Bioncinha do Brasil é costureira, bordadeira, escritora, iluminadora e técnica de Teatro.

Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Água, costumo acordar entre 8 e 9 horas e a primeira coisa que faço é beber bastante água, agora estou me condicionando a me alongar todos os dias de manhã.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Depende muito… Não há ritual para escrita, na real a escrita é fruto de inquietação interna, depende muito do que me provoca a escrever e pra isso não tem hora.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Então já tive rotina com a escrita, hoje em dia nem tanto… Ano passado, durante a Revolução chamada Carolina Maria de Jesus pela FLUP escrevi crônicas diariamente sobre a realidade que vivi, ainda assim escrevo mas já é um ritmo diferente.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Meu processo de escrita é algo bem híbrido, não tenho essa prática de nota, creio que seja porque também trabalho com outras linguagens como bordado, costura, tear, iluminação… A escrita acaba sendo uma descrição de imagens, situações e fabulações do meu imaginário que considero importante documentar.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Costumo não lidar com essas questões. Até mesmo porque ainda não tive a oportunidade de me debruçar com vigor sobre projetos longos… Até então tenho textos publicados em revistas e livros coletivos, tenho a vontade de levar minhas crônicas para um livro, mas creio que ainda não seja o momento. Corresponder expectativas cabe a um imaginário onde o corpo da Travesti não adere, logo isso não é uma questão pro meu trabalho, talvez as questões sejam outras, como a preservação de certos mistérios, e cuidado já que se trata de uma narrativa muito visada enquanto um corpo marginal, miserável, vulnerável, meu trabalho é justamente transfigurar essa imagem com a qual a norma CIS cristã tenta me vestir.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Algumas vezes, não sei dizer quantas, mas nada muito exigência, pra mim há um crível de decência independente do conteúdo. Costumo ler para minhe companheire Hafsa Terra e amigas próximas, mas poucas…
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
É uma relação estável apenar do Brasil e suas demandas caóticas com a distribuição da internet de qualidade. Mas amo escrever à mão, creio que seja algo que vai estar comigo enquanto tive mão para escrever.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativa?
As ideias vem das minhas vivências, costumo partir da reflexão e documentação de situações e imagens que considero valiosas para o processo que vivo. Creio que criatividade seja algo espiritual, teias que estão em constante tecitura a milênios, também é sobre ancestralidade… Logo esses hábitos cultivados são cuidados com a saúde mental e espiritual.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesma se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Muita coisa mudou, comecei escrevendo poemas, depois fui pra contos e agora estou mais nas crônicas e ensaios… Diria para não se cobrar tanto e contemplar mais o que é belo.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Eu quero muito editar meu primeiro livro mas sei que tem muita coisa pra acontecer. Ainda vou ler textos inéditos da Carolina Maria de Jesus e também tenho vontade de conhecer livros que tenham uma edição menos engessada que transite entre linguagens com mais leveza e que lidem com a travesti de forma mais digna.