Ana de Hollanda é cantora, compositora e ex-Ministra da Cultura.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Não sou uma pessoa de seguir rotina. Atualmente, como não exerço nenhuma profissão que me exija horários rígidos, adapto o dia às necessidades. Mas pela manhã costumo ler jornais e blogs, responder às mensagens e postar nas redes algo que me pareça interessante. Os textos maiores, deixo para a noite, quando me sinto mais inspirada.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Eu trabalho com música. Então, reservo um tempo para que me dedicar aos exercícios vocais e estudar as músicas e interpretações.
No entanto, como sou também letrista, é aí minha escrita se realiza. Gosto de escrever a letra a partir de uma melodia pronta. Até quando componho a melodia, ela é que me inspira a colocar as ideias e palavras. Para colocar a letra numa canção, escuto a melodia repetidas vezes durante o dia todo, para alcançar o que ela está contando. Para mim a melodia indica o caminho: quando uma nota sobe demais como um grito ou cai para o grave; os tons menores também me passam uma sensação mais triste do que os maiores. É um processo misterioso e absolutamente pessoal de tentar traduzir a melodia para palavras, respeitando métrica, tônicas e rimas.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
No início escuto mais, rascunho algumas ideias, mas não forço a barra. Quando encontro o mote, depois de alguns versos que já indicam que estou no caminho certo, fico mais obsessiva no trabalho.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Como já disse, escrevo aos poucos, encontro palavras-chave que não pretendo mudar porque elas sintetizam a ideia. Muitas vezes escrevo uma estrofe que não será a inicial, porque ainda não encontrei a forma poética de entrar no assunto. Assim posso escrever a segunda e terceira estrofe até que me surge a abertura.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Sempre lido com o pânico. Até porque na maioria das vezes sinto que vou interferir numa obra musical que já me parece completa. Costumo perguntar ao autor da melodia se algo o motivou a compor aquela melodia, pois às vezes isso vai me ajudar a conduzir a história. Mas o momento crucial, depois de abandonar o trabalho, por semanas às vezes, finalmente rever com outros olhos, com certo distanciamento, como se eu não fosse autora. É aí que tomo coragem para mostrar ao parceiro.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Infinitas. Às vezes depois de mostrar pro parceiro e para outras pessoas, descubro uma pequena mudança que melhora uma frase. Não hesito em mudar o que deve ser mudado.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Sempre começo rascunhando num caderno com lápis e borracha. A partir de algumas estrofes prontas, passo para o computador para sentir melhor como ele soa. O computador me parece mais impessoal do que o caderno com a minha letra.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativa?
Como já disse, a melodia me induz, mas eu também tenho o hábito de visualizar a cena que descrevo, sentir verdade nas palavras dos meus personagens. Para isso, faço um filme na minha cabeça onde tudo deve fazer sentido, por mais surreal que seja.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesma se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Depois que a obra está pronta. Ela já não me pertence mais. Ela tomou vida própria.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Eu tenho um projeto de livro que foge de tudo que fiz e comentei acima, porque seria sobre a experiência vivida em minha gestão no Ministério da Cultura. Talvez eu faça sozinha, talvez eu escreva junto com as pessoas mais próximas que viveram aquela experiência.