Ana Lucia Sabadell é professora Titular de Teoria do Direito da Faculdade Nacional de Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Sim. Me alimento com produtos orgânicos há 35 anos. Então, pela manhã tomo em jejum GUEBA. Uma espécie de chá de cogumelo do sol orgânico e depois de 20 minutos como frutas, tomo yogurte, cereais e mel. Todos os dias.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Isso depende muito da idade, ao menos no meu caso. Quando era jovem adorava me embrenhar pelas noites, virar um dia e noite escrevendo. Na atualidade, trabalho melhor pela tarde. Não tenho um ritual mas tenho que ter um tema na cabeça, algo com que me identifique e goste muito. Do contrário, opto por não escrever.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Só se estiver com prazo escrevo todos os dias. Coloco meus sentimentos naquilo que escrevo. Por mais que seja meu ganha pão, eu escrevo por paixão. E nem todos os dias estou inspirada. Mas como lhe disse, tudo depende do compromisso. Se tenho um prazo com o editor, foco e posso trabalhar até 14 horas por dia. Não tenho meta de escrita diária, não. Isso nem combina comigo…
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Tudo mudou na minha vida depois de ser mãe. Meu filho interrompe, entra no escritório, pede atenção e eu paro de escrever. Coisa que não fazia antes da maternidade. Hoje é difícil começar por conta disso. Agora mesmo, estou lhe respondendo e escuto “mãeeee!!!”. Mas isso não é um problema, ao contrário, é um prazer. Só mudou meu ritmo e minha forma de escrever. Como sou hiperativa, não me causa problema mudar o foco de atenção. Sair de uma situação e entrar em outra. Com os textos: primeiro leio textos impressos (livros, artigos). Gosto de tocar no papel, não nasci na geração dos computadores. Aí faço algumas anotações em papeizinhos das ideias centrais. Mas em geral leio muito e começo a digerir o tema na cabeça. Depois vou na internet ver se encontro textos em outros idiomas que me estimulem. Obviamente sempre textos científicos porque, infelizmente, não faço literatura.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Reflito sobre a procrastinação, penso no que ela significa naquele momento. Tenho textos que comecei a escrever e depois travei de tal maneira que acabei abandonando-os. Algumas vezes isso me incomoda porque trabalho com questões de justiça (e de desigualdade), aliás, é só sobre isso que escrevo. Então, penso que abandonar um texto é uma forma de desistir de uma luta política, que precisa ser levada adiante.
Não gosto de projetos longos. Já os fiz quando escrevi minhas teses de mestrado, doutorado e pós-doutorado. Prefiro projetos que não ultrapassem um ano, mas ainda mantenho alguns por questões de trabalho. É muito pesado trabalhar em um projeto por 4 ou 5 anos. Porém, quem quer seguir carreira científica precisa de títulos que implicam na realização de projetos longos.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Ih!!!! Isso é difícil de dizer. Chutando, ao menos umas vinte vezes, porque, com o computador, posso sempre fazer novos ajustes. E, em geral, sempre envio meus textos para alguma colega ler.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Só anoto em algum papelzinho poucas ideias. Meu processo de criação está estritamente ligado ao computador. Adoro o fato de poder reescrever, cortar, jogar com o texto. Isto me possibilita trabalhar de forma criativa.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativa?
Minhas ideias são oriundas do profundo sentimento de indignação que sinto contra essa sociedade alienada, competitiva e extremamente cruel na qual vivemos. Sim, leio temas jurídicos, escuto Jazz e música clássica.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesma se pudesse voltar à escrita de sua tese?
Eu amadureci e acumulei conhecimentos. Isso obviamente se reflete na minha escritura. Não sou a mesma que escreveu seu primeiro trabalho científico aos 24 anos. E não escrevo mais como escrevia na época do doutorado. Olha, eu fiz 4 teses na Europa (2 mestrados, um doutorado e um pós-doutorado). Eu me dediquei muito, excessivamente, a todas as minhas teses e sempre obtive a nota máxima (summa cum laude). Porém, se eu pudesse voltar no tempo… ah! Algo importante!!! Gostaria de levar um celular para tirar fotografias dos livros de 1400, 1500, 1600 e 1700 porque não podia tirar esses livros das bibliotecas e levá-los para estudar em casa.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Criar um novo sistema jurídico desvinculado da opressão patriarcal, pois o que temos será sempre machista (porque é machista na sua própria estruturação). Gostaria de ler um livro que tivesse a capacidade de aniquilar com a alienação do mundo moderno, que tivesse a capacidade de sensibilizar as pessoas e que fizesse brotar em cada um de nós o sentimento de solidariedade verso ao outro (empatia). Porque um livro com tais qualidades seria uma espécie de “arma letal” contra a desigualdade.