Saulo Ribeiro é escritor e roteirista.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Não. Tenho uma filha de nove anos. Vive comigo desde que tinha quatro anos. Desde que ela chegou passei a demorar mais a concluir meus textos. Minhas manhãs são dela. E depois tenho a editora e leões para matar.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Passei a escrever no improviso das horas. Estou na fila do banco e tomo notas. Esperando alguém numa reunião, escrevo.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Eu sou muito voltado a projetos. Se tenho uma demanda de roteiro para cinema, por exemplo, levo comigo o conflito e dilemas dos personagens. E vou pescando frases e situações no meu dia que sirvam para dar sopro a eles.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Eu abro um arquivo e escrevo um título provisório. E depois vou para a segunda página e começo o capítulo. Uma linha ou duas. Então trabalho em função desse texto que surge, no ritmo dele. Começo a tomar notas. Se tenho ideias abro novos capítulos sem terminar o primeiro. E a pesquisa é um processo concomitante. Por exemplo, ouvi toda discografia do Black Sabbath durante a escrita de Os incontestáveis. Era o som que meus personagens ouviam. E passei a pesquisar a banda e a vida dos integrantes. Usei algumas coisas no livro. Outras não usei diretamente, mas deram mais seiva à narrativa.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Eu só vejo função na escrita se for para criar algo que você queira ler e ainda não descobriu um autor que escreveu. E nem digo aqui sobre qualidade, sobre originalidade. Falo sobre sentir-se dentro de algo que dê sentido aos seus sonhos e pesadelos cotidianos. Do contrário, é melhor ser leitor. Ler é bom demais. Então, eu só tenho um leitor a agradar nos meus textos: eu. O que não quer dizer que o processo seja solitário. Sempre vai aparecer gente que teve os mesmos sonhos e pesadelos. A obra se realiza aí.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Infinitas vezes. E mostro pra pessoas que possuem identidade com o meu tema. Os toques de quem olha de fora são fundamentais para enriquecer o trabalho. Costumo mostrar só depois que julgo pronto. E mexo bastante depois. E gosto de deixar decantar também. Deixar de ler por um tempo. Levei cinco anos para terminar meu novo livro.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Computador. E notas no celular e em cadernos. Mas costumo imprimir o arquivo e levar comigo na bolsa para reler e fazer anotações à caneta preta pilot 0.7.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativo?
São sonhos e pesadelos cotidianos. Ironias. Cenas. A realidade é um clichê. Gosto. Sou um observador dos viventes e suas idiossincrasias.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesmo se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
O tempo te deixa mais safo. Mais malandro. E isso se reflete no texto. Adoro meus livrinhos do passado. Mas jamais escreveria aquilo de novo.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Comecei um livro. Um romance. Vou ficar uns dez anos nele. Tem a ver com a Guerra do Paraguay, as estradas da América do Sul e espada de Simon Bolivar. Eu gostaria de ler este livro.