Anita Krepp é jornalista e produtora de conteúdo audiovisual em Barcelona.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Sair da cama com o pé direito pode ser considerado um ritual? Pois é o que eu faço diariamente, rs. Em seguida, aquela higiene para desamassar a cara e iniciar, já na sala de casa, uma meditação que pode ser de dez minutos ou meia hora. Ainda de barriga vazia, lá pelas 7h30 pego minha bike e vou para aula de yoga. Sim, eu tento ir à yoga todos os dias. Quando não rola pela manhã, lá vou eu à noite. Tenho me dado conta do quão nocivo é abrir o celular logo cedo, então venho tentando deixar esse vício bizarro. Pelo menos até às 9h30 / 10h a única coisa que abro é o Spotify para ir escutando Baiana System no caminho. É que eu acho o Baiana a melhor coisa que tá rolando, e combina tão bem com o rolê de bike, que eu invariavelmente escolho algum disco deles dia após dia, nem sei como aguento hahaha!
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Depende da época do ano e do que eu tô escrevendo. Como moro em Barcelona, uma cidade com as estações bem marcadas, durante o outono e o inverno, por exemplo, rola de escrever a qualquer hora do dia, inclusive à noite e de madrugada. Bem diferente do verão, quando eu tento guardar um tempinho para mim lá pro fim da tarde, para ter tempo de pegar uma praia e ver o pôr-do-sol (tamo falando de 21h30).
O ritual de preparação também vai de acordo com o que vou escrever. Se é uma reportagem, eu anoto todos os pontos mais importantes para ir desenvolvendo em parágrafos.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Mais do que uma meta diária, eu tenho deadlines cada vez mais apertados rs. Além das reportagens que produzo, também escrevo pautas para vender o que serão as futuras matérias e isso por si só já me come bastante tempo. Mas essa é a parte glamourosa da coisa. O que realmente paga as minhas contas são os conteúdos que produzo para blogs, redes sociais e roteiros de youtube para marcas no Brasil, na Espanha, em Portugal e nos Estados Unidos. Tento concentrar tudo entre 10h e 20h, mas, de novo, isso pode variar se um dia eu não conseguir ir à yoga de manhã, daí eu começo a trabalhar às 8h e termino às 18h, saio correndo para a yoga, e às vezes volto a retomar a escrita até altas horas. Já deu pra notar que sou um pouco caótica, né? Mas a disciplina yogi, pelo menos, eu garanto rsrs.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
É difícil pra dedéu! Sobretudo quando é um tema delicado ou que de alguma maneira estou próxima. Depois de ter a pesquisa ou a apuração pronta, idealmente eu converso com os amigos para contar oralmente e estruturar a história fora da minha cabeça. Geralmente é nesse exercício que encontro um lide interessante. Quando estou consumida pela história, penso nela na bike, no metrô, enquanto almoço, e também aí é comum pintar um molhinho especial na narrativa, daí anoto ou gravo como nota de voz no celular para não perder a eureka.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Se essa pergunta tá aqui é porque é um big deal para todos nós, né? Pois para mim também. Ainda não tenho um antídoto para nada disso. E você é prova viva! Quantos meses demorei para responder a essa entrevista? rsrs
Mas, olha, acho que a yoga (ó ela aí de novo, gente) me ajuda a me organizar mental, física e psicologicamente. Então espero que dentro em breve eu já esteja muito mais fodona ao tratar desses temas. Como essa resposta certamente não aportou nada até aqui, rs, objetivamente dá pra dizer que trava de escrita se rompe escrevendo, procrastinação se vence criando um time blocking, a ansiedade em projetos longos pode ser balanceada com outros de curto prazo e o medo de não corresponder não sei nem o que é (tenho ascendente em leão hahaha).
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Eu vou lendo o texto em voz alta a cada novo parágrafo que adiciono, pra ver como soa lido assim. É como eu prefiro ler, em voz alta. E se for para alguém, melhor. Tão logo termino, passo para o Felipe Lima, meu melhor amigo e também jornalista, revisar. Muito mais detalhista que eu, ele sempre contribui com ótimos pontos que me fazem refletir e muitas vezes modificar o texto. Tenho mais dois ou três amigos editores com quem temos a liberdade de trocar textos e impressões. Dentro do meu processo de criação é fundamental poder compartilhar e ouvir opiniões. Quando não há um jornalista ou editor por perto, vale a opinião de qualquer outro amigo, porque o ouro é a multiplicidade de olhares.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Sempre no computador. E o motivo é simples: digitar acompanha o compasso do meu pensamento. Isso sem contar a facilidade para arquivar o texto. Escrevo à mão poesia, postais, alguma anotação pontual e cartas de amor 😉
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativa?
As ideias, como todo o resto, vêm da minha interação com o mundo exterior. Parece óbvio, mas é fundamental trocar com as pessoas. É através delas que chega o novo. Ouvir o que as pessoas têm para falar, o que as impressiona, assusta, apaixona, encanta, é um celeiro enorme de ideias. Mas também do básico, né, filmes, músicas, exposições e mostras, além, obviamente, de outras reportagens, outras peças de conteúdo. E dentro disso, acho que os hábitos que realmente importam são os de bem-estar, que me deixam brilhando por dentro e por fora. Fazer minha yoga, escalada, caminhadas na natureza, botar a cara no sol, comer vegetariano. No meu mundo não existe produção de qualidade quando não estou em equilíbrio nesses aspectos fundamentais.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesma se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Eu parei de buscar a perfeição. Porque ela não existe. E quando existe, é relativa. Antes eu ficava com o texto um tempão, mudava, voltava, queria falar rebuscado achando que fosse impressionar os leitores por tamanha erudição. Quando na verdade o que eu conseguia era um texto confuso com forma ok mas conteúdo misterioso. Hoje, eu diria “amiga, escreve aí com coração e sem pretensão que o resto vem”.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Eu tô me especializando em cannabis, e há uns bons meses estruturando a ideia de um blog com notícias do setor, tanto medicinal quanto recreativo. Também me aproximo do audiovisual, criando vídeos de apresentações e eventos que ainda não foram atualizados no YouTube e tudo isso. Adoraria ler um livro sobre as conexões astrológicas, quânticas, xamânicas, ayurvédicas, numerológicas em atuação no universo, sem ser um livro só de uma coisa ou de outra. Meio pirada, né?