Andreza do Socorro Pantoja de Oliveira Smith é doutora em Direito e professora adjunta da Universidade Federal do Pará.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Meu dia começa bem atarefado, como sou mãe de dois meninos (onze anos e dois anos) a rotina é a de acordar, banho, escola, café, mamadeira. Em algumas manhãs ministro aula na graduação em direito da Universidade Federal do Pará, aí é correria. Porém, não consigo fazer nada sem antes tomar um bom banho e o café com leite e pão que fazem meu dia começar.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Desde a época do vestibular, a noite e a madrugada são as minhas melhores companheiras para estudar. Hoje continua assim, é depois que todos dormem, que a casa e a rua estão calmas que consigo sentar no meu escritório, ligar o ar condicionado (pois em Belém é calor o tempo todo!) e o computador. Sempre trago um copo de 700 ml de água bem gelada comigo. Enquanto vou tomando os golinhos de água, inicio lendo notícias na internet, vejo o que está acontecendo nas redes sociais, checo meus e-mails e informações da UFPA. Em seguida começo a escrever o que tenho para fazer. No último ano tenho me concentrado em escrever artigos, sempre a partir das chamadas de eventos ou revistas.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Nunca tive meta diária. Simplesmente não consigo ter toda essa organização. Quando tenho que escrever, sento e tento ir até onde consigo, geralmente paro quando me sinto exausta, isto porque sempre são muitos os afazeres, são muitos os trabalhos para escrever/corrigir/orientar. Como sou advogada, os prazos são imperiosos nesses momentos. Então, faço uma lista de prioridades e, se o prazo é curto, sento e só paro quando finalizo. Houve oportunidade em que comecei às 23h e só parei às 5h, com tudo pronto.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Minha escrita é metódica. Defino primeiro o título. Depois escrevo o resumo e as palavras-chave. Neles amarro as ideias que irei desenvolver e bibliografia que vou utilizar. O resumo é o meu guia para a produção do artigo completo, sempre releio esse texto introdutório para lembrar o que falta e os objetivos que pretendo alcançar, etc. Em seguida escrevo a introdução, depois o corpo do texto e finalizo com a conclusão e referências. Geralmente nesse momento o texto já está completo, porque durante o processo de escrita vou colocando o texto nas normas exigidas, faço as correções e todas as notas necessárias. É como se fosse uma chefe de cozinha, quando o prato está pronto, a cozinha está limpa!
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Ansiedade é uma característica minha. Mas quando percebo que “travei”, que não consigo ir adiante, eu paro. Vou passear, ficar com os filhos, às vezes passo dias sem pegar no texto se o prazo permitir. Aprendi isso com a minha orientadora do mestrado e doutorado, que é historiadora e antropóloga, professora Jane Felipe Beltrão. Ela me dizia que eu deveria “estranhar” o texto. Um dia eu perguntei o que era isso, porque eu pensava “como vou estranhar algo que eu escrevi?” Ela, então, explicou: estranhar é dar um tempo, esquecer um pouco para depois reler e verificar o que precisa mudar ou melhorar. Aí está a chave. Exercer o estranhamento é a chave que encontrei para trabalhar em longos projetos, o que oportuniza reflexão e controle do que está sendo produzido. Comigo sempre deu certo. Quanto ao medo de não corresponder às expectativas, penso que ele faz parte da nossa natureza humana. Mas buscar orientação nos mais experientes é uma atitude de humildade acadêmica que nos ajuda a amadurecer e a superar esses medos. A academia é contaminada por vaidades, mas ela não faz parte da minha jornada.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Reviso tantas vezes quantas sejam necessárias para mim, sempre que entendo importante peço para o meu marido ler. (risos) É interessante como ele aponta questões que eu nem havia pensado que estavam (ou não) ali.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Eu sou totalmente adepta à tecnologia. Não uso papel nem para fazer rascunhos. Leio os livros e artigos que vou usar e escrevo as ideias e citações direto no computador. Penso que irei perder tempo se fizer rascunho no papel e depois digitar. Até os livros e artigos tenho priorizado em PDF, assim posso levar comigo para onde for sem carregar nada além do notebook.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativa?
Há dez anos pesquiso sobre o mesmo tema, mas ao longo desse tempo fui enveredando, por demandas da pesquisa e/ou do campo, por temas conexos. Então a rotina acadêmica acaba me mantendo criativa, são tantas as oportunidades, congressos, revistas, orientações, convites, pesquisas, parcerias, que ainda não tive tempo de escrever se não fosse por essas demandas. Mas acredito que estar aberta às oportunidades interdisciplinares tem sido fundamental, pois apesar de ser do direito, tenho escrito muito nas ciências sociais, inclusive em coautoria.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesma se pudesse voltar à escrita de sua tese?
Acredito que o tempo me tornou mais ágil, inclusive pelo acúmulo de leitura que faz com que eu tenha na cabeça muitas referências. Fiquei mais exigente também. Defendi a minha tese de doutorado junto ao PPGD da UFPA há um ano, ainda não tive tempo de voltar a ela. Mas já fiz isso com a minha dissertação de mestrado defendida no mesmo programa em 2010. Penso que, se eu voltasse à escrita da dissertação, faria muita coisa diferente, porque fiz o “estranhamento”.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Eu gostaria de fazer um projeto de pesquisa internacional, em colaboração com outras instituições e pesquisadores para efetivar estudos comparados sobre mobilidade humana e tráfico de pessoas. Esta oportunidade ainda não chegou.
Quanto ao livro, jamais havia pensado nessa questão. Vou refletir sobre ela.