Vanderlei Costa é multiartista.

Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
não costumo ter muita rotina, a não ser pelo fato de me esforçar para sair da cama antes das 9h, costumo ter pouco trabalho pela manhã, como estou morando numa casa e lá plantei horta, pela manhã costumo cuidar de plantas, dar atenção a gato e cachorro, conferir redes sociais, noticiários, e fazer algum ajuste em trabalhos voisuais ou de escrita que iniciei no dia anterior.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
geralmente trabalho melhor no fim da tarde ou no período da noite, como trabalho com linguagens interligadas e minha narrativa é muito plástica e imagética, acabo me afetando muito pelo que vejo, ouço ou vivencio com outras pessoas, não aproveito a maioria das ideias que surgem de mim, as que considero relevantes, costumo esquematizá-las em tópicos e posteriormente desenvolvê-las, ou deixar o fluxo me comandar.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
minha escrita não é tão cerebral, pragmática, em alguns momentos sou abduzido por um arrebatamento sobre o qual não tenho controle e me deixo ser comandado por esta energia, em outras ocasiões, escrevo por necessidade de cumprir agenda de uma apresentação que exige temas específicos e os desenvolvo para este fim, neste caso sou mais racional e objetivo. não escrevo diariamente, não me forço a ter este tipo de obrigação, até porque escrevo poesia ou letra de música para canções que meus parceiros enviam, neste caso a construção é guiada pela melodia, no caso de música, a canção se impõe, independente do tema que eu queira trabalhar, a poesia já ocupa um espaço mais livre, e quando faço música e letra juntas, tenho mais controle sobre o que quero dizer, já que posso alterar melodia para encaixar a palavra que acho melhor apropriada.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
não tenho método muito definido, compilo as notas, as organizo, altero e as encaixo de acordo com a narrativa que quero imprimir ao texto, costumo escrever e depois limar o excesso, minha escrita é concisa, enxuta, busco a depuração, a palavra imprescindível, sem muita gordura, ou floreios, às vezes inicio uma narrativa e ela se altera de acordo com o andamento do texto, busco um sentido para a escrita, conduzido pelo som e pelo ritmo.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
é sempre angustiante quando não consigo desenvolver uma ideia, principalmente, um trabalho sob demanda, quando me canso, não insisto, busco outros afazeres, fazer caminhadas é um ótimo recurso para captar ideias até então não acessadas, o intelecto no meu caso se desenvolve muito de acordo com as atividades e o movimento do corpo.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
faço inúmeras revisões nos meus textos, leio em voz alta, procuro eliminar palavras redundantes ou pouco expressivas para a narrativa, não utilizo a escrita como mero fluxo ou rascunho, não acredito nisso, acho que sempre posso melhorar o texto, nunca publico sem deixa-lo descansar, amadurecendo por pelo menos uma semana, é neste período ou mais que encontro problemas e busco soluções para aprimorar o texto, à vezes levo mais de um ano para concluir um poema. As redes sociais são ótimo termômetro para sentir se o texto afetou as pessoas ou não, embora eu não seja refém delas. Raramente submeto meus escritos a outras pessoas, no começo eu mostrava com frequência o que eu escrevia a pessoas do meu círculo íntimo, hoje estou mais seguro, não sinto esta necessidade.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
minha relação com a tecnologia é dúbia, a tecnologia digital veio pra facilitar, mas também para me causar ansiedade e angústia, consigo enviar um texto para dezenas de pessoas de forma rápida, porém meu tempo ficou muito em função desta tecnologia, começo qualquer rascunho no papel e só depois de concluído é que passo para o suporte digital.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativo?
eu queria muito ter uma resposta objetiva para esta pergunta, mas não tenho, ideias eu cato no ar, no bar, na festa, no show, no cinema, nos poemas que leio, nos livros que leio, nas andanças pela cidade, nas mazelas do mundo, no absurdo que é estar vivo e sóbrio, no movimento do vento, na natureza dos bichos e das plantas, num cheiro, numa escuta, tudo que me afeta pode sugerir ideias para a escrita.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesmo se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
muita coisa mudou ao longo dos anos, estou mais maduro, tenho quase 45 anos, não carrego o frescor lá dos primórdios, descarto mais ideias do que aproveito, estou mais exigente e consigo ter menos apego às minhas criações artísticas, muito menos coisas me arrebatam hoje, tenho maior domínio da escrita, não vislumbro o preciosismo como meta, persigo o frescor das coisas, busco a ousadia e não o comodismo, pois tenho hoje mais convicção do que não quero escrever ou expressar. A minha maior sorte foi não ter tido nada publicado antes dos 40 anos, a não ser um ou outro texto impresso em jornal ou coletânea, melhorei muito depois dos 30 anos, sobre o livro Subsoloamarelo que publiquei pela Editora Semim, eu deixaria alguns poemas de fora, mas também não carrego um peso por não ter tido esta percepção na época do lançamento, em 2017.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
eu tenho utilizado muito da minha escrita na música e nos videopoemas que estou gravando com Maurício Neves, portanto tenho vontade de desenvolver um espetáculo multimídia e mais abrangente do que o que tenho feito hoje, espero conseguir. gostaria de ler um livro de algum autor latino que já existe, mas que não tenho ainda conhecimento de sua existência, ou algum futuro livro da Pauliny Tort, ou do Welcio de Toledo e tantos outros livros que ainda não existem de autores que admiro.