Cláudio de Oliveira Martins é mestrando em Estudos de Linguagem da Universidade Federal Fluminense (UFF).
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Eu tenho uma rotina muito variada e dinâmica. Sou professor de língua portuguesa e de literatura na educação básica, trabalho de segunda a sexta. Eu me desdobro por três municípios do Estado do Rio de Janeiro. Logo, aos sábados e domingo, preciso gerir muito bem minhas ações que serão realizadas ao longo da semana. Meus dias sempre começam por volta das 4h ou 5h da manhã. Eu acordo, me visto para o dia e preparo minha bolsa. Além do material de trabalho, nunca abro mão de ter um livro e um caderno de anotações à bolsa. Nunca se sabe quando vai bater aquele surto criativo – de ler ou de escrever!
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Eu trabalho melhor de manhã e à tarde. Acho que, por volta das 8h às 11h e também das 15h às 18h, me sinto produtivo. Talvez seja porque o corpo está mais despertado, mais distante de sentir sono. Ou porque é um momento pós-refeição. Esse momento me ajuda bastante! O período de férias também contribui muito para minha escrita. O cansaço que a rotina de professor gera me trava a escrita. Para escrever, às vezes é preciso do ócio. Então, eu acabo deixando ideias topicalizadas em meu bloco de notas e só escrevo sobre elas nas férias. Quando as escrevo assim que penso, estão sempre dispostas em algum chat de rede social. Por exemplo, no ano passado (2018), escrevi poemas e crônicas. Compartilhava para meus amigos pelo WhatsApp, outros atrevi a postar no Facebook. Só que eu nunca tive tempo para construir um blog e organizá-los lá. Foi somente nas férias de 2019 que eu projetei meus dois blogs ativos: o @desafagos– blog de poemas – e o norma curta– blog de crônicas. Precisei dessa coisa rara na vida de professor: o tempo; para dar um pontapé aos meus projetos literários. Agora quanto ao ritual de preparação, acho que vai depender do tipo de escrita de que estamos falando. Poema, crônica, eu escrevo num assento de ônibus, numa fila de banco, até nos tempos vagos das escolas em que trabalho. O ônibus é meu lugar mais produtivo. Acho que passo tanto tempo nele, e isso é tedioso, que resolvi dar uma nova roupagem a essa amizade que está comigo por várias horas do meu dia. Reservo esse momento para ler também. E o caderno de anotações é o meu outro amigo. Ontem (30/03/2019), antes de dormir, anotei uma ideia de poema que só fui elaborar hoje, dia seguinte. Mas quando se trata de desenvolver textos acadêmicos, isso demanda muito mais ordem de mim. Preciso organizar o espaço. Pegar todas as minhas folhas de trabalho (provas, redações, planos de aulas) e guardar numa pastinha, empilhar meus livros, cada um na sua coluna (estabelecida por tema, área de interesse). Eu também faço planejamentos em tópicos do que eu quero fazer. Pelo fato de ser professor de língua portuguesa e trabalhar com ensino de redação desde 2014, organizar escrita de texto não literário, para mim, não é opção, é dever! Atualmente estou escrevendo minha dissertação de mestrado. Tenho meu arquivo no Word com cada etapa que tenho que fazer por dia, embora não curta tanto deixar meus planos em documentos digitais.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Quanto à escrita de poesia, não costumo estabelecer prazos. O poema surge e pronto! Às vezes, eu brinco dizendo que a poesia me utiliza para ganhar corpo, como, no meu poema A vida da poesia:“Eu empresto minhas mãos e mente à poesia agora./ Há fôlego, há vida nela,/ (…) Eu me empresto a ela e ‘Haja poesia!’/ Ela existe antes, durante e depois de mim.”. Então, não me preocupo com tempo, lugar para fazer poemas. Entretanto, não posso deixar as coisas fluírem livremente com o texto acadêmico. Estou na fase de escrita da minha dissertação de mestrado. No início da pós, antes de realizar minha qualificação, enfrentei dificuldades para escrever por conta da minha carga horária de trabalho e da dificuldade em conciliar vida profissional e acadêmica. Depois que qualifiquei meu projeto de mestrado, depois que reduzi minha carga de tarefas e assim que ficou mais evidente a proposta a desenvolver na minha dissertação, a escrita se tornou possível e prazerosa! Costumo estabelecer objetivos semanais, às vezes cumpro na data, às vezes passo uma semana do que estabeleci. Mas para mim o mais importante do processo é continuar escrevendo. Só não pode haver parada por mais de um mês. Isso complica tudo! E não sei se vocês sabem como são orientadores né? Eles podem comer seu fígado! E o coração também. Sem tirar sua vida, pois você ainda precisar entregar o texto! Se minha orientadora ler isso, acredito que ela não levará para o pessoal. Ela tem uma incrível consciência de classe!
