Alberto Bresciani é poeta.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Infelizmente ou felizmente, como tantos de nós, tenho outra atividade. Sou juiz, profissão que, por um lado, obriga a muita leitura – de processos, documentos, artigos, livros jurídicos –, e, por outro, retira tempo precioso para me dedicar à minha família, à literatura e a outras ocupações que são importantes para mim. A alternativa revigorante é aproveitar, durante a semana, as primeiras horas da manhã, depois de algum exercício e antes de ser levado pela rotina. Entre uma coisa e outra, leio poesia. Leio com abandono, com régua e lápis para fixar imagens. A poesia é um elemento revigorante, que faz com que me sinta melhor, além de facilitar o transporte a uma dimensão mais lúdica e criativa. Sou, ainda, jardineiro e, nos finais de semana, os dias, invariavelmente, começam com as pendências dos meus cultivos.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Geralmente, escrevo pela manhã. É quando leio, quando entro em estado poético. Se algo se torna urgente, então vem a escrita. Mesmo que já não seja manhã. Algumas vezes, um único poema irá e voltará repetidas vezes. Em outras, uma sequência. A poesia responde a urgências, é uma reação. Penso que impor protocolos é perigoso e arriscado em termos de resultados. A manhã é um curativo. Não há preocupações, receios, assombros que não se resolvam ou melhorem com um novo dia.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Talvez os escritores de prosa possam obedecer a uma rotina. Não sei. Quando se trata de poesia, penso ser mais difícil. Há épocas de ideias prolíficas. Há épocas de silêncio. Assim, em termos de criação, é arriscado criar um ritual. O método é possível quando se trata de planejar um livro, de dar formato final aos poemas que o compõem. Aí sim, estabeleço um ritmo, cronometrado, inclusive, com o projeto de publicação.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Em regra, o processo de pesquisa, quando acontece, é posterior ao momento em que um poema ou um grupo de poemas me direciona a determinada temática. Sim, mesmo em poesia, se há um tema, é preciso que se conheça, que se leia sobre aquilo. Isto não só permite o alargamento do campo de criação, como a estimula. Deixar estagnado um projeto, no entanto, é quase condená-lo ao esquecimento. A retomada é muito desconfortável. Quando as precisões vêm de circunstâncias variadas, não haverá necessidade de pesquisa – a não ser daquilo que, realmente, é sentimento e exige a escrita.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Essas pausas, as travas da escrita, são terríveis. E parece não haver como evitá-las. Uma vez que se instalam, a impressão que vem é a de que nunca terminarão. A boa notícia é que acabam. Quanto às expectativas externas, tento não me lembrar de que existem. Desejo sim fazer um bom trabalho, ser lido, como todos que escrevem e publicam, mas, por circunstâncias pessoais várias, tento não criar um universo de tormento pessoal com a aceitação.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Reviso meus poemas um milhão de vezes – até publicá-los. A publicação é um alívio para isso, mas, sem sombra de dúvida, mesmo se retomar poemas publicados, ainda os modificaria. Meus textos nunca estão prontos. Tenho amigas e amigos aos quais mostro meus poemas, com os quais troco leituras. Essas leituras preliminares são fundamentais para medir o alcance do que escrevi em relação ao que pensei e, muitas vezes, alertam para pontos fundamentais, até mesmo para o descarte de poemas.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
O papel e o lápis sempre me convidam. O papel em branco é um desafio. Mas, hoje, escrevo no celular. Depois, encaminho os textos para meu e-mail. Dali, são repensados no editor de textos, impressos, relidos e transformados, agora sim no papel e no lápis, até chegarem à coletânea que esteja organizando ou a uma pasta de arquivos.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativo?
As ideias nascem de leituras, filmes, músicas, o movimento de uma ave, biografias, os meandros, epifanias e desastres naturais de cada dia que me aceita. A poesia responde a urgências, muitas vezes imprevisíveis. A leitura é a escola de todo escritor. Não há como escrever bem se não se lê. Ler, sobretudo, os autores contemporâneos, saber do que se fala e como se fala. Estar atento ao mundo é o melhor indutor à criação.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesmo se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
A escrita, de certo modo, fotografa um momento da vida de quem escreve. Tantas vezes, quando retomamos um texto mais antigo, voltamos, rapidamente, no tempo e às circunstâncias que o testemunharam. Como também nos transformamos, certamente faria muitas mudanças no que escrevi, mas seriam já outras circunstâncias, os poemas seriam outros. Normalmente, a primeira versão de um poema vem comprometida pela explosão. É preciso então reler e reler, pensar as palavras e os cortes, o som, o andamento. Faço isso com mais intensidade quando estruturo um livro.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Gostaria de ter tempo para escrever muito e sobre tudo. Gostaria de ter inspiração e vínculos suficientes com a contemporaneidade para isso e de modo útil. Gostaria de ler livros infinitos, todos já escritos, todos tentadores e impossíveis para o espaço de uma vida.