André Regal é escritor.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Para falar a verdade eu demoro um pouco para acordar. Se acordo às 8:00, só estarei disponível às 10:00. Se acordo às 06:00, fale comigo somente depois do almoço. Não que eu fique muito mal-humorado, mas, acordando cedo, fico parecendo aqueles americanos que acabaram de sair do dentista e não falam coisa-com-coisa.
Por conta dessa antipatia com o despertar prematuro, eu acabo tendo rotinas mais noturnas. Mas de qualquer forma, uma ação que é de praxe é eu soltar o dedo na maquininha de café logo quando a remela ainda tá grudada no olho. Só o aroma já me anima.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
A noite alta (de preferência aquela em que todo mundo já tá dormindo) é meu período de maior atividade e criação. Quanto à segunda pergunta a resposta é “sim”. Eu tenho uma metodologia de preparação da história que me ajuda muito quando chega a hora de escrever a prosa (porque a prosa é a última e mais fácil de todas). Eu divido uma história em várias partes, vários itens de estrutura, digamos assim, pra depois virar uma coisa só.
Uma coisa que eu nunca faria é começar a escrever uma história sem saber qual será o final.
“Ah, mas o Stephen King faz isso!”
O Stephen King é louco, mano. Cala a boca.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Escrevo em períodos predeterminados. Por exemplo: “esse ano vou escrever de Fevereiro a Agosto”. Apesar de estar produzindo bastante, não gosto da ideia de escrever freneticamente. Há de se tirar um tempo pra deixar a história maturar e também polir onde for necessário. O escritor precisa ler a própria obra diversas vezes.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Como eu disse num comentário anterior, eu já tenho o ritual de dividir a história antes de escrever. E essa preparação é o mais desafiador, sem dúvida nenhuma! Porém, uma vez que esses 6 itens estejam prontos, partir pra prosa é bem fácil e encorajador. Mas como eu faço isso? Dei uma resumida aqui que vai ajudar a entender meu processo:
a) Conto minha história em duas ou três frases, com início, meio e fim.
b) Traço uma linha num papel e faço uma divisão dos 3 atos e dois pontos de virada.
c) Faço uma escaleta diluindo a história em vários capítulos.
d) Crio fichas detalhadas dos personagens principais (e isso envolve outro método separado que também é um pouco mais complexo).
e) Amarro os capítulos para não ficar nenhuma ponta solta.
f) Escrevo a prosa.
É importante que cada item desse seja tratado com o mesmo carinho com que se trata a prosa.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Não lido e acho que ninguém deveria. “Trava da escrita” pode ser um monte de coisa que todo mundo acaba batizando pelo mesmo nome. Às vezes o cara tá deprimido porque falta grana pra pagar a luz! Poxa, é difícil escrever assim. Isso é “trava de escrita”? Pra mim isso é trava de tudo!
Eu não acredito mais em bloqueio criativo, principalmente depois que comecei a montar metodologia pra escrever. Quando você se prepara antes, não há bloqueio.
Quanto ao medo de não corresponder às expectativas, vai de cada um. Eu adoro quando blogueiros e blogueiras pegam meus livros e prometem fazer resenha. Fico nas nuvens! E me borrando de medo.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Eu nunca reviso porque isso tem de ser feito por um(a) profissional.
Agora… mostrar o livro a alguém antes de pensar em publicar é essencial. Qual o melhor tipo de leitor beta? Aquele que você sabe que vai falar “tá uma merda”.
Meu conselho seria: “nunca deixe a vontade de receber elogio te fazer entregar o livro a um amigo puxa-saco”. Isso prejudica muito, mas muito mais.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
À mão eu só escrevo aquilo que eu tô com pressa pra registrar, mas os originais vão sempre o computador. Odeio máquina de escrever, também. Troço desconfortável e lerdo!
Mas eu queria uma vintage na minha estante, só pra olhar.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativo?
Todas, sem exceção, vêm do dia-a-dia. Vêm das conversas nos ônibus e metrôs, dos vendedores ambulantes, das donas-de-casa. Costumo inclusive deixar um app gravador de voz à mão pra registrar alguma ideia bem no meio do trânsito, quando necessário.
Essas situações ganham roupagem fantástica nas minhas histórias, mas de uma forma ou de outra, todas existiram e eu presenciei.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesmo se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Eu sou implacável quando o assunto é criticar e o que mais critico é meu próprio texto. “O Brakki “saiu em Setembro de 2018 e tá arrebentando, graças a Carl Sagan, mas esse livro nasceu em 2015! Ficou tão ruim que em 2017 eu deletei o arquivo e o reescrevi inteiro.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Esse ano escrevi um longa-metragem e vou tentar de tudo pra conseguir levantar grana pra rodá-lo. Mas a Mirta não vai parar no primeiro livro, isso é uma certeza (desde que eu esteja vivo e com saúde)! Quero fazer uma coletânea de novelas da personagem.
Outra coisa que já está acontecendo é a tradução da loirinha pra eu levá-la para o exterior.
Quanto à segunda pergunta, eu só lamento que escritores que adoro, como o Tolkien, já tenham morrido. Eu queria ler ainda muito mais!