Ana de Oliveira Frazão é Professora de Direito Civil e Comercial da Universidade de Brasília.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Meu dia começa invariavelmente com exercícios físicos bem cedo, às 6.00, para eu preparar meu corpo e minha mente para as demais atividades. Não tenho como ter rotina matinal fixa, pois tudo depende dos meus compromissos acadêmicos e profissionais. Neste semestre, por exemplo, darei aulas na UnB nas manhãs de segunda e terça das 8.00 às 11.40, o que já inviabiliza que eu dedique as referidas manhãs para a escrita.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Como minha rotina costuma ser muito atribulada, procuro aproveitar qualquer horário para escrever, sem rituais nem horários predeterminados. Por isso, me acostumei a escrever em diferentes horas do dia, da noite e mesmo da madrugada e em diferentes locais, inclusive aeroportos e aviões. Após muita luta e esforço, eu hoje consigo me concentrar em qualquer lugar, mesmo com barulho e movimento ao meu redor, o que é uma vantagem. Entretanto, é óbvio que eu deixo os estágios mais delicados da escrita para locais e momentos mais adequados. Para o momento da escrita que envolve pesquisa e referências, prefiro fazer em casa e nos finais de semana, em um ambiente bem tranquilo. Para a revisão final, eu preciso de silêncio absoluto e da versão impressa.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Não tenho metas diárias, até porque minha rotina me impede. Procuro ter metas semanais e mensais, pois aí eu consigo fazer compensações. Agora eu tenho uma coluna quinzenal no Jota, o que me exige que mantenha uma regularidade quinzenal. Tento escrever todos os dias, ainda que por pouco tempo, embora nem sempre isso seja possível.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Meu processo de escrita começa com a identificação prévia de um problema e de uma hipótese. A partir daí vem o estudo e a pesquisa do tema, o que pode exigir, dependendo do assunto, fichamentos. Depois eu coloco no papel todos os aspectos do assunto que me inquietam, mesmo que de forma caótica, sem me preocupar com referências. A partir deste primeiro esboço, eu reajusto, se for o caso, o problema e a hipótese, faço uma estrutura prévia e começo a escrever sem maiores preocupações, buscando simplesmente dar corpo ao texto. Somente depois é que começo a trabalhar o texto sob o ponto de vista da consistência e concatenação. A partir daí, começo a conectar o texto com as notas e a me preocupar com estilo e questões formais.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Eu já tive muitos problemas com isso, mas hoje estou bem melhor por duas razões: experiência e humildade. Quanto mais você escreve mais fica fácil escrever. Então a prática é um excelente remédio para as travas. Por outro lado, escrever envolve igualmente um exercício de humildade, porque você se submete à crítica e se confronta o tempo todo com a sua falibilidade. Não vou dizer que é um processo fácil, até porque isso requer um exercício constante, mas reconhecer e lidar bem com a possibilidade de cometer erros facilita consideravelmente o processo de escrita.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Depende muito do texto. Como disse anteriormente, meu processo de escrita já requer constantes revisões, pois coloco no papel o texto bruto e depois vou trabalhando com ele por meio de revisões. Entretanto, mesmo depois que ele está fechado, ainda preciso de pelo menos duas revisões finais atentas. Normalmente mostro meus trabalhos para pelo menos uma pessoa, a fim de me ajudar com a revisão.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Minha relação com a tecnologia não é das melhores nem das piores. Entretanto, já me acostumei a escrever direto no computador, até porque digito com extrema velocidade. Então nem cogito de escrever à mão, porque me tomaria muito mais tempo. Eu gosto da experiência do computador, porque dá para escrever praticamente no mesmo ritmo em que vou estruturando as ideias no pensamento.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativa?
Sim. Procuro ler o máximo possível, acompanhar as discussões sobre os temas do meu interesse e anotar os assuntos que são importantes, argumentos ou perspectivas interessantes. Ando sempre com um bloquinho para fazer isso e, quando esqueço, tenho sempre um arquivo no celular para anotar temas e/ou aspectos para serem usados em artigos presentes ou futuros.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesma se pudesse voltar à escrita de sua tese?
Acho que fiquei mais objetiva e direta, além de ter passado a aproveitar mais o processo da escrita. Antes era mais sofrimento do que prazer. Hoje é claro que, a depender do tema e do momento, existe um certo sofrimento, mas normalmente os momentos de prazer são bem maiores e mais intensos. Sobre a tese, eu diria a mim mesma para aproveitar mais o processo, ser mais generosa e condescendente comigo e não sofrer tanto.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Nossa, eu tenho tantos projetos que seria até difícil enumerar. Procuro ter muitas metas porque, mesmo se cumprir apenas parte delas, já estarei na vantagem. Na área jurídica, sinto falta de livros que abordem as relações entre direito e economia sob uma perspectiva multidisciplinar e com pluralidade metodológica. Pretendo escrever um livro sobre esse tema no futuro.