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Bom, o processo de escrita, modestamente falando, não é muito complicado para mim. Em primeiro lugar, porque eu amo escrever. Em segundo, porque, ao longo da minha graduação, eu participei de projetos como bolsista que se relacionavam à escrita (e levei isso para o mestrado também). E em terceira instância, porque eu sou professor de língua portuguesa e comecei trabalhando só com produção textual por 4 anos. Logo, escrever é algo recorrente para mim, muito comum. Tendo a ideia, o texto nasce. Para isso, eu busco ler bastante, fazer anotações nos textos e nos meus cadernos de rascunhos. Eu funciono muito bem anotando o que eu leio e acho importante. Eu aprendo e decoro conteúdos escrevendo. Então, não enfrento dificuldade para começar a escrever. Eu só tenho um inimigo na escrita, pelo menos é o único que me veem à mente agora: o computador. Odeio ficar digitando palavras e palavras no teclado. Acho tedioso. Por isso, muitas seções da minha dissertação eu fiz numa folha de papel e recorri a alguém para digitar para mim. Depois de digitadas, eu só as revisei. Quanto às ideias se tornarem texto… Eu acredito que eu tenha uma forma muito organizada de pensar. A Lua em Virgem talvez colabore para isso! Quando eu falo, escrevo, anoto, eu sempre estabeleço etapas, momentos. Não gosto que nada produzido por mim esteja disposto desorganizadamente. Pelo menos, no que tange aos meus critérios de organização.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Há dois momentos em que me senti muito travado para escrever: o desenvolvimento de uma pesquisa que elaborei para o PIBIC (2016/2017) sobre análise de livros didáticos, essa pesquisa era imensa e me demandou muita leitura, reflexão e escrita; e o mestrado, a elaboração do meu projeto de qualificação e da dissertação de mestrado (esta última ainda em curso, agora em março de 2019, sigo escrevendo). Os problemas que surgiram, ao longo desses dois projetos, foram procrastinação, medo, e baixa autoestima. No caso do PIBIC, eu não me planejei muito bem. Procrastinei alguns dias. Eu não estava trabalhando na primeira metade de 2017, estava no primeiro semestre do mestrado. Era uma dinâmica nova, com muita demanda, e eu estava desprovido de recursos financeiros. Então, acabei me enrolando um pouco para o desenvolvimento do texto final. Consegui terminar no prazo, e o trabalho foi muito bem feito. Porém, precisei virar a noite na frente do computador na reta final. Se eu tivesse estabelecido objetivos, como aprendi a fazer no mestrado, e não tivesse passando por aquela situação financeira, eu não teria sofrido tanto para encerrar a pesquisa. Com o mestrado, eu sinto um pouco de medo, talvez baixa autoestima também. Eu fico pensando: “Eu não sou bom para isso!”, “Alguém vai querer ler meu texto?”, “Que contribuições eu estou deixando?”, “Mas eu fiz poucas disciplinas!”. E o somatório dessas ideias que passam pela minha cabeça faz com que eu deprecie tudo que aprendi e desenvolvi em apenas 3 anos, desde que me formei (meados 2016) até agora. A minha qualificação de mestrado em agosto de 2018 foi um ponto de partida para eu notar que estava me sabotando. A banca elogiou tanto o projeto e me fez perceber que havia tanta coisa legal a se fazer ali naquele trabalho. Passei a notar a relevância da minha investigação e me encorajei a prosseguir escrevendo, concordando que eu sou digno de obter esse título, pela pesquisa em andamento, pela batalha para dar vida a ela, pelo tanto que aprendi sobre linguagem nesse período enquanto pós-graduando.