Paola Santi Kremer é poeta.

Como você organiza sua semana de trabalho? Você prefere ter vários projetos acontecendo ao mesmo tempo?
Separo dias da semana para me dedicar a um ou outro projeto, quando possível. Se ambos prazos são curtos, me dedico a mais de um durante os dias. Tento evitar isso porque não são todos os dias em que consigo me dedicar aos projetos literários, de edição e tradução literária.
Ao dar início a um novo projeto, você planeja tudo antes ou apenas deixa fluir? Qual o mais difícil, escrever a primeira ou a última frase?
Deixo que cada texto determino seu rumo enquanto vou pensando que traço mais me interessa do que oferece para fortalece-lo. A última linha é a mais difícil, com certeza, não no sentido lineal do texto, mas no sentido de decidir quando termina um texto e o que continua sendo trabalhado já é um começo de maduração de outra.
Você segue uma rotina quando está escrevendo um livro? Você precisa de silêncio e um ambiente em particular para escrever?
Vivo a escritura, no momento, como a experiencia de plena autonomia da minha voz sobre a experiência, como a possibilidade de transformação da vida. E nesse sentido em que escrever é uma experiencia que começa antes da escritura, não há rotina que a contenha, está misturada à vida, é a vida mesma e ocorre quando alguma voz que me habita se amplifica e enche o espaço, tocando tudo. Quanto mais se expande meu fascínio pela voz, mais convencida estou disso: me interessa mais o desenvolvimento da autonomia das vozes que o de tatuá-las. A voz é a cor impossível de representar no entardecer da escritura.
Você desenvolveu técnicas para lidar com a procrastinação? O que você faz quando se sente travada?
Acho que a procrastinação é inevitavelmente o desenvolvimento de alguma coisa que se gesta, livre da noção de utilidade. Não tenho pressa para escrever.
Qual dos seus textos deu mais trabalho para ser escrito? E qual você mais se orgulha de ter feito?
Os textos que mais orgulhecem são os que me tomaram menos trabalho: são os que encontrei, não sei como, o ritmo de algum gesto vital sobre o qual a palavra pôde surfar. Surf ou não surf, disse um poeta argentino.
Como você escolhe os temas para seus livros? Você mantém uma leitora ideal em mente enquanto escreve?
Só me faço consciente dos temas principais depois de ler um conjunto. Ao final de trabalhar meu segundo livro de poemas, ainda inédito, em que os espirais intensivos da vida aparecem em ritmo e imagens, em uma clínica de obra com Rocío Muñoz Vergara, poeta espanhola que vive na Argentina, entendi que tenho um próximo livro se gestando em que o mar é o protagonista.
Em que ponto você se sente à vontade para mostrar seus rascunhos para outras pessoas? Quem são as primeiras pessoas a ler seus manuscritos antes de eles seguirem para publicação?
Às vezes mostro à minha família. Mas sempre que posso os levo à clínicas e oficinas com outras escritoras.
Você lembra do momento em que decidiu se dedicar à escrita? O que você gostaria de ter ouvido quando começou e ninguém te contou?
Desde o colégio, em que encontrava pouco espaço para a paixão além de levar bebidas alcólicas em garrafas de ginástica, a leitura e a escritura eram espaços de expansão certo fluxo de poder que me atraía. Entrei na faculdade de jornalismo seguindo esses impulsos, mas só entendi que essa não era a escritura que queria desenvolver quando um dos professores mais interessantes e apaixonados pela escritura me perguntou que (droga, acho) eu tinha usado para escrever uma reportagem.
Que dificuldades você encontrou para desenvolver um estilo próprio? Alguma autora influenciou você mais do que outras?
Enquanto leio me surgem as coisas que mais me interessam nos textos. Mas a leitura enquanto experiência sonora: as experiências de leitura mais intensas foram as que, entre a voz da escritora e a minha escuta, outra voz se gestou com uma música própria. Sempre menciono aqui Galáxias, de Haroldo de Campos. Li o poema como uma canção de percussão intensa que apareceu em poemas meus e só depois o escutei recitando-o, e Haroldo o havia composto como um mantra.
Que livro você mais tem recomendado para as outras pessoas?
Las Malas, de Camila Sosa Villadas, Cometierra, de Dolores Reyes, e uma seleção de poemas da June Jordan recentemente publicada na Argentina que se chama Cosas que hago en la oscuridad.