Menalton Braff é escritor.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Sim tenho uma rotina que vai de segunda a sexta. Levanto às 6h30, tomo o café e saio para uma caminhada no parque da cidade. Em geral, começo às 7h05 e termino as atividades físicas por volta das 8h30. Entre 9h00 e 9h30 sento na frente do computador. Respondo e-mails, passo rapidamente pelo face e abro algum documento iniciado no dia anterior. Quase sempre algum capítulo de romance.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Me sinto com mais fôlego para a escrita logo depois do banho na volta da caminhada. Às onze tomo uma taça de vinho com minha esposa e volto para o computador. Só paro às 12h. Meu ritual é, sentado na frente do computador, ler algumas linhas do que vinha escrevendo, fechar os olhos e tentar ver a cena que devo retomar. Em poucos minutos entro no clima que vinha desenvolvendo. Às vezes, à tarde volto a escrever, mas só quando concebo alguma ideia e tenho medo de perdê-la. O restante do dia vejo algum filme, leio sobretudo ensaios, às vezes contos ou romances (quando estejam bem longe do que estou fazendo).
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Escrevo um pouco todos os dias. Geralmente quando estou perto do final de um romance, passo mais horas no computador. Parece que sou empurrado por isso é difícil parar. No caso de conto acontece algo semelhante: quero chegar logo ao fim, por isso quase sempre o conto é expulso para o computador com certo sentido de urgência. Não tenho meta, pelo menos conscientemente, mas tenho uma média de produção que vai de 200 a 500 palavras. Sou muito lento na produção, vou e volto, troco palavras, inverto a ordem, enfim, fico namorando o que está escrito.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Algumas anotações na fase da concepção, não muitas. Sem precisar anotar, guardo na mente o início, o tema principal do texto, e o final. Sem o início mentalizado e o fim também, não começo. No início, tenho de saber para onde vou. E o meio, vou criando todas as situações que me levem ao fim conhecido. Claro que muitas vezes a narrativa me cria embaraços e sou obrigado a alterar alguma coisa das que pretendia. Alguma coisa como dizia o Erico Verissimo: a personagem começa a ter vida própria e seu narrador é obrigado a levar isso em consideração. De acordo com o Antonio Candido, os seres humanos têm o direito à contradição, as personagens de ficção não têm. Então é necessário obedecer às exigências das personagens.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Nem medo tampouco ansiedade. As travas existem, mas é uma questão de espera. Geralmente quando se tem de passar de um ambiente a outro com as mesmas personagens, é preciso que se estabeleça uma ponte, para que o corte não quebre a coerência. Então para tudo. Como criar esta ponte? Muitas vezes depois de uma hora olhando para o computador e não vislumbro o modo como fazer isso. Bem, vou para a cama e me convenço de que vou dormir. Antes do sono chegar, chegam as ideias e volto para o trabalho. É fácil entender por quê.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Durante a escrita costumo ir revisando. Mas é claro que erros gramaticais cometidos não são sempre vistos. Costumo a cada parágrafo voltar é fazer todo um trabalho de linguagem. Isso, contudo, não é feito com muito rigor. Com o texto terminado, estabelecido o discurso de início, meio e fim, então volto para a primeira página, leio tudo com muita atenção. Às vezes páginas inteiras são excluídas, ou inseridas, as faltas e as sobras são observadas, agora com bastante rigor. Então passo o texto para minha esposa (Doutora em estudos literários pela UNESP) e ela além da revisão final, discute aspectos que considera fracos, mas também os fortes.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Não sou fanático pela tecnologia, mas acho que nem sei mais escrever à mão. Antigamente, só escrevia na minha Olivetti. Então, teclado, pra mim, é uma exigência da minha capacidade de criar. Mas além disso, sei fotografar com o celular (rs), não viajo sem o tablet, sem o HD externo e essas coisas aborrecidas que não param de criar para que a gente gaste todo o salário do mês.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativo?
Me considero um bom leitor, e alguns livros sempre sugerem outros livros. Além disso, o mundo que me cerca está repleto de temas, de histórias e de linguagens. Quase sempre me envolvo com situações ficcionais sem as procurar.
Elas chegam e se impõem. Então é só trabalhá-las, modificando-as, acrescentando, omitindo, tornando algo transmissível em linguagem verbal.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesmo se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Uma das coisas que sinto ter mudado, é a busca mais constante da poesia na prosa. Outra coisa é a mudança de um texto com preponderância do conteúdo (panfletário) para um texto com predomínio dos aspectos estéticos. Comecei na literatura muito cedo, e muito cedo me envolvi com a política. De um político que escrevia passei a um escritor com pensamento político, mas que não faz proselitismo.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Há muito tempo namoro a ideia de escrever um romance histórico tendo como protagonista a Bárbara Heliodora, a esposa de Alvarenga Peixoto, mas isso demandaria alguns meses de pesquisa em Ouro Preto, só que não tenho condições de fazer isso. Até tenho algumas anotações, contudo insuficientes. Gostaria de ler um romance tematizando a fraternidade universal ouvindo a nona do Beethoven.