Bárbara Bija é escritora.

Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Sim. Eu acordo bem cedinho, passo um café… Então sigo um cronograma semanal de exercícios físicos, com caminhadas diárias e um revezamento entre musculação e yoga. Depois bato um suco verde, estico um pouquinho no sol, algumas vezes aproveitando pra ler. Tem sempre uma rotina de casa também, roupa pra lavar, almoço etc. Começo a trabalhar por volta das 10 horas.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Eu trabalho melhor pela manhã, mas estou tentando migrar a rotina de escrita pro início da noite, justamente porque a manhã é corrida, vários compromissos. Tenho outros trabalhos durante o dia. No fim da tarde, já estou mais serena, com as tarefas cumpridas… Sigo um cronograma de leitura bem disciplinado também. Então eu leio por uma hora, mais ou menos, e depois escrevo, ou vice-versa, depende do dia e do livro do momento. Na maior parte das vezes, olho para o papel branco por um bom tempo, mas eu insisto, continuo ali esperando o texto chegar. Sempre chega.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Hoje eu sigo uma meta diária de pelo menos uma página. O meu primeiro livro não foi assim, foi catártico, um fluxo contínuo de trabalho. Em geral, preciso de todo o resto funcionando bem pra escrever, uma base sólida. Disciplina é importante demais, mas às vezes o processo criativo reivindica uma entrega total e caótica.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Sempre é difícil começar. Eu gosto de VER tudo, eu preciso enxergar o quadro todo. Organizo murais gigantes na parede, vários quadradinhos coloridos, setas e retas com durex ou lã… Tipo uma detetive. Vou convivendo com esse conjunto de informações durante um tempo, e parece que ele tem vida própria, tipo um Frankestein.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
O julgamento é o pior inimigo do processo criativo. Por isso tento não julgar nada antes ou durante. Vou escrevendo, escrevendo… No final, edito. Muito texto ruim não tem salvação mesmo, ou vai ter salvação depois de anos, quando encontrar uma outra ideia, outro fragmento. Edito muito, acho que noventa por cento da minha escrita é edição. Brinco até que eu escrevo com tesoura e cola. Sobre não corresponder às expectativas, penso assim: cada leitor é um universo sem controle. Se eu gosto de um texto que botei no mundo, tento frear pensamentos sobre a aprovação dos outros, porque não adianta. Claro, causa certa ansiedade, mas aí entra o controle mental. Lido com a ansiedade me organizando – tenho as listas, os cronogramas, as metas, tudo anotado. Um dia de cada vez.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Leio tantas, mas tantas vezes que acabo decorando. Meses depois, o texto ainda reverbera na minha cabeça. Leio em voz alta, de vez em quando gravo e me escuto… Mostro pra alguns amigos, às vezes pra minha mãe e meu companheiro também.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Estruturo o texto no caderninho, depois digito. Meu pensamento é muito analógico, preciso da caneta e do papel pra ignição – o computador só funciona pra mim quando já desenvolvi pelo menos uma parte. Parece loucura, mas até na dissertação de mestrado, eu imprimi as citações e colei no caderno pra “enxergar” o texto completo.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativa?
Desde pequena, tenho uma relação louca com as palavras – em geral, minhas ideias vêm delas, cada palavra me conta uma história. Então só escuto. Eu cultivo o silêncio e a leitura como hábitos pra nunca parar de escutar essas histórias.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesma se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Eu sempre escrevi, mas só depois de me levar a sério – a escrita como profissão –, criei uma disciplina de trabalho. Se eu pudesse voltar no tempo, acreditaria mais em meus textos, julgaria menos, trabalharia mais e não jogaria nada fora.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Meu sonho é escrever um romance. Eu gostaria de ler/escrever um livro integralmente autorreferencial, desde a capa, passando pelas orelhas, até as notas de rodapé – um livro autoconsciente de sua existência enquanto livro… Talvez o livro que Mallarmé desejou a vida inteira.