Arlene Lopes é poeta, cronista e compositora.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Meu dia começa cedo. A parte da manhã é a parte melhor aproveitada do dia, apesar de ter sempre muitas coisas para fazer, tento manter uma rotina saudável: Café da manhã, academia, carinho nos gatos, passeio com os cachorros, praia (já que atualmente moro num lugar de praias paradisíacas) e trabalho.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Gosto de fazer tudo pela manhã quando sou mais produtiva e tenho mais inspiração. No entanto tenho escrito à noite, quando não adormeço por cima do computador, pois também costumo dormir cedo. Tinha como ritual, a necessidade de um ambiente limpo, organizado e tranquilo. Agora só preciso que a minha cabeça não esteja bagunçada. Apesar da minha aparente calma, sou agitada por dentro e às vezes fico rodopiando igual ao urso Fatso (do pica-pau).
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Geralmente escrevo em períodos concentrados, mas isso não é uma regra. Nos últimos dois anos, mudamos do sul para o nordeste, contabilizando três cidades, então isso interferiu diretamente na escrita. Mas não me imponho metas diárias.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Meu processo de escrita acontece de modo simples, na introspecção, no silencio reflexivo. Começo anotando alguma palavra ou frase e então desenvolvo às vezes sagrando, noutras a escrita simplesmente flui. Concluir pode ter tão difícil quanto começar.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
As travas da escrita são comuns e a procrastinação acontece pela falta de tempo e/ou cansaço. Quanto aos projetos longos… se são longos, requer paciência e ela ajuda a reduz a ansiedade. Com o passar do tempo, relaxei em relação ao medo e as expectativas, afinal sou apenas alguém que escreve por gostar escrever.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Escrevo sem compromisso, apenas por gostar de escrever. Os textos curtos, aqueles que as pessoas chamam de poesia, (digo apenas que são textos, não sou poeta e o me sinto poeta), reviso pouco. Coisas maiores reviso bastante, escrevo e reescrevo. Dou um tempo, volto e reviso novamente. Não costumo mostrar meu trabalho a outras pessoas, mas algumas vezes mostro ao meu marido.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
A tecnologia facilita tudo. Escrevo direto no computador.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativa?
Minha mente está sempre quicando. As ideias vêm de experiências vividas e também do sentir, do ouvir e do olhar ao redor. Não cultivo hábitos, mas observar pessoas e o universo em que vivem, o modo como se expressam, é sempre uma boa maneira de se manter criativa. Pessoas podem ser muito interessantes.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesma se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Os primeiros textos que apresentei publicamente, foram mais uma espécie de exorcismo das perdas e dores que me pesavam. Se eu pudesse voltar a escrita dos primeiros tempos, não mudaria nada, assim como não se muda o passado. Elas são a expressão daquele momento. Sendo bom ou ruim o importante é a aceitação. Nunca tive técnica, sempre escrevi de modo intuitivo, mas antes eu tentava conduzir. Hoje deixo o texto me pegar pela mão, me apresentar personagens e conduzir o caminho.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Estou escrevendo um romance que está andando com muito esforço e a passos lentos. Espero conseguir concluí-lo. Esse seria o livro que ainda não existe e o qual gostaria de ler, não por ego, mas como uma recompensa pessoal pelo trabalho e tempo envolvidos.
Ao dar início a um novo projeto, você planeja tudo antes ou apenas deixa fluir? Qual o mais difícil, escrever a primeira ou a última frase?
Quando inicio um novo projeto primeiro deixo fluir, depois vou planejando e organizando.
Talvez a última frase seja a mais difícil, mas não necessariamente.
Como você organiza sua semana de trabalho? Você prefere ter vários projetos acontecendo ao mesmo tempo?
Geralmente a minha semana de trabalho é bastante corrida pois mantemos (meu marido e eu) um centro cultural independente A Sonora Casa Santiago De Arlene, onde temos uma escola de música e desenvolvemos um projeto social com crianças e adolescentes de famílias de baixa renda que vivem em área de vulnerabilidade. Aqui eles tem aulas de violão, canto, composição, musicalização e algumas oficinas de arte.
Também os incentivo à leitura e os auxilio com reforço de português, pois a maioria tem muita dificuldade em escrever minimamente correto. Ainda no nosso espaço, temos outros projetos, como o Sonora Double música e poesia que fazemos na Quinta no Quintal.
Somados a estas atividades estamos sempre realizando outros projetos. Portanto tudo acontece ao mesmo tempo.
O que motiva você como escritora? Você lembra do momento em que decidiu se dedicar à escrita?
O que me motiva é ler. Através da leitura aprofundo o meu ‘sentir’ que considero necessário para a escrita.
A escrita me surgiu como uma necessidade de exorcizar meus monstros e encarar meus abismos e não consegui mais parar. Daí veio a dedicação, embora nem sempre consiga me dedicar como gostaria.
Que dificuldades você encontrou para desenvolver um estilo próprio? Alguma autora influenciou você mais do que outras?
Acredito que meu estilo veio do modo como a vida se apresentou diante de mim.
Na adolescência li Gabriel Garcia Marquez, João Ubaldo Ribeiro, Simone de Beauvoir, Anais Nin, Florbela espanca, Cecília Meireles entre outros. Os autores, sejam mulheres ou homens, sempre nos influenciam de algum modo.
Você poderia recomendar três livros aos seus leitores, destacando o que mais gosta em cada um deles?
Dois contemporâneos e um clássico:
Eis o mundo de Fora de Adrienne Myrtes – um romance com trechos de reflexões sobre vida/amor//morte. Onde a dor física e psicológica é uma questão central, onde a franqueza dos personagens espelha as nossas fraquezas.
Cabeça de Antígona de Patrícia Porto – Os poemas deste livro são navalhas e bofetadas. Expurgos escritos com desvelo.
Os trabalhadores do mar de Victor Hugo – Um romance da mais alta estirpe literária, cujo autor dispensa apresentação e a tradução é de Machado de Assis. Um clássico que fala da da colisão do homem com a natureza e da sociedade. Qualquer comentário que eu faça, é insignificante diante da imensidão desta obra.