Adiel Machado é escritor.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Infelizmente, ou às vezes felizmente, escrever não é meu único trabalho. Todos os dias acordo bem cedo para ir para o escritório como outras pessoas, mas isso é o que torna a vontade de escrever ainda mais interessante. Como disse em outras oportunidades, escritores são eternos pesquisadores e cada detalhe dos nossos dias pode ser utilizado para nossas histórias. Geralmente tenho algo em mãos para ler, um livro curto, uma revista ou mesmo e-mails em qualquer pausa como uma fila da padaria ou intervalo do almoço. Contudo, meu ponto de maior preparo para a escrita é observar o comportamento das pessoas enquanto elas fazem diferentes atividades como esperar um ônibus, dirigem um carro, atravessam a rua e muitas vezes o quão egoístas e solitárias elas parecem.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Todos têm a sua “musa”, certo? Não tenho nenhum ritual de preparação de escrita, mas tenho alguns requisitos: meu local de escrita precisa estar limpo e organizado, que nesse caso é um canto da sala onde fica meu computador e alguns livros didáticos sobre escrita e comunicação. Sempre ouço música com fones de ouvido enquanto estou escrevendo, geralmente músicas que serviriam como trilha sonora da cena que estou imaginando ao escrever, preciso criar a atmosfera, o clima da história que preciso contar. Não costumo ter um horário fixo para escrever. Depende muito da disponibilidade também, no trabalho durante o dia tenho poucos intervalos para escrever e se o fizer acabo interrompendo o processo no meio e isso é muito doloroso para os capítulos, então acabo escrevendo mais durante a noite e madrugada.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Minha meta é estabelecida com base no formato final. Por exemplo se estou escrevendo pensando em um livro para ser publicado minha meta inicial é escrever dez mil palavras e só parar de escrever após ter dez mil palavras, levando o tempo que for necessário. Depois desse processo, volto a ler tudo e continuar a escrever, baseando mais na conclusão de episódios abrindo tramas ou encerrando atos dos personagens, varia muito. Quando penso em contos, tento me basear como se estivesse escrevendo uma carta: ter o mínimo de palavras possível e transmitir o ocorrido.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Geralmente não crio notas, tento me lembrar da ideia vinculada com algum acontecimento. Vem de um sonho, de uma notícia e muitas vezes de algo realmente que presenciei e participei. Minhas pesquisas são mais focadas em como determinadas áreas funcionam, como por exemplo entender como funciona o corpo humano ou uma investigação, saber como determinado profissional se comporta para criar personagens que tenham de fato uma personalidade própria. Costumo começar primeiro e criar um conceito para pesquisa depois para “lapidar” a história.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Se eu puder dar uma dica para quem está pesquisando e planeja escrever, minha dica é essa: você nunca vai atender todos os gostos e expectativas. As travas sempre acontecem, não há o que temer. Mesmo essas travas, ressacas, são parte do processo de quem escreve e uma boa forma de combater é ler novamente o que escrevi.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Quantas vezes forem necessárias para eu esquecer que fui eu que escrevi e achar que está bom, é difícil mensurar. Depois disso tenho amigos e minha esposa que fazem a primeira leitura, eles sempre dizem a verdade sobre o material e isso muitas vezes me leva a ler, deixar o material de lado por um tempo até ele amadurecer para ser reescrito.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Sempre no computador, às vezes pelo smartphone, minha letra à mão é horrível. Costumo em algumas ocasiões gravar áudios de descrição de cenários e outras ideias. Armazenar fotos de lugares que são inspiradores me ajuda bastante também!
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativo?
Criatividade é um mito! Uma amiga e professora da faculdade de Publicidade me disse isso uma vez e é a mais pura verdade. Todos os dias estamos em campo de pesquisa, com o tempo se aprende a observar e utilizar o que é bom. Muito do que eu escrevo é resultado de uma experiência de observação que vem desde minha infância, situações que presenciei, notícias que vi, histórias que ouvi. É fruto de uma pesquisa que também só vai parar quando eu morrer.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesmo se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Considerando que não sou escritor acadêmico, diria para meus primeiros textos serem mais simples, como são hoje. Esse é o maior desafio, escrever menos palavras e contar o mesmo capítulo. Provavelmente daqui alguns anos esse seria o mesmo conselho, escrever mais simples, menos palavras, menos enigmas.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Gostaria muito de escrever um roteiro propriamente dito, original meu ou mesmo adaptado de outro autor para um filme ou minissérie, participar de uma produção audiovisual além do livro. Já trabalhei com produção de comerciais publicitários no passado, mas não seria a mesma coisa, um filme deve ser bem mais empolgante! Já uma leitura que ainda não existe é difícil de dizer, temos muito material bom no mundo todo. Gosto bastante do estilo mistério, terror e policial. Seria interessante ler a resposta de um mistério bem sinistro, mas não sobrenatural, algo real.