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Eu reviso muito os meus textos, sou bem chato com isso. Mas é lógico que ficamos cansados, com olhos viciados. Às vezes, lemos algum erro e, por que passamos por eles, achamos que já corrigimos. Então, sempre sobra uma questão de digitação para alterar na versão final. Além de mim, meus textos passam sempre pelos meus revisores pessoais: meus amigos. Tem gente de letras, de história, de química, entre outras áreas. É galera pós-graduanda, graduanda, não graduanda. Eu penso no seguinte. Se qualquer um pode entender meu texto, independente da formação que tenha, significa que fiz um texto claro. É obvio que conceitos teóricos – falando dos meus textos acadêmicos revisados – podem não ficar tão explicados para alguém que não é de determinada área. Mas pelo menos, para mim, a frase tem que ser entendível! E meus “migovisores” colaboram muito comigo, analisando meus textos científicos: “Acho que faltou uma palavrinha ali!”, “Precisa mesmo desse conectivo?”. Já nos literários, as opiniões são mais sobre o conteúdo em si. “Poxa, queria ler mais sobre esse poema”, “Por que você não divide esse poema em dois e desenvolve mais essa ideia por aqui, a outra por lá”. E por aí vai.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Como eu havia comentado, eu lanço mão sempre de um caderninho de anotações. Minhas ideias sempre estão neles. Raramente deixo anotações em arquivos digitais. Coisas que eu mais ganho de presente dos amigos: agendas, blocos de notas físicos, post-its. Meus amigos me conhecem! Eu só recorro ao computador se estou publicando um poema no blog ou se estou escrevendo um texto acadêmico. Aí, eu dependo do Word, da formação de texto que faço por ele. Não tem jeito mesmo! Preciso do comuputador. Ah! Eu também uso o bloco de notas do celular, quando estou no ônibus, para escrever poemas e crônicas.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativo?
Para escrever poesia, acredito que cultivo o sofrimento. É a principal matéria da minha poesia, depois da própria linguagem. Meus poemas são essencialmente meu olhar sobre esse fenômeno assustador e libertador que é a linguagem, tal como sua capacidade de s manter refém a ela. Os amores, os desconfortos com a vida, as dores, o pessimismo com a humanidade, tudo isso vai virando matéria de poesia também. E quando eu vejo, lá estou eu escrevendo outro poema. Enquanto eu escrevo essa entrevista, por exemplo, eu já pensei em 2 poemas, a partir das respostas que estou dando. Enquanto fiz a busca de alguns versos do meu poema, para responder a pergunta 3, vi a foto de uma paisagem em forma de pessoa flutuar pela feed da rede social. É claro que aquela obra de arte iria virar poesia né? O poeta tem que ser um amante da vida! Além disso, sugiro muita leitura. Os clássicos devem ser lidos! Os poetas devem ser lidos! Sobretudo os modernistas! Os autores contemporâneos precisam ser lidos!
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesmo se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Eu acho que me tornei um leitor melhor e isso ajudou minha escrita. Não no sentido de que aprendi a construir melhores gêneros de texto com a leitura. Acredito que descobri estilos, ampliei meu repertório de palavras e minha visão de mundo pela literatura. Eu só fui conhecer literatura clássica na faculdade. Os textos científicos e filosóficos tudo bem, já era de se esperar conhecer neste momento. Mas como assim ler Drummond pela primeira vez só na graduação? Não sei o que seria de mim se eu não tivesse conhecido “A flor e a náusea”, “Confidência de um itabirano”, dentre outros poemas maravilhosos de Carlos Drummond de Andrade. Não sei o que seria de mim, se não conhecesse outros poetas, como Manuel Bandeira, João Cabral de Melo Neto, Ferreira Gullar, Manoel de Barros. Outro fator que me propiciou escrever foi a leitura de crônicas. Eu amo esse gênero de texto! Luis Fernando Veríssimo é quase que amigo da minha cabeceira. E eu sinto que a crônica desperta meu lado humorístico, sarcástico, debochado, narrativo e até poético. Meus primeiros poemas parem muito com crônicas. Aos poucos fui largando as rodinhas de apoio da bicicleta e (modestamente) acho que conferi à minha poesia forma de poema, se é que o poema tem uma forma precisa. Em suma, ler é sempre importante para mim. A gente pode aprender muito lendo. Sobretudo se lermos nosso passado, nossos antepassados.