Amanda Flávio de Oliveira é professora de Direito Econômico da Universidade Federal de Minas Gerais.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Não tenho rotina. Na verdade, não lido bem com rotina, costumo confundir, de forma inconsciente, o sentimento de acontecer tudo igual todos os dias ou uma certa regularidade e previsibilidade de agenda com a ideia de eu estar estagnada, sem evoluir. Sei, racionalmente, que essas são situações absolutamente distintas e que alguma rotina pode fazer muito bem à saúde e ao espírito, mas não tenho controle sobre esse meu sentimento. Por isso, sempre que minha vida apresentou fases em que uma rotina era possível, eu me senti entediada.
Cada dia meu tem sido único. Atualmente, tenho viajado muito a trabalho e por isso, cada manhã é única. Acordo sempre às seis horas da manhã e sigo para o cumprimento da minha agenda diária.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
O melhor horário do dia para trabalhar depende do tipo de trabalho que tenho para desempenhar. Para escrever, as manhãs costumam ser o melhor horário. Inúmeras vezes ao longo de minha vida acadêmica eu preferi ir dormir muito cedo e colocar o relógio para despertar às quatro horas da manhã para escrever. Acordo com a cabeça descansada e o silêncio da casa e da cidade me proporciona uma capacidade de reflexão e de organização das ideias mais fluida.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Organizo-me para produzir um texto com início e fim pré-definidos e costumo cumprir meu propósito. O texto é fruto de um esforço concentrado, mesmo que esse esforço dure dias.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
É a leitura sobre os temas centrais e periféricos envolvidos no texto que pretendo produzir que me permite ir estruturando as ideias. Geralmente, os subitens do texto, a forma de abordagem, sua amplitude, vão surgindo ao longo das leituras. Faço anotações rápidas à mão em um papel, que vão sendo aperfeiçoadas até a finalização da etapa de leitura.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Lendo muito. A leitura de bons autores, reconhecidamente de excelência, confere-me a segurança de que estou no caminho certo. Além disso, sempre submeto meus textos a revisores em quem confio pela capacidade técnica e pela amizade, por que sei que não ficarão com constrangimento de me apontar inconsistências e fragilidades.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Reviso uma ou duas vezes e submeto a um ou dois colegas em quem confio pela capacidade técnica e pela amizade. Sempre repito a eles que prefiro críticas dos amigos que dos inimigos. Eventualmente, textos mais relevantes, também submeto a um revisor linguístico.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Escrevo diretamente no notebook, que está sempre comigo.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativa?
As ideias surgem da leitura, sempre. Para escrever textos como discursos e prefácios, que demandam uma abordagem com maior sensibilidade, busco inspiração na leitura ou releitura de clássicos da literatura nacional ou estrangeira.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesma se pudesse voltar à escrita de sua tese?
Acredito que a leitura contínua tem-me conferido, ao longo dos anos, um pouco mais de segurança para escrever e também mais habilidade com as palavras. Sempre haverá, entretanto, aspectos a serem aprimorados e essa é a grandeza da arte de escrever: você nunca se sentirá um autor pronto.
Quanto à minha tese, acho que ela foi o melhor que eu pude fazer naquele meu momento de vida e de maturidade acadêmica. Nesse sentido, não a julgo. Sinto-me satisfeita com a qualidade do que foi produzido àquele momento, porque sei da seriedade com que a enfrentei e do esforço empreendido e sigo em frente.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Rubem Braga escreveu em uma crônica que uma das dez melhores coisas da vida é você ler um livro e morrer de inveja do autor, porque você é quem queria tê-lo escrito.
Eu gostaria de ter escrito tantos bons livros que eu já li! Reside aí a beleza da arte da escrita: tanta coisa linda e relevante já foi escrita, e ainda há um mundo de reflexões e poesias a serem escritas. De minha parte, estarei sempre atenta às oportunidades de refletir sobre temas contemporâneos, jurídicos ou não.