Cristhian Teófilo da Silva é professor associado do Departamento de Estudos Latino-Americanos do Instituto de Ciências Sociais da UnB.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
O dia-a-dia começa cedo, com rotinas típicas de uma vida em família com filhas pequenas…
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
A escrita flui melhor pela manhã ou à noite por causa da tranquilidade. Sim, costumo meditar por alguns instantes e elaborar um rápido esquema do texto e imaginar para quem estaria escrevendo.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Nada de metas. A vida profissional já impõe uma infinidade, inútil, delas. Desse modo, a escrita se dá em períodos concentrados, mas sem um agendamento prévio e sim como o resultado de uma série de leituras, diálogos e reflexões livres. Os prazos de editais, coletâneas, números temáticos etc., ditam muito o ritmo da escrita. Sonho com um momento livre deles.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Costumo registrar ideias para artigos, projetos etc. em um caderno de anotações (desses de bolso). As ideias surgem da sintonia com leituras que faço e indico em disciplinas que ministro na graduação e na pós-graduação e referências que encontro no dia-a-dia. Busco uma coerência entre projetos, pesquisas, aulas, orientações e leituras de modo a manter um fluxo mais ou menos direcionado. Trata-se de um trabalho permanente de sincronização entre atividades de ensino, pesquisa e extensão com a vida cotidiana e seus múltiplos e cada vez mais fragmentados papéis. Escrevo, nesse sentido, para manter-me engajado na realidade, o que vem a ser minha definição de pesquisa.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Permitindo-me falhar, corrigir, aprender, travar. Ansiedade diante da escrita é para mim uma manifestação de apego ao resultado final, às opiniões dos outros, ao medo da desaprovação e frustração. Procuro, então, me acalmar, me distanciar do trabalho e deixar o inconsciente trabalhar e curar.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Sim, reviso sempre, mesmo depois que foram publicados de modo a corrigir informações ou sugerir erratas. Mas não se trata de nada compulsivo e sim de uma busca de melhoramento, o que é sempre possível. Quando posso contar com a leitura alheia, o que é um privilégio, eu apresento meus textos e me preparo para o diálogo. Este é vital para a reelaboração das ideias e para torná-las mais acessíveis e menos prolixas.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Escrevo insights em cadernos de notas que considero mais versáteis que o celular ou o computador. Mas para a escrita de artigos, já incorporei os recursos do editor de texto e a possibilidade de acesso à internet como indispensáveis para a escrita.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativo?
As ideias vêm da leitura a mais eclética possível de outros artigos, livros, teses, resenhas, revistas etc. Ler é o que melhor propicia o fluxo de ideias, desde que se consiga desprender os olhos da leitura e olhar e conversar com as pessoas e tudo ao redor. Tão importante quanto ler é saber ouvir e conviver… interagir.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesmo se pudesse voltar à escrita de sua tese?
Ao longo do tempo, escrevendo, acaba-se desenvolvendo um estilo pessoal. Este se compõe de muitas coisas próprias e apropriadas. Aprende-se a máxima de Jorge Luis Borges quando diz que insinuar é mais forte do que tentar convencer. Se pudesse voltar à escrita da tese eu começaria pelo que descobri, somente na defesa, ser o objeto da tese (sim, escrevi a tese em torno de um outro objeto que não era o objeto que somente se me fez claro na defesa)! A reciprocidade através das pessoas e coisas como forma de ampliação da vida social entre os Avá-Canoeiros.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Felizmente, estou realizando o projeto que gostaria. Estudo os regimes de indianidade elaborados para integrar os povos indígenas a Estados nacionais e os efeitos destes sobre as identidades e pessoas indígenas. Na verdade, reconheço aí uma situação análoga à vida da maioria de nós, submetidos que estamos a regimes de dominação sobre os quais temos pouco controle, restando apenas práticas cotidianas de resistência, subversão e transgressão que alimentam a esperança de um outro mundo melhor.
O livro que gostaria de ler possivelmente existe como a continuação infindável de “Se um viajante numa noite de inverno…”