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Um projeto que tenho em mente é publicar meus poemas em um livro. Eu não comecei a tocar essa ideia ainda, pois minha atenção principal agora é para a dissertação de mestrado. E também porque quero reunir mais textos para uma publicação física. Expandir as temáticas, os olhares, a forma de conceber o texto. Ao todo, tenho cerca de 30 poemas publicados no meu blog @desafagos. Também tenho crônicas no norma curta, mas são bem poucas. Além de postar os textos nos blogs, que hoje em dia não têm muitas visualizações, inverso das redes sociais, estou gerindo uma conta no Instagram para o @desafagos. Lá, posto imagens com fragmentos dos meus textos, faço parcerias poéticas. Na era das relações para criação da arte, acho que inventei um nome: o “feat poético”. Toda vez que um amigo me manda uns versos, eu tento completá-los, e vice-versa. E assim vão nascendo nossos textos, como foi com o maravilhoso “Flores negras”, um dos meus poemas favoritos. Eu recebi a dádiva de uma estrofe escrita por Bea Andrade, ex-aluna e amiga, e fui oferecendo versos. E assustadoramente, em menos de um minuto, tínhamos nosso poema predileto em chat de WhatsApp. Ah, eu amo poesia! Pretendo, então, um dia publicar meus poemas! Também desejo fazer o doutorado e especializações, algum deles será em literatura, com certeza! E sobre leitura que ainda não pude fazer: eu morro de vontade de ler “Grandes sertões: veredas” por completo. Eu já li outras produções do Guimarães Rosa, já fiz disciplina sobre ele durante a graduação. Todavia, nunca consegui ler esse romance (gigante) todo por falta de tempo. Quero recomeçar! Vai ser meu propósito em 2019. E inclusive deixo essa sugestão aos leitores. Em uma sociedade como a nossa, cheia de máscaras sociais e repressões ao amor, a leitura de GS:V é mais do que interessante, é necessária!
Ao dar início a um novo projeto, você planeja tudo antes ou apenas deixa fluir? Qual o mais difícil, escrever a primeira ou a última frase?
Eu acredito que a resposta para essa pergunta é “depende”. Penso que um escritor pode escrever tanto por dedicação e disciplina, quanto por inspiração. Isso porque esses dois modos funcionam comigo. Há vezes em que o surto criativo vem à tona, escrevo poemas um após o outro. Quando vou perceber, eles, se comparados, são uma sequência. E a partir daí acabo formando um projeto novo. Em outros momentos, eu crio um projeto e começo a escrever contos para dar conta dessa ideia que nasceu antes dos textos. Então, sobre esse assunto – um debate polêmico no meio literário inclusive – vejo que não é possível estabelecer o que é certo, mas o que é apropriado para o momento. A respeito do que é mais difícil: com certeza escrever a primeira linha. Um misto de romper com o medo, com a insegurança e com o nada. Depois que nasce algo, terminar, suponho e creio, é mais fácil.
Como você organiza sua semana de trabalho? Você prefere ter vários projetos acontecendo ao mesmo tempo?
Essa pergunta eu preciso responder inversamente. Eu odeio ter vários projetos acontecendo. Isso me irrita profundamente. Eu gostaria de ficar por longo tempo tocando um projeto até que, a partir do meu perfeccionismo, eu o aprovasse. Porém, minha rotina é bem dinâmica. Geralmente estou escrever textos acadêmicos, além dos literários que produzo. Também reviso muitas produções textuais dos meus alunos, além de elaborar materiais didáticos. Assim, com tanta coisa acontecendo, respondendo agora a primeira pergunta, eu preciso, com certeza, de organização. Geralmente, faço uma lista de tarefas, estipulo os dias e os horários para cada tarefa. Antigamente eu tinha o comportamento de fechar um trabalho e iniciar outro. Hoje, vou cuidando de mais de uma ideia ao mesmo tempo, reservando tempo específico para cada. Sem uma listinha de tarefas, eu não existo. Nem escrevo uma palavra sequer.
O que motiva você como escritor? Você se lembra do momento em que decidiu se dedicar à escrita?
