Neia Marques é poeta e escritora, autora de “Lapidaria” (Patuá).

Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Não sou muito diurna, mas, estou tentando me disciplinar para acordar mais cedo para escrever (meta de ano novo). Como trabalho em home office e tenho que cumprir meu horário de expediente, me resta pouco tempo para a escrita nos dias de semana, principalmente de manhã (só consigo escrever depois das 18:00 horas), por isso tento compensar escrevendo mais aos finais de semana.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Se eu pudesse me dedicar somente à escrita creio que escreveria o dia inteiro, mas como tenho que me adaptar ao pouco tempo disponível me sinto melhor escrevendo aos finais de semana quando não existe tempo pré-estabelecido ou compromissos para interromper. Não gosto de deixar as palavras suspensas.
Não tenho ritual específico, porém, gosto de escrever em silêncio (sem música).
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Tento escrever todos os dias, mesmo que sejam pequenos poemas, no entanto, nem sempre isso é possível.
Não estabeleço metas diárias porque sei que iria me incomodar não cumpri-las. Minhas metas são mais específicas, por exemplo, quando sento para escrever um conto só paro quando ele estiver pronto (a primeira versão, porque depois faço a revisão, cortes ou enxertos).
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Meu processo de escrita é diferente para cada tipo de texto, as poesias praticamente se impõem, sinto e escrevo (elas veem quase prontas); os contos se originam normalmente de notícias e pensamentos que me incomodam e que precisam ser relatados com certa urgência (por isso sento e escrevo em um só fôlego e depois reviso); Já as histórias longas, a essência, o tema, o esqueleto e até alguns diálogos vem intuitivamente, então, em um primeiro momento, coloco tudo no papel sem me importar com divisões e correções (para não perder os pensamentos), depois divido em supostos capítulos e vou destrinchando, é nesse processo que alguns personagens são acrescentados (outros retirados) e que a história vai criando forma.
Quanto às pesquisas, elas são feitas depois da história imaginada e ter sido elaborado o rascunho. Não imagino um tema e pesquiso antes, é durante o processo de escrita e lapidação que me aprofundo nas pesquisas.
Admiro o/as escritores/as que fazem pesquisa aprofundada antes da escrita, mas para mim esse método de pesquisa durante a escrita funciona melhor.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Como adiei a dedicação à escrita por quase 30 anos (mantive vários poemas engavetados nesse período), não me permito mais procrastinar nem me travar (não tenho mais tempo para isso). Talvez a maturidade tenha me feito entender que agora escrever é a minha prioridade.
Sobre às expectativas, mesmo que eu não corresponda (as minhas e a dos leitores), sei que preciso continuar escrevendo, afinal só melhoramos a escrita praticando.
Quanto aos projetos longos, confesso que acho mais cômodo escrever narrativas curtas, por isso, quando comecei a escrever o romance Lapidaria (editora Patuá), a ansiedade me atrapalhou um pouco, eu sentia urgência em terminar e isso causou alguns problemas que observei depois, por exemplo, não deixei o texto descansar o suficiente para fazer a revisão, entre outros.
Lembrando que como escrevi esse romance de forma quase orgânica (nunca tinha participado de nenhuma oficina literária, que alias recomendo, e nem conhecia técnicas de escrita, que acho importante o prévio estudo), o texto nasceu com alguns pontos que hoje eu alteraria (diminuiria o tamanho dos parágrafos, retiraria o uso do pretérito mais que perfeito, aprofundaria a caracterização de personagens, a descrição de ambientes, etc).
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Como a maioria do/as escritore/as, eu nunca acho que meus textos estão prontos, mas tem um momento que precisamos deixa-los nascer.
Aprendi com erros anteriores a controlar a minha ansiedade e agora deixo meus textos descansarem por um bom tempo, depois releio, reviso, corto, faço enxertos e lapido várias vezes, e sempre envio para leitores críticos para serem analisados (tudo que não fiz com o primeiro romance).
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Escrevo e organizo no computador, mas como as ideias veem em horas incertas (de madrugada, por exemplo), quando elas me acordam e me incomodam, anoto no bloco de notas do smartphone para não esquecer (e acredite, de manhã nós teremos apenas uma vaga ideia do que as musas da madrugada nos sopraram, caso não façamos anotações).
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativa?
Na verdade acho que as ideias veem de um conjunto de vivências, das histórias que minha vó contava, do ritmo da vida interiorana, da observação atenta dos fatos mais simplórios.
Dizem que os que escrevem tem a pele mais fina, que captam mais coisas, talvez as ideias venham daí, dessa conexão mais profunda com a vida e com as pessoas.
Leitura e artes em geral (músicas, danças, artes plásticas, teatros, etc) sempre nos elevam e nos tornam mais criativos. E principalmente sempre ter o olhar apurado e empático.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesma se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Acho que mudou o meu comprometimento com a escrita, hoje eu sei que não basta ter uma boa história, temos que estudar, conhecer técnicas de escrita, nos aprofundar e ler muito, para entregar um bom texto. Hoje me sinto mais capacitada e em constante busca de aprimoramento.
E com certeza eu diria a mim mesma: Calma, deixe de ansiedade, elabore melhor os seus escritos, mas nunca mais os engavete. Escreva, escreva, escreva.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Tenho alguns projetos que já estão começados ou finalizados aguardando publicação (meu 2º livro de poesias, meu 1º livro de contos e meu 2º romance), e tenho outros projetos que ainda estão pairando sobre a minha cabeça esperando o momento de me cutucar.
Sobre os livros que gostaria de ler? Penso na possibilidade de ler esses livros que ainda não estão na nossa existência e que também estão pairando sobre seus escritores, imaginem a possibilidade incrível de ler essas histórias que se impõem com tanta energia.