Ana Costa é escritora.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Ao acordar escrevo tudo que brota à mente, leio as notícias do dia, leio um bom livro, dou uma olhada nas redes sociais, respondo as mensagens, divulgo meus livros “Volta, se houver motivo para voltar” e “Razão para ser louca”, tomo café, e resolvo as pendengas da casa. Não necessariamente nessa mesma ordem. Eu deveria olhar a agenda, mas não olho, no entanto, leio todos os “post-its” distribuídos pela casa, os quais são dispostos por data e importância. Não pense que sou desorganizada, é assim que funciono. E no decorrer do dia os fatos acontecem conforme o Universo determina.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
O anjo da inspiração costuma aparecer de madrugada e ao acordar, como falei. Esses são momentos nos quais produzo bem. Embora eu não tenha rituais específicos para escrita, tenho o cuidado de estar sempre com lápis e papel por perto, pois, as histórias pipocam na minha cabeça em qualquer hora e lugar. Sou um “ser” esquisito, particularmente, não gosto de ritual para nada. Ritual me faz perder o interesse. Outro dia estava no metrô e ao ver uma cena escrevi palavras-chave no caderninho que me acompanha, pronto, estava feita mais uma crônica. A espontaneidade é minha filosofia.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Escrevo diariamente e é incrivelmente estimulador. O hábito de escrever regularmente é meio mágico, surgem novas histórias, as ideias fluem mais fácil. Não tenho a preocupação de implementar técnicas de produtividade, não costumo contar palavras ou definir meta diária, deixo minha mente trabalhar livremente, sem pressão. Esse método de trabalho tem sido produtivo. Isso me fez lembrar o dito popular, “não se mexe em time que está ganhando”, então, continuo escrevendo sem regras pré-definidas, porém, com regularidade. Às vezes escrevo um parágrafo, outras, escrevo dez ou mais páginas. Certa vez ouvi de um experiente autor que “quanto mais escreve, melhor será o escritor”. Como escrevo todos os dias, seguramente aprimoro a qualidade da escrita e automaticamente aumenta a produção.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Em princípio escrevo tudo que vem à mente, eu diria que faço um “toró de ideias”, depois vou colocando-as no lugar que convém. Vou adequando os parágrafos, a sequência dos fatos, e se necessário, faço as pesquisas e encaixo-as no texto (tudo no gerúndio mesmo, porque acontece assim, aos poucos).
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Observo que, quando termino de escrever um livro eu deparo com a “síndrome do ninho vazio”, e passo por um período de ressaca literária, não consigo escrever durante algum tempo e leio em “ritmo homeopático”. Os especialistas dizem que é normal, acredito, mas confesso que fico frustrada. Com um vácuo na alma. Não sei lidar bem com o vazio literário, porém, quando passa a fase, a vontade e o ritmo de escrever vêm com mais intensidade.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Reviso inúmeras vezes. Aprendi que depois de algumas revisões é prudente ficar um período sem ler o que foi escrito, e quando volto a trabalhar o texto fica mais fácil encontrar as falhas e “limpar” a escrita. Depois de fazer mais uma leitura, ou duas, ou três…, envio ao beta, ao copidesque e revisor. Considero fundamental a opinião de alguém que não esteja envolvido na escrita, a análise crítica e técnica. E também, sugestões para retoques finais da obra são sempre bem-vindas. Não é fácil escrever. Mas quem disse que seria fácil? (risos)
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Digito diretamente no computador, mas, como citei anteriormente, sempre tenho caneta e papel perto de mim para eventual necessidade. Por outro lado, não tenho a habilidade que gostaria de ter diante do computador. Porém, já me acostumei e até dou risada de quão ridícula é a minha inabilidade com a máquina. Tanto é, que recebi o apelido de BIOS (Bicho Ignorante Operando Software). Contudo, procuro me atualizar, pois, atualmente é impossível viver fora do universo tecnológico.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativa?
As ideias vêm das observações do cotidiano, dos sonhos –quando tenho sonho que pode virar crônica escrevo imediatamente ao acordar. Mas, para mim, uma fonte inesgotável de inspiração é a leitura. Também me inspiro ao ouvir música, ao ler ou ouvir uma frase, ao ver uma folha cair da árvore, uma reportagem, enfim, a vida tem muito a nos oferecer, precisamos apenas olhar ao nosso entorno e observar os acontecimentos com sensibilidade e aproveitar tudo como oportunidade. E oportunidade é coisa que não deixo passar. Por exemplo, uma de minhas crônicas favoritas foi inspirada em uma queda bizarra de um ciclista em frente ao meu prédio. Daí, lembrei de um episódio que aconteceu comigo na adolescência, em que eu estava andando de “bike” e um carro bateu no pneu e me derrubou. Excluindo a irresponsabilidade do motorista e o risco de me machucar, a minha queda foi fenomenal. Pronto, ao lembrar do fato estava feita a crônica na minha cabeça e ao chegar a casa escrevi numa sentada só (crônica “Help”, página 48 do livro “Razão para ser louca”).
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesma se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Eu amadureci como pessoa e como escritora, e a experiência traz fluidez na escrita. Sou uma pessoa que busco aperfeiçoar tudo que faço, e na escrita não é diferente, procuro dar o melhor ao leitor. Eu tenho um lema: “Hoje sou melhor que ontem”. Sendo assim, acredito que no presente escrevo melhor do que no passado. Bem, se eu pudesse voltar à escrita de meus primeiros textos, não teria divulgado sem mais revisão. No início de qualquer atividade profissional, naturalmente há a ansiedade de mostrar produção e isso às vezes interfere na qualidade do produto. Na realidade, acho que não fiz feio, mas poderia ter feito melhor. Hoje tenho um olhar mais apurado e crítico.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Gostaria de escrever um romance. Estou ensaiando, me preparando, estou na fase de pesquisa e de compilar conteúdo para escrever uma história bacana, que me agrade e conquiste o leitor. Eu sempre me coloco do outro lado, no lugar do leitor, e escrevo o que não me cansa, aquilo que eu gostaria de ler, exatamente o que me agrada. Somente quando gosto do que está escrito o considero apto a ser divulgado. Em relação ao livro que eu adoraria ler e que não existe, seria pelo menos “um” livro do psicanalista Jaques Lacan que fosse acessível ao meu cérebro, cujo órgão sofreu isquemia e hoje não consigo entender a escrita do francês que tanto admiro. Enquanto isso, vou lendo outros autores não herméticos.