Como eu já havia respondido antes, sou escritor tanto de textos acadêmicos, quanto de literários. Penso que a motivação para ambos sejam distintas. O primeiro nasce do meu sucesso profissional e do meu engajamento com minha área de trabalho. Ser um educador linguístico exige muito trabalho. Há muito sobre o que falar ainda. Então, minha motivação para esse tipo de trabalho se dá nesse contexto. Agora, enquanto escritor literário, o Cláudio que publica poemas e crônicas em blog não está tão fixado em trabalho. São as minhas experiências cotidianas, minhas inquietações, meus desejos – às vezes, coisas que não se relacionam a mim ou a alguém diretamente, mas que preciso dizer pelo bem das coisas – que regem minha escrita artística. Para ser sincero, a vida em si é minha motivação. Daí quando eu escrevo, penso e brinco: “eu não escrevi esse poema, ele me escreveu”, de tanto que a inspiração do momento, do olhar me toca e me leva. Então, a experiência vira palavras.
Que dificuldades você encontrou para desenvolver um estilo próprio? Algum autor influenciou você mais do que outros?
Eu sempre ouvi palavras negativas na minha vida toda vez em que eu cogitava fazer algo novo. Bastava eu tentar uma atividade fora da minha zona de conforto que ouvia comentários do tipo: “Isso não é para você.” ou “Você é bom naquilo, entenda seu talento e pare de buscar o que não é para você.”. Lidar com a falta de apoio das pessoas me impedia de começar a escrever. Fora minha insegurança pessoal. Mas chegou um momento que rompi isso. Eu li um conto com comédia de uma amiga e pensei: será que eu também posso escrever algo tão bacana assim como ela? Será que posso despertar sensações nas pessoas? E eu comecei. Enviei para ela meu primeiro texto, que o curtiu euforicamente. Começou a me pedir mais. Outros amigos iam lendo meus primeiros textos e me demandando mais produções também. Me senti contente não só pela escrita que eu desenvolvia, mas pelo interesse das pessoas mais próximas de conhecer essas histórias que eu escrevia e da forma como eu escrevia. Mais adiante, eu quis me arriscar com algo que sempre me interessou: a poesia. Sempre fui vidrado por ela. Meus poetas favoritos, dos cânones, são Drummond e Ferreira Gullar, e muito influenciam minha escrita. Gosto da linguagem irônica, sensível, sagaz e afiada dos dois. Acho que tenho um pouco deles comigo hoje em dia. Todavia, só fui escrever mesmo com regularidade, confiança e até mais senso crítico só depois que fiz amizade com dois alunos meus poetas. Ana Beatriz e Roger escreviam poemas. Eu vi dois jovens, meio à rotina de vestibular, bastante dedicados com a poesia e comecei a me perguntar: por que me privar dessa experiência? Lendo os textos dos dois em suas páginas em instagram, logo em seguida, motivei-me a escreve e comecei a enviá-los alguns textos meus. Um poema num dia, dois poemas noutro. De um ano e meio para cá, possuo um blog de poesia com 64 poemas (@desafagos) e outro de crônica (norma curta) com uns 5 textos publicados – tenho mais para publicar, mas outros projetos têm me afastado das crônicas atualmente. Creio ter descoberto meus estilos de escrita, como penso nesses nomes como minhas principais referências.
Você poderia recomendar três livros aos seus leitores, destacando o que mais gosta em cada um deles?
O primeiro livro que indico é “Dentro da noite veloz” de Ferreira Gullar. Esse livro é de uma sensibilidade poética – política, linguagem, vida, fome, pobreza e até vestibular viram matéria da poesia nele. É ótimo para quem está em busca de uma linguagem subversiva, versátil, mas também possível de ser compreendida. O segundo livro é “Alguma poesia” de Drummond. É um livro que escreveu depois das duas críticas recebidas por Mário de Andrade. Drummond, modestamente acolheu os apontamentos do amigo e começou a se tornar um grande escritor. Quiçá o maior modernista e maior poeta brasileiro. Esse livro é um ótimo caminho para entender e amar Drummond. O terceiro livro é “Felicidade clandestina” da Clarice Lispector. Eu nunca fui muito fã da Clarice e o fluxo de pensamento, a narrativa veloz e introspectiva me incomoda um pouco. Mas definitivamente Clarice nos tira do chão e leva a algo sublime. Colegas de trabalho, amigos e alunos sempre me fazem vê-la de uma forma diferente. E esse livro é um dos que mais me tocam.