Alex Andrade é escritor.

Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Geralmente acordo bem cedo, mas nesses tempos de pandemia tenho trocado as horas e a rotina acaba sendo modificada. Gosto da noite, do silêncio da casa, ouço música, experimento histórias, fico imaginando cenas, observo o dia correr e entre os minutos, vou criando um pouco os passos das personagens. Pela manhã sou mais preguiçoso, mas quando estou no processo de criação, costumo confundir o dia com a noite, a noite com o dia. É nesse processo que minha rotina diária tem seguido, são livros, filmes, documentários, séries e experimentos para que o tempo corra mais ameno.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Como disse na resposta acima, prefiro as noites, pois o silêncio me acompanha.
E o ritual é espontâneo, não anoto nada em papéis, não tenho o hábito de escrever com o laptop sobre a mesa, é tudo muito intuitivo. Sento na cama, uma loucura, pois haja coluna no dia seguinte. As vezes me deito, ensaio um cochilo, ouço música e até chego a meditar.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Escrevo um pouco todo dia, mas tem algum momento que me distancio de tudo para respirar. Geralmente não leio quase nada por completo, são leituras rápidas, uma olhada no mundo via televisão.
Minha meta é que as histórias cheguem naturalmente, sem pressão e com a medida exata.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
As histórias surgem nos pensamentos, nas observações, nos tempos naturais. E é nesse processo de inspiração que vou encaminhando o processo da escrita. Deixar fluir, sentir o espaço, o momento e seguir o fluxo. Escrever é isso, não? As histórias vão brotando e às vezes você consegue perceber onde começar e como, mas tem momentos que você tem tudo na mente e de repente esse começar não acontece. Então é o momento de respirar, pesquisar e fluir. Muitas vezes a pesquisa ajuda muito nessa dinâmica e a escrita vai ganhando forma. O processo da pesquisa, seja do enredo, da personagem, te abre um leque de possibilidades que move todo o conjunto.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Este é um dos maiores desafios para quem escreve. Não que eu me apegue a esses medos, mas eles são recorrentes. A pesquisa, as ideias, o enredo, a perspectiva, tudo isso vem em um mesmo pacote, por isso, quando me deparo com esses sentimentos, deixo fluir. Trabalhar em projetos longos requer paciência e principalmente, leveza. Até porque esse é o momento mais duro, quando você tem uma jornada longa. Requer calma, lucidez e ousadia.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Muitas vezes! Até no período da escrita de um capítulo eu leio e releio muito! Por isso as noites são um bálsamo para mim, pois não tem barulho e a minha leitura em voz alta me torna um ouvinte/narrador/leitor/crítico daquele momento descrito no papel.
E gosto de que algumas pessoas leiam esses momentos, por isso tenho as pessoas certas em que confio para isso. É bom saber qual sensação, o que se entendeu, se o que eu quis dizer ali faz sentido. Isso me encaminha de uma forma espontânea para seguir adiante ou até mesmo ressignificar as minhas ideias.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Tenho hoje uma relação boa, mas posso confessar que durante muito tempo escrevia à mão. Daí quando digitava era mais ou menos como reescrever a história. Mas hoje em dia prefiro a tecnologia com todo o seu aparato.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativo?
Sou um ser pensante. Em eterna transformação. Observo muito tudo, converso comigo mesmo, levo horas sozinho no banheiro refletindo as coisas do mundo, as pessoas, as atitudes e os acontecimentos. Sempre fui assim. Quando jovem, esperava todo mundo de casa ir dormir e me trancava no banheiro com um maço de papel, uma caneta e um livro para apoiar as anotações. Nesse ambiente fiz o meu refúgio e a conexão com a minha inspiração. Durante anos segui essa rotina. Hoje estou mais aberto aos outros ambientes da casa, a cama, por exemplo. E no quarto me concentro na música, outras vezes no silêncio que a noite traz e na rua, olhando da janela o que as outras janelas dos prédios podem nos revelar. São muitas histórias por trás daquelas cortinas.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesmo se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Mudou muita coisa e ainda está mudando. A cada livro você vai percebendo que é esse o grande barato: escrever nunca é igual. Quando releio um livro que escrevi há dez anos atrás, me reconheço naquele tempo, e percebo a necessidade que tive de me tornar o que hoje escrevo. Amadureci com os livros, sempre! Acho que o que diria hoje para aquele que fui ontem como um contador de histórias, é: continue, continue, continue. Leia muito, viva, valeu a pena!
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
São tantos projetos, tanta coisa para ser contada. Acho que agora estou no projeto que gostaria de fazer, no processo de uma nova história, e isso é bom. E quanto ao livro que gostaria de ler e que ainda não existe: os de todos os escritores. Sempre vão ter histórias boas para nos encantar. Por isso, repito o que disse para o Alex dos primeiros livros, continuem, continuem, continuem. Eu vos aguardarei!