Ana Johann é roteirista, diretora, consultora de projetos e professora de roteiro cinematográfico.

Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
A minha rotina acredito que não seja diferente de outra profissão. Acordo cedo, por volta das sete da manhã, tomo um bom café da manhã (não consigo trabalhar com fome e sem café) e depois disso já olho para as mensagens de whatsapp que agora virou uma espécie de email e confiro a agenda. Gosto de deixar para tarde questões burocráticas. Como tenho os meus projetos, projetos de terceiros e também faço consultoria, me alterno entre eles.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Sou matutina total. Quando não tinha filha experimentava as vezes escrever ao som da madrugada, mas depois que ela nasceu me impus uma outra rotina e a verdade é que nas manhãs estou mais desperta. Sobre os rituais, não acredito em inspiração, mas conhecimento e logicamente tem dias que estamos melhores que outros. Para os meus projetos gosto de ter uma capa, uma imagem e também um título para começar a trabalhar, como uma espécie de visão onde posso me encostar.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Sempre trabalho com planejamento, mas tem projetos que trabalho mais livremente quando posso e outros com prazos mais estipulados. Não tenho meta diária, mas tenho metas por etapas dependendo que tipo de trabalho é, se é um curta, uma série, um longa ou um livro.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Na área de roteiro cinematográfico existe processos de escrita conforme etapas e me utilizo delas, no entanto, a cada projeto vou me aprofundando e experimentando também formas diferentes de criação. Sou pesquisadora da área de roteiro e me encanta as teorias e os processos assim como tabelas em excell (risos). Já escrevi um livro sobre a construção do poético no roteiro cinematográfico e agora depois de tanto estudar e escrever inventei para mim um mapeamento de personagens que tenho compartilhado com os alunos, acredito ser um bom ponto de partida. Em 2020 escrevi meu primeiro romance que está em andamento e ai experimentei algo novo, esboçar minimamente a ideia e me lançar a escrever sem parar. Gosto de pensar na escrita como vómito e depois racionalizar, acho que para a literatura isso funciona melhor do que para o roteiro por exemplo. Mas agora mesmo estou reescrevendo o livro.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Eu sou muito disciplinada e a escrita para mim hoje é como tomar banho, café, uma forma de existência mesmo, então não sofro de procrastinação, sofro do contrário, de trabalhar demais. Acho que a ansiedade é natural, todos temos, mas os níveis são diferentes. Faço ioga, meditação e isso me ajuda muito a centrar no presente. Estou estreando agora meu primeiro longa-metragem de ficção, o “A mesma parte de um homem”, tenho outros dois longas que são documentários e desde que comecei a escrever o roteiro se passaram nove anos. É um exercício de muita fé acreditar no invisível e tornar isso visível.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Escrever é reescrever. Acredito que para nascer um bom trabalho seja um filme, seja um livro é no mínimo dois anos de trabalho por que existe também a escrita em relação ao tempo. Precisamos escrever e muitas vezes nos afastar para olhar de novo o que estamos escrevendo. Em processos iniciais não costumo compartilhar, mas no caso de roteiro envio para laboratórios onde tenho a consultoria de outros profissionais. No caso do meu livro que escrevi em 2020, contratei uma consultora da área de literatura para tanto analisar a dramaturgia como pensar comigo caminhos de publicação para o livro. Como a escrita é solitária, acho essencial esse compartilhamento.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Nunca escrevo a mão (risos). Todos os meus projetos estão no computador e o que tenho é um bloco de notas no celular com o nome de cada projeto, onde eu vou anotando ideias conforme elas surgem.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativa?
Para mim as ideias nascem dos incômodos, daquilo que me atravessa a garganta e preciso falar, das emoções que estão incrustradas no meu corpo, nas vidas que passam diante dos meus olhos e pedem para que sejam ditas.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesma se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
O que mudou é a relação com o tempo e os processos. Para se chegar a algo que vale a pena ser compartilhado, seja um livro, seja um roteiro é preciso se debruçar por muito tempo e ter muito conhecimento de dramaturgia. As pessoas se equivocam ao acharem que são alfabetizadas e podem escrever, que não é necessário pesquisa, estudo e foco, por isso acreditam em inspiração. Quando comecei a escrever não tinha toda essa noção.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Milhares (risos). Eu estou trabalhando em projetos de séries que não foram criadas por mim como roteirista e além disso, estou com dois roteiros de longa-metragem em desenvolvimento, assim como dois projetos de séries, um livro e muitas outras ideias.