Regiane Folter é escritora.

Como você organiza sua semana de trabalho? Você prefere ter vários projetos acontecendo ao mesmo tempo?
Assim como me dedico à escrita independente, também trabalho com marketing e redação de outros tipos de conteúdos. Então, como tenho diversos focos e responsabilidades, procuro organizar bem meu dia a dia para ter tempo pra tudo. Normalmente, me dedico ao meu trabalho formal durante a manhã e parte da tarde, e reservo algumas horas entre o meio e o final da tarde para meus projetos como escritora independente. Às vezes esse cronograma muda um pouco de acordo com as demandas do cotidiano, mas tento manter uma rotina porque sou mais produtiva dessa forma. No momento em que estou me dedicando à escrita, procuro me concentrar em uma atividade ou projeto específico por dia. Prefiro ter um foco e um objetivo único para o dia do que ir pulando de foco em foco, já que sinto que me perco e me canso muito mais se faço isso.
Ao dar início a um novo projeto, você planeja tudo antes ou apenas deixa fluir? Qual o mais difícil, escrever a primeira ou a última frase?
Acho que um pouco de cada: gosto de ter um planejamento geral, uma ideia dos passos a seguir desde o começo até o fim do projeto, para poder definir atividades e metas claras. Gosto de ter prazos, isso me motiva muito. Mas não crio um planejamento super detalhado e rígido, porque também aprendi que no dia a dia as coisas fluem, você termina tendo outras ideias, e está tudo bem adaptar o plano inicial. Acho que ter essa flexibilidade me ajuda a me dedicar a projetos que muitas vezes são de longo prazo (como publicar um livro) mantendo a mesma motivação e paixão iniciais. O projeto se transforma ao mesmo tempo em que eu mudo e cresço, e isso é fundamental para mim.
Na minha opinião, a última frase é sempre a mais difícil de criar. Não me é difícil começar um texto, mas a conclusão me pega de jeito… Muitas vezes deixo o texto descansar por uns dias para poder voltar a revisá-lo com a cabeça fresca e somente aí consigo pensar no final.
Você segue uma rotina quando está escrevendo um livro? Você precisa de silêncio e um ambiente em particular para escrever?
Meu primeiro livro, AmoreZ, é fruto de um planejamento geral, como mencionei na pergunta anterior. Então sim, definir uma rotina e passos a seguir, com objetivos e uma frequência claras são boas ferramentas para o meu processo. Foram uns seis meses entre organizar e escrever os textos e logo trabalhar na produção do livro. Gostei muito dessa experiência e penso repeti-la quando tiver outro projeto de livro em vista.
Para escrever prefiro colocar alguma música de fundo, um som baixinho e inspirador que me ajuda a relaxar. Normalmente escrevo mais no computador, mas estou reaprendendo a magia de escrever à mão, então tento ter um caderninho por perto sempre. Independente da ferramenta, prefiro escrever sentada em uma mesa ou escrivaninha, me sinto mais cômoda assim.
Você desenvolveu técnicas para lidar com a procrastinação? O que você faz quando se sente travada?
Não tenho nenhuma solução definitiva ao problema da procrastinação; inclusive aceito dicas! Quando entro nessa fase, tento várias coisas, mas quase sempre começo buscando me dar um descanso. Saio um pouco, vou ver alguma coisa na televisão, conversar com alguém, caminhar… outras atividades não relacionadas à escrita pra ver se consigo descansar a cuca e refrescar as ideias. Depois disso, volto a pegar a lista de tarefas e mando ver! Às vezes sai algo horrível, porque nem sempre consigo entrar no modo inspiração. Mas me esforço para escrever ou realizar a tarefa que seja de qualquer forma, mesmo sentindo que está tudo ruim. Sempre é um começo, um ponto de partida pra melhorar.
Acredito que é importante ter espaços pra descansar, tirar férias e se desconectar da escrita de vez em quando. Como qualquer trabalho, é desgastante e precisamos recarregar as energias para que seja algo sustentável.
Qual dos seus textos deu mais trabalho para ser escrito? E qual você mais se orgulha de ter feito?
Um texto do qual me orgulho muito é uma crônica sobre minha relação com a minha mãe. Se chama Genética e é parte do meu livro AmoreZ. Além disso, também foi selecionada para fazer parte de um projeto chamado Musas, aqui no Uruguai, onde vivo. Sinto que é um texto muito representativo sobre mim e minha mãe, além de ser uma homenagem a ela. Minha mãe é, sem dúvida, minha heroína. Se posso me dedicar à escrita hoje é porque ela me apoiou e realizou muitos sacrifícios para me dar mais oportunidades do que teve.
