Camilla Coelho é escritora.

Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Atualmente eu não tenho uma rotina matinal de sentar e escrever, por exemplo, mas estou sempre praticando mentalmente. Na parada de ônibus, observo as pessoas, os gestos, movimentos, para onde vão seus olhares, quais podem ser suas preocupações, particularidades, histórias…
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Eu gosto de escrever à noite, quando todos estão dormindo e eu tenho um completo silêncio. Geralmente é um processo básico: escrever com lápis num caderninho ou abrir o Word no notebook, e tentar não parar até que a história termine – de alguma forma. A única coisa que muda é que quando estou num lugar público, prefiro colocar fones de ouvido e escutar uma playlist com sons mais acústicos, indie ou instrumental.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Escrevo um pouco todos os dias. Ando com um bloco de anotações e uma caneta na bolsa, e vou colocando ideias soltas que surgem ao decorrer do dia, mas não é certo de que vou utilizar o que eu anotei. E claro que nem sempre consigo resgatar tudo para o papel, aí anoto em um pos-it na mesa do trabalho, ou acabo perdendo a ideia mesmo.
Quanto a rotina de escrita, depende muito da ideia que eu tô trabalhando no momento. Para escrever meu TCC, que eram textos ficcionais, eu escrevia todos os dias, seja para rascunho, edição, nova história, ou mudança de personagem. De manhã eu escrevia, de tarde eu relia, e de noite eu escrevia de novo.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
A minha pesquisa começa a partir da minha ideia. Vou compilando tudo que eu pensei em um rascunho e monto uma estrutura do que preciso para começar a escrever a história. Nessa estrutura eu sei exatamente por onde devo começar. Se eu preciso entender algo técnico, buscar algum dado científico, ou ter um embasamento mais aprofundado, eu foco em ler livros que falem do tema. A leitura é, sem dúvida, uma fonte de inspiração. Coloco como meta ler uns 3 livros, ou ler artigos e notícias, e aí começo a completar a minha estrutura. Mas além disso, a minha maior segurança são as minhas memórias. Durante qualquer processo, exercitar a lembrança do que já ouvi e vivenciei me ajuda a dar mais vida aos personagens e verossimilhança para os universos que eu crio. Acaba sendo uma mistura de ter algo concreto, de buscar provas, e utilizar a experiência como esse caminho para a escrita.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
É difícil responder isso, porque ainda não aprendi a lidar com a ansiedade de trabalhar em projetos longos. Por outro lado, sinto que a ideia de que é aquilo é grandioso e tem uma grande pressão por trás, faz com que eu trabalhe mais. O problema é pensar no outro, e em como ele vai receber o que estou escrevendo e que me dediquei tanto. É um processo complicado falar para si mesmo que tudo bem a pessoa não ter entendido o seu texto, porque não está tudo realmente bem. Mas aprendi a relaxar mais quanto a isso, pensando sempre que o leitor deve ter seu espaço e sua lógica, e eu não posso sentar do seu lado e me explicar. Então ouvir um “não” pode ser bem subjetivo.
Quanto a procrastinar ou ter alguma trava para escrita, no meu caso, são a mesma coisa. Quando eu prefiro fazer outras atividades é porque eu não tenho algo tão importante para escrever, e opto por ignorar qualquer ideia que eu tive já que ela parece descartável e sigo sem fazer algo útil.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
A cada revisão surge um novo problema. Normal. É difícil determinar um padrão, pelo menos para mim. Eu reviso até quando acho que chegou no momento de largar aquele texto. Posso ler cinquenta vezes e mudar quase nada, ainda que eu mude todas as vezes, mas em algum momento preciso deixar de lado e partir para outra. Quando fico muito tempo sem ler algo que eu escrevi, o impacto é muito maior. Me sinto a pior escritora do mundo e sinto vontade de desistir. Aparecem erros bem toscos e parece ser cansativo corrigir, e no dia seguinte eu percebo que não tinha nada demais. A única coisa que muda entre uma revisão e outra, são os nossos olhares críticos e perceptivos. Por isso é tão importante enviar os textos para outra pessoa revisar, pois ela terá uma visão mais limpa e honesta. Geralmente, eu envio para uma amiga escritora de confiança, e ela manda as considerações e sugestões.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Ultimamente eu escrevo mais no computador, e sempre levo um caderno ou bloco para anotar ideias que surgem ao decorrer do dia para que eu não perca nada.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativa?
A realidade é o que mais me inspira, ainda que nos dias de hoje esteja difícil encarar as notícias, tento manter a rotina de ler e saber o que está acontecendo com pessoas reais. Conversar com as pessoas que eu conheço e convivo, buscar histórias das mulheres que vivem nesse mundo de batalhas diárias e prestar atenção no que o outro tem a falar, isso é um hábito que eu tenho como escritora.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesma se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Hoje em dia tenho mais disciplina e levo a escrita mais a sério, como uma profissão. Eu só tenho 23 e comecei a escrever na internet com uns 13/14 anos, mas era muito mais um hobby e algo que eu tinha de diferente para desenvolver no meu tempo livre.
Lendo os meus textos antigos eu tenho muito o que corrigir, mas acho que a principal coisa que eu me pediria é não perder essa coragem da escritora que tá começando porque ia fazer falta no futuro.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Eu estou com um projeto de livro que ainda está bem como um projeto mesmo. Preciso estruturar melhor o que já escrevi e começar “do zero” algumas pontas soltas.
O livro que eu gostaria de ler é um direcionado para o público adolescente que não trouxesse mais a personagem muher como uma boba apaixonada ou burra. Queria que o clichê fosse mais bem trabalhado e fugisse dos estereótipos dos seus personagens, assim influenciando melhor quem lê e evitando a propagação da nossa cultura machista.