Alex Simões é poeta e performer, autor de “trans formas são” (organismo editora).
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Acordo às 6h e levanto entre 6 e 8 da manhã, a depender dos compromissos do dia. Normalmente levanto, preparo um café simples e tomo meu café, enquanto escuto vídeos de jornalistas-youtubers que comentam as notícias do dia, cumpro com minhas obrigações fisiológicas e higiênicas, e sento no computador. Digo normalmente, porque isso depende do projeto em que estou envolvido, dos prazos, se estou viajando, o que muda muito a rotina, etc…
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Pela manhã, entre as 8h e às 11h, e à tarde, entre 15h e 20h me sinto mais desperto e concentrado. Levei muito tempo para entender que não é produtivo, no meu caso, virar a noite para trabalhar. Prefiro dormir e acordar mais cedo, se for o caso. Um dos rituais que tenho para escrever é um exercício que aprendi numa oficina de Angélica Freitas: começo escrevendo o que passa pela minha cabeça, sem relação com o projeto, sem preocupação com ortografia ou pontuação. Depois de 5 a 10 minutos, interrompo a escrita, deixo essas anotações para ler em outro momento e vou me dedicar ao que estou fazendo no momento. Gosto de usar dicionário analógico e gosto de ler sobre a etimologia das palavras-chave relacionadas ao projeto. Também uso o método pomodoro adaptado tanto para ler quanto para escrever. faço pequenas seções de 25 minutos, com 5 de intervalo e raramente passo de três horas sentado.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Escrevo quase todos os dias e em uma boa parte do ano consigo escrever de segunda à sexta, pela manhã. Vou revezando a escrita de poesia, com tradução, fichamento de leituras e resumos. Não tenho uma meta. Se tenho um prazo, se é uma demanda externa, se é uma encomenda, costumo funcionar melhor.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
No caso da poesia, eu estou pela primeira vez com um livro pensado como livro. Geralmente os poemas são escritos individualmente e quando aparece uma oportunidade, um convite de um editor, um concurso, vou montando os poemas e à medida que vou vendo recorrências e afinidades temáticas, estilísticas e estruturais, vou montando como um quebra-cabeças. E a partir do copião, faço a revisão, eventualmente cortando e inserindo poemas, ou mesmo reescrevendo alguns poemas incorporando novos elementos a partir de uma ideia de conjunto que vai ficando mais clara.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Se se trata de um projeto inadiável, obrigatório, recorro ao exercício de escrita automática, a livros na temática a que estou me dedicando e ao exercício da tradução. Já abandonei muitos projetos e procrastinei outros tantos. E aprendi a respeitar meu ritmo. Meu primeiro livro pode ser lido como o resultado de 22 anos de exercício com o soneto ou de mais de 10 anos de procrastinação. Só quando publiquei o livro entendi que esse foi o método possível para que o livro acontecesse. Faço vários projetos, abandono, retorno a alguns e concluo poucos.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Reviso muitas vezes, obessivamente, porque escrevo e trabalho como revisor para pagar as contas do poeta. Mesmo assim, ou melhor, por isso mesmo, submeto o que vou publicar à leitura de pelo menos uma pessoa de minha confiança, que não tenha pudor de dizer que tal trecho ou tal texto é muito ruim ou inadequado e pondero a partir dessas observações. Mesmo publicado, reviso e se há oportunidade de reimpressão, incorporo as alterações. Nunca ou quase nunca acho que meus textos estão prontos. Por isso recorro a outras pessoas e a palavra final é do(a) editor(a), organizador(a) da publicação. E sou muito receptivo a críticas/observações que apontam problemas concretos no texto.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Tenho uma relação muito tranquila com tecnologias e entendo que lápis, caneta, papel, celular, máquina fotográfica, notebook, tablet, programas de computador para edição e para criação literária etc. etc. são tecnologias. Depende sempre do projeto e de onde estou. Uso muito o computador e escrevo muitas coisas diretamente no word, mas tenho muitos cadernos, geralmente tenho pelo menos um bloco de notas quando saio e se não tiver uso o bloco de notas do celular para anotar uma ideia. Às vezes começo escrever à mão e na hora de passar para o computador vou fazendo as modificações. Gosto muito de escrever a lápis, meus fichamentos geralmente são escritos a lápis. Mas tem poemas e outros textos que escrevi diretamente no blogue.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativo?
Como todo escritor, vem principalmente com as leituras de outros livros. Sou uma pessoa muito aberta para novidades, tenho meus preconceitos e gosto de confrontá-los. Leio muito mais poesia que prosa e muito frequentemente meus poemas são respostas a outros poemas, são apropriações, pastiches, paródias. E sou leitor de enciclopédia. Verbetes em geral são fontes de inspiração. Adoro dicionários de todos os tipos, inclusive os de áreas de conhecimento que não domino. Desde que me entendo por gente cultivo o hábito de ter amigos mais inteligentes que eu, que são generosos e me indicam caminhos. Quando era mais jovem eram os professores que exerciam essa função e não por acaso alguns se tornaram amigos e não por acaso meu primeiro livro é dedicado a duas professoras fundamentais para a minha formação intelectual. Sou consumidor de arte em geral e sou uma pessoa extremamente curiosa.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesmo se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Tenho uma relação mais tranquila e processual com a escrita. Não sofro com o que não escrevo e escrevo o que preciso escrever. E aprendi desde a publicação do primeiro livro que o trabalho individual acaba no momento em que se quer publicar. Diria a mim mesmo se pudesse voltar aos primeiros textos que fosse mais cuidadoso com os registros, com a datação dos escritos, com as diferentes versões, que ser organizado poupa tempo. Diria também para ter mais paciência comigo mesmo, e que poeta é uma pessoa que escreve e publica poemas, que ser bom ou ruim é relativo e que a gente tem de fazer o que precisa fazer, o que é urgente fazer.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Tenho vários projetos imaginados e nunca iniciados. Alguns esboçados, como escrever para crianças e adolescentes. Outro projeto que gostaria de fazer e que ainda não comecei e provavelmente nunca poderei por questões pragmáticas: passar um ano apenas lendo e fazendo anotações sobre leituras de livros importantíssimos que não pude/não tive tempo/tive preguiça/ainda não tive coragem de ler. Sem nenhuma finalidade a não ser ler e tomar notas. Duvido que o livro que eu gostaria de ler não exista. Os que escrevo não são os que gostaria de ler, porque os livros que mais me interessam são os que jamais quereria/poderia/pensaria em escrever.Escrevo livros com a pretensão de que pelo menos uma pessoa tenha essa sensação, senão com todo o livro, com um texto, um poema, um verso.