Para mim, o mais trabalhoso sempre é a etapa de edição, nem tanto a escrita. Tenho a tendência de escrever muito e de divagar nos meus textos, então quando tenho que revisá-los e deixá-los arrumadinhos para a publicação, preciso de um bom tempo pra editar e corrigir tudo. Um texto que me deu bastante trabalho na hora da edição se chama Erro, também é parte de AmoreZ. Nesse texto, o narrador está dando dicas a alguém, e todo o trabalho de definir como conjugar os verbos foi bem chatinho!
Como você escolhe os temas para seus livros? Você mantém uma leitora ideal em mente enquanto escreve?
Escrever tem uma função muito importante para mim como pessoa, é algo terapêutico. Então meus temas são sempre coisas que mexem comigo, que me levam a refletir e questionar minhas atitudes. Conforme fui publicando minhas histórias no Medium, comecei a identificar pessoas que se identificavam com o que eu escrevia e assim pude definir um perfil de leitor/leitora ideal. Como tenho experiência com marketing, apliquei alguns conhecimentos dessa área para delinear quem são os que se interessam pelo que escrevo. Hoje em dia, mantenho esse perfil em mente quando estou trabalhando em algum texto.
Em que ponto você se sente à vontade para mostrar seus rascunhos para outras pessoas? Quem são as primeiras pessoas a ler seus manuscritos antes de eles seguirem para publicação?
Não me incomoda que outras pessoas leiam meus rascunhos, na verdade sempre achei muito positivo receber feedback antes de publicar algo. No processo da publicação do meu livro, contei com um grupo de leitoras-beta, amigas e colegas do mundo da escrita ou da comunicação, e elas me ajudaram a melhorar em muitos aspectos o que eu queria transmitir com AmoreZ. Também trabalhei com uma revisora que me ajudou a corrigir errinhos de gramática e até a melhorar a coesão e coerência dos textos.
Você lembra do momento em que decidiu se dedicar à escrita? O que você gostaria de ter ouvido quando começou e ninguém te contou?
Não me lembro exatamente de um momento decisivo que me levou a tomar esse caminho, acho que foi um processo muito natural. Desde pequena sempre li e escrevi muito, algo que aprendi muito cedo vindo de uma família de professoras! Uma lembrança que conservo com muito carinho é a de fazer um livrinho como trabalho escolar na quarta série e na biografia desse livro escrevi que quando fosse gente grande queria ser escritora. Naquela época tinha 10 anos e já sabia qual era o meu propósito, acho isso muito louco.
Gostaria de ter guardado algumas histórias que escrevi quando era mais nova. Terminei me desfazendo delas porque pensava que não eram boas o suficiente, mas lembro das ideias centrais dessas histórias até hoje, então sinto que foram significativas e gostaria de poder ler esses textos atualmente. Teria sido fantástico se alguém tivesse dito: “guarde esses textos, eles são parte da tua trajetoria”. Então hoje em dia digo às pessoas que não sejam tão perfeccionistas, que não esperem o texto perfeito para publicar ou compartilhar com os demais. Cada texto é valioso e cada texto nos ensina algo, então se joguem!
Que dificuldades você encontrou para desenvolver um estilo próprio? Alguma autora influenciou você mais do que outras?
Acho que ainda continuo definindo meu estilo, embora já tenha identificado algumas coisas que são recorrentes na minha escrita. Mas acredito que ainda tenho muito por melhorar. Para mim a dificuldade de definir um estilo próprio tem a ver com o fato de que estou sempre com vontade de experimentar coisas novas. Nos últimos anos mudei muito como pessoa, e essas mudanças estão refletidas na minha escrita.
Ultimamente me sinto mais identificada com o estilo da poeta Rupi Kaur e da autora independente Gabriela Araujo. Também admiro muito escritores como Camila Sosa Villada e Carlos Ruiz Zafón – espero aprender mais desses autores incríveis!
Que livro você mais tem recomendado para as outras pessoas?
Um livro que ultimamente recomendei a várias pessoas se chama “Notas sobre o luto”, de Chimamanda Ngozi Adichie. É um livro muito poderoso, que nos traz conforto especialmente nesse momento de crise mundial que estamos vivendo. Todos que já perdemos alguém especial vão se sentir identificados e com a leitura vai ter aquela sensação de que não estamos sozinhos na nossa dor. Muito recomendável.