em um caderninho. Gosto do meu notebook, de abrir o editor de texto, digitar, apagar, acrescentar, mudar o tamanho e tipo de fonte – uma das minhas manias –, como se isso fosse tornar o texto mais aceitável, mesmo sabendo que não será a fonte com a qual o texto será impresso. Sabe aquela imagem meio surrada do poeta boêmio, mezzo sofredor, mezzo charmoso, que escreve versos em guardanapo na mesa do bar? Não me identifico.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativo?
Não me sinto mais ou menos inspirado do que qualquer outra pessoa. Amo o que faço e trabalho muito. Dessa forma, vou driblando minhas imensas limitações. Não tenho nem idade nem paciência para alimentar ilusões essencialistas, etéreas, mas para manter minha mente aberta – significativamente mais relevante do que se achar criativo – faço o básico: pesquiso e escrevo, pesquiso e escrevo…
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesmo se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Mudou muita coisa. São as vantagens do processo de maturidade: acumulamos mais livros lidos, assimilamos as pancadas, ficamos mais rigorosos na escrita, no conteúdo, na pesquisa. Eu poderia dizer essas mesmas coisas ao Daniel de 17 anos, mas provavelmente o Daniel dos 40 anos não seria o mesmo sem os equívocos, a impetuosidade e as angústias do Daniel adolescente.