Adriana Vojvodic é doutora em Direito do Estado pela USP.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Nos últimos anos começo meu dia fazendo atividades físicas. Acordo por volta das 6h da manhã todos os dias, inclusive nos fins de semana, e faço atividades físicas 5 a 6 vezes por semana, por 1h ou 1:30h. Pedalo 4 vezes por semana e nos outros dias faço exercícios funcionais, alongamento ou pilates. Descobri que preciso desse movimento constante para fazer fluir a energia e com isso equilibro minha vida (e minhas ideias) mais facilmente.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Trabalho melhor durante o dia, especialmente de manhã. Quando quero escrever um texto, procuro fazer isso logo cedo, antes de checar meu celular, email, redes sociais. Quanto mais minha cabeça está desligada desses aparelhos, mais facilmente me concentro e as ideias fluem. Um exercício que sempre retomo é o de escrever, antes de começar a trabalhar, um texto de mil palavras, sobre qualquer assunto. Simplesmente começo a escrever. Normalmente depois de alguns parágrafos o texto começa a se transformar naquilo que preciso escrever no dia, ou em uma ideia nova que começo a desenvolver e o texto simplesmente vai fluindo. É um método conhecido entre escritores e mesmo se você não tem a escrita como objetivo, é uma forma de entrar no flow e ganhar mais foco e se centrar no trabalho intelectual.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Apenas quando tenho prazos é que tenho metas de escrita (quando estava no período final de entrega de tese, apresentação de relatórios de pesquisa ou entrega de artigos). Mesmo com prazos, escrevo um pouco por dia, não consigo concentrar tudo em poucos dias.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Para textos jurídicos ou acadêmicos tenho que ter delineado a estrutura do texto. Sempre começo identificando quais perguntas quero responder com o texto ou quais pontos quero defender e, a partir daí, o que preciso apresentar ao leitor para chegar a essas questões e suas respostas. Preciso saber de antemão o que quero com esse texto e procuro não incluir nada que não seja necessário para fazer esse caminho. Frases e ideias que não dizem nada são deletadas do texto final. Como processo, costumo escrever e reescrever muitas vezes e acho que o processo caminha como uma espiral em que todo o re-escrever me coloca um pouco mais para frente.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Normalmente a trava vem em um meio de caminho, a metade de um texto já começado e não consigo avançar. E normalmente isso acontece porque o texto foi caminhando para um lado que não permite mais que eu diga o que tinha em mente. Como se aos poucos tivesse me afastado daquilo que queria dizer, ou da forma que queria dizer algo. A forma mais eficiente de sair desses becos é voltar um pouco atrás e reescrever um trecho já escrito. Além de ser mais fácil por já saber o que quero dizer (então me tira daquele lugar de paralização), costuma te levar para outro lado e permitir que o que estava na sua cabeça seja escrito de outra forma. Descobri com o tempo que procrastinação costuma ser medo. Então nada melhor do que enfrentar ele de frente. Costumo procrastinar quando sei que, de cara, não vou escrever o que acho que deveria. Então começo a fatiar o processo e escrever tudo da forma mais banal, com palavras coloquiais, sem grandes fundamentações. Escrevo o miolo da ideia que quero desenvolver. Com isso fica mais fácil lidar e o próximo passo é desenvolver o texto e não criá-lo do zero.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Depende muito do tipo de trabalho e da minha confiança naquilo que estou defendendo. Em textos que serei avaliada ou que implicam em conseqüências maiores, mostro meu texto a amigos.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Só escrevo no computador. A estrutura do texto costuma ser feita à mão, pois não é um texto, normalmente é um esquema ou um desenho. Muitas vezes durante o dia tomo nota de ideias ou insights no bloco de notas do celular.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativa?
As ideias normalmente vêm nas horas em que você não está perseguindo ideias. No chuveiro, na bicicleta, na corrida. Para um trabalho específico em que tenho que ter ideias, um brainstorming com outras pessoas é a única forma que consigo criar. Criatividade vem de muitos lugares. Leio muito sobre assuntos não júridicos, vejo muitos vídeos. Ver o produto da criatividade alheia instiga a nossa.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesma se pudesse voltar à escrita de sua tese?
Tenho escrito textos não jurídicos e isso ampliou a minha liberdade de escrita, pois não há a mesma necessidade de fundamentar, justificar ou ancorar meu argumento em um conhecimento prévio e alheio. Isso me deu espaço para exercer uma maior autoridade sobre meu próprio texto, para falar por mim mesma. E por mais que quando volto aos textos jurídicos tenha que me ater à fundamentações, isso transformou a forma de encarar a escrita, que deve ser uma forma de comunicação. Pelo texto eu me comunico, ele não é um monte de palavras reunidas. Se meu leitor não compreende o que estou comunicando, há falhas no meu texto. Não há ideias, por mais complexas que sejam, que não possam ser comunicadas de forma simples e objetiva. Não há por que entender que um texto jurídico, por ser técnico, deve ser incompreensível a alguém que não é jurista.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Escrever com mais freqüência textos não jurídicos.