Cesar Alcázar é escritor, tradutor e editor.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Desde que me tornei freelancer há alguns anos, tenho acordado entre 8h e 9h30, mas isso pode variar dependendo dos compromissos. Em seguida, bebo bastante água e como alguma coisa (não tomo café). Depois, geralmente, sento na frente do computador para conferir e responder e-mails e as demandas (comentários, mensagens) nas redes sociais. O tempo que passo fazendo isso varia de acordo com o trabalho que estiver realizando no momento. Caso seja uma tradução, confiro tudo o mais rápido possível e já parto para o trabalho. Gosto também de parar um pouco para ler antes do almoço.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Embora muitas ideias boas surjam pela manhã, às vezes ainda na cama, gosto mais de escrever ficção à noite. Durante o dia prefiro imaginar, fazer anotações e desenvolver cenas mentalmente enquanto faço outros trabalhos (na maior parte do tempo, traduções) ou leituras.
Não tenho nenhum ritual de preparação para a escrita. Na verdade, sou uma pessoa que detesta rituais de qualquer tipo. Minha única preparação é ler o material que escrevi na oportunidade anterior em que trabalhei naquele texto (caso não seja um trabalho novo).
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Já tentei trabalhar com uma meta diária de 500 palavras, mas poucas vezes consegui cumprir o estabelecido. Não gosto de forçar. Posso ficar meses sem escrever nada. Minha frequência de escrita depende de diversos fatores como prazo, disposição, empolgação com o material, quantidade de trabalhos simultâneos…
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Em geral, parto de uma personagem (nem sempre o protagonista) ou uma cena. A partir daí, vou construindo em cima deles. Depois, quando acumulei uma quantidade maior de informações, traço um esqueleto da história, uma sequência de cenas. Porém, deixo tudo bem livre caso eu queira tomar rumos diferentes do imaginado no início. Ou, às vezes, não faço nada disso. Sou meio caótico.
Notas sempre ajudam. Podem ser descrições de personagens, ações, cenários. Elas facilitam muito o desenvolvimento da história.
Na maioria das vezes, primeiro tenho uma boa ideia do que a história vai pedir para depois pesquisar os assuntos. Não me importo de pesquisar durante a escrita, acho até que ajuda a estimular a criatividade. Para a novela A Fúria do Cão Negro, por exemplo, pesquisei muito a organização social da Irlanda no século XI, a velocidade de viagens a cavalo e os mapas da região antes de começar a escrita. Porém, uma das cenas mais comentadas, que envolve um infame método viking de execução, só apareceu a partir de uma pesquisa realizada com a história quase terminada.
Como você lida com as travas da escrita, com a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Se a escrita de determinado texto trava, procuro não me preocupar. Assisto filmes, leio bastante, tento trabalhar em outras coisas até que me sinta apto a retornar ao texto travado. Como disse anteriormente, já tentei ter metas de escrita, mas isso apenas causava frustração e ansiedade. Desisti de ter a tal disciplina que os manuais exigem e me senti bem melhor.
Estou em paz com a procrastinação. As coisas que faço quando procrastino (ver filmes, ler, ouvir música, interagir com amigos nas redes sociais, pesquisar, pesquisar, pesquisar os mais diversos assuntos) me enriquecem.
Já tive bastante medo de não agradar. Com o tempo isso passou um pouco. Aprendi que nem os maiores escritores de todos os tempos agradam sempre. O importante é aprender a lidar com as críticas, não se iludir com as positivas e não se desmotivar com as negativas. Cada uma delas pode ensinar algo diferente.
Trabalhei em poucos projetos de longa duração (e todos escrevendo roteiros). Eles não me causaram nenhuma ansiedade. A participação desses projetos em editais de financiamento me deixava apreensivo no início. Depois me acostumei.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Não tenho um número fixo de revisões. Vou escrevendo e revisando, não espero terminar o texto. Mas depois que termino, reviso mais algumas vezes o todo. É um processo lento (e talvez pouco produtivo), mas não consigo escrever livremente para só depois editar.
Como em geral trabalho com editores, são eles que lidam com meus textos antes da publicação. Não mostro muito para outras pessoas.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Só faço à mão algumas anotações de ideias, às vezes algum rascunho de estrutura. Ou também frases soltas. A escrita mesmo é sempre no computador. Uso o Word para textos em prosa e roteiros de quadrinhos. Para roteiros de audiovisual uso o Final Draft.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativo?
As ideias podem vir de qualquer lugar: uma notícia, uma cena testemunhada na rua, um sonho (já escrevi várias histórias a partir de sonhos que tive), uma conversa, histórias que ouço… Estou sempre com olhos e ouvidos atentos no que acontece ao meu redor.
Mas o mais importante, acho, é construir um repertório de referências. Procuro ler muitos autores e gêneros diferentes, tanto na literatura quanto nos quadrinhos. Acho que quanto mais eu leio, mais tenho vontade de colocar no papel as ideias que surgem por aí.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos?
Continuo o mesmo indisciplinado dos primeiros anos. Meu processo caótico continua da mesma forma. O que mudou foi minha exigência com a prosa, que aumentou muito. Sou bem mais cuidadoso com o que coloco na página hoje do que em 2008. Busco a simplicidade. As 10 Regras da Escrita de Elmore Leonard e a prosa minimalista de George V. Higgins mudaram o modo como eu via a escrita.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Eu gostaria de escrever um romance. Até agora me dediquei essencialmente a contos e roteiros. Meu trabalho mais longo é uma novela com pouco menos de 20.000 palavras. Tenho algumas ideias que posso desenvolver, mas nada muito concreto ainda.
A cada dia, descubro um monte de livros que despertam meu interesse. Então, provavelmente os livros que eu gostaria de ler já estão por aí, só não esbarrei neles ainda.