Anderson Shon é escritor, professor e super-herói nas horas vagas, autor de Um Poeta Crônico (2013).
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Acordo, coloco minha perna direita pra ter contato com uma faixa de sol que entra pela janela, como uma maçã, tomo um café reforçado e vou malhar. Dificilmente escrevo pela manhã, quando estou de férias aproveito para ler um pouco, quando estou trabalhando é meu horário de dar aula, é a hora que eu visto meu uniforme e vou para a batalha.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Ritual, ritual, não. Me sinto mais produtivo no meio da noite, ali pelas 20h, aí escrevo até às 24h e depois vou dormir. Se há um ritual, talvez seja manter a cabeça longe de problemas, eles nunca me deixam escrever bem.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Eu sempre me coloco uma meta quando estou escrevendo um romance. No momento, acabei de escrever meu segundo livro de poesia, como escrevi nas férias, me deixei mais livre, curtindo todo o processo, esquecendo que já é algo profissional, pois é essa obrigação que tira o tesão da escrita.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Eu leio muito antes de começar a escrever algo, mas a fase mais importante é a maturação no meu cérebro. Fico quase um mês só pensando nas possibilidades, sem escrever nada. Se depois desse período tudo ainda parecer uma boa ideia, aí eu começo a escrever. Se fugir da minha cabeça, era por que a ideia não tinha consistência, não iria dar em um bom texto.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Eu sofro muito com a ansiedade e por vezes ela não me deixa fazer nada. Eu faço terapia e tento equilibrar a autocobrança, pois tendo a sempre a achar que estou fazendo muito menos do que posso, e nem sempre isso é verdade.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Um milhão! (risos) Mostro sim, tenho alguns leitores beta que são muito importantes. Meus amigos são fundamentais nessa parte de pré-finalização.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Eu sou muito mais produtivo escrevendo a mão, mas sempre uso o computador, não tem jeito. A tecnologia é uma arma valiosa para os escritores. Tenho admiradores no Rio Grande do Sul, minha poesia já chegou num trabalho dos alunos da UERJ, sem evoluções tecnológicas isso seria impossível.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativo?
Do cotidiano. Criei o que chamo de poesia crônica, que é a junção dos dois gêneros textuais. Preciso ser abastecido pela rotina para poder escrever. As emoções também são fontes ricas de inspiração. A minha namorada também, mas ela me pediu pra parar de escrever poesia pra ela. (risos)
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesmo se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Mudou muito. Eu leio bastante sobre o processo da escrita. Stephen King me ajudou muito nisso. No começo eu acreditava que precisava baixar um Santo inspirador e se ele não entrasse em mim eu não podia fazer nada. Hoje já sei que escrever é muito mais transpiração do que inspiração. Olha, se eu encontrasse o Shon dos primeiros textos eu iria mentir dizendo que os textos eram bons, só para incentivá-lo a continuar escrevendo.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Eu gostaria muito de escrever minha própria saga de super-heróis. Até já comecei, todos eles são negros e a temática afro será bem presente, mas sem ser um livro político, ela servirá como background para uma história que tem como objetivo entreter e refletir. Adoraria ler a biografia do Thom Yorke, acho que ela virá em breve.
Ao dar início a um novo projeto, você planeja tudo antes ou apenas deixa fluir? Qual o mais difícil, escrever a primeira ou a última frase?
Eu sempre começo um novo projeto a partir de um bom final. Pra mim só vale a pena escrever algo se eu souber como aquilo irá terminar. Eu sempre planejo o que eu for transformar em livro, mas deixo muita coisa fluir, na verdade, a história já existe, ela está me usando como porta-voz, então é só deixar as mãos dançarem para que a narrativa, poesia, conto, possa nascer. O planejamento é algo bom, pois isso não te deixa sair dos trilhos, mas tem história que merece um pouco de caos.
Como você organiza sua semana de trabalho? Você prefere ter vários projetos acontecendo ao mesmo tempo?
Eu nem tenho como fazer isso muito bem. Sou professor de Redação também, minhas duas profissões são tão próximas que, às vezes, se atrapalham. Prefiro pensar em um projeto por vez, mas acabo fazendo tudo ao mesmo tempo, como agora; estou respondendo essas perguntas e editando o meu audiobook. Sou um labutador da literatura.
O que motiva você como escritor? Você lembra do momento em que decidiu se dedicar à escrita?
A resposta das pessoas que têm contato com os meus escritos. Isso me motiva muito. A literatura já me apresentou pessoas, me fez viver momentos, descobrir mundos que sozinho eu não conseguiria, isso me motiva demais a continuar escrevendo. Não lembro, acho que foi depois de assistir o Fabuloso Destino de Amelie Poulain e querer escrever um livro com a mesma estética da narração do filme.
Que dificuldades você encontrou para desenvolver um estilo próprio? Algum autor influenciou você mais do que outros?
Tenho um estilo muito peculiar. Envolvo poesia com humor e tento criar metáforas com palavras simples e com situações cotidianas. Eu fui influenciado por muita gente, mas vejo que hoje, pelo que escuto, tenho um jeito próprio de declamar poesia que, ainda bem, tem agradado bastante.
Você poderia recomendar três livros aos seus leitores, destacando o que mais gosta em cada um deles?
Vou me fixar em autores baianos, pois aqui há uma quantidade de gênios que precisam ganhar o mundo.
Gastaria Tudo Com Pizza – Pedro Duarte
Amor é uma Conexão Discada – Saulo Dourado
O Diferencial da Favela – Sarau da Onça
e se me permitir…
Outro Poeta Crônico – Anderson Shon