Mário Moreira é escritor, autor de Quando ele habitava Plutão.

Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Minhas manhãs são destinadas para atividades como trabalhar e estudar, não costumo ter rotinas matinais bem delimitadas; considero esse período o momento em que minha mente está se preparando para absorver informações e ideias que poderei usar no meu horário de escrita. Apesar de ser muito conversador, quando eu acordo gosto de ficar quieto. O silêncio da manhã é muito aconchegante para mim, então, falo pouco e aguardo minha empolgação chegar (o que não demora de acontecer).
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação v para a escrita?
Minha mente começa a trabalhar bem no fim da tarde e durante a noite, sobretudo depois das dez da noite. Acho que esse é um “mal” quase todo mundo que escreve. É como se à medida que a noite vai chegando e avançando mais as ideias começam a fluir com facilidade. Minha preparação é simples: respiro fundo, relembro algumas ideias que juntei durante o dia, escolho uma música e, por fim, começo a escrever.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Normalmente escrevo em período concentrados. Como nem todos os dias eu tenho algo novo para acrescentar na história que estou fazendo, então, espero me sentir à vontade para retomar a escrita, e é bem nesses momentos de retorno que volto com todo o gás. Quando começo a escrever eu só paro ao perceber que coloquei no papel toda, ou quase toda, a ideia acumulada.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Meu processo de escrita começa com anotações. Muitas anotações. Qualquer ideia que passa pela mente ou qualquer informação que captei nas minhas pesquisas e que considero ser útil em algum momento futuro, eu anoto. A partir delas é que consigo ser guiado durante escrita.
As anotações facilitam organizar e dar vida às minhas ideias, é fato, mas nem sempre é fácil encontrar o jeito certo de começar ou então achar aquela forma que vai saciar nosso instinto perfeccionista de escritor. Ainda assim, uma vez que fiz minhas pesquisas e notas, ajustei os passos que preciso seguir para iniciar, ou reiniciar a história, decido pôr em prática a escrita; muitas vezes admito pra mim mesmo que não preciso já iniciar escrevendo com perfeição, pois em algum momento voltarei a reler a história.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Devo admitir que posso escrever durante quatro dias seguidos e depois passar um mês sem fazer nada. São essas “pausas” que me deixam, às vezes, preocupado e irritado me levando a pensar que essa “lerdeza” fará com que meus projetos se tornem menos importantes ou que essa procrastinação leve meus projetos a serem pouco atraentes; quando o projeto é longo a ansiedade é mais intensa, porque existe muito a ser feito que nem sequer foi começado. Entretanto, faz algum tempo que aprendi a aceitar que os períodos de procrastinação nunca se tornam inúteis. Quem escreve sabe que podemos não escrever uma única palavra por várias semanas, mas que a nossa mente está incessantemente trabalhando; a mente do escritor quase nunca procrastina, porque ela é muito eficiente em nos perturbar com o próximo parágrafo que deve ser feito, com o que o personagem principal fará, quem deve ou não morrer, qual personagem secundário deve ter função importante para a história, etc. Então, minha procrastinação eu combato fazendo outras coisas que não estejam diretamente ligadas a escrita e, então, de repente, ô animo e ideias começam a voltar.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Eu sou muito rígido comigo mesmo. Reviso meus textos dúzias de vezes até ter total certeza de que ali não há mais nada a ser acrescentado ou tirado. Devo dizer que minhas revisões inúmeras vezes ocorrem graças a opinião de um ou dois amigos que leem o que escrevi e se prontificam a fazer suas críticas sobre o texto (muitas vezes, críticas ácidas) e que abrem meus olhos para melhorar, e muito, a história. Para nós, como escritores, revisar nossos textos com cuidado é extremamente importante, mas é preciso que um outro alguém faça uma revisão e crítica no intuito de encontrar lacunas que deixamos passar.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Na maioria das vezes escrevo meus rascunhos direto no computador. A ideia vem e logo digito, corrijo, acrescento novamente e assim vai. É mais rápido e consigo acompanhar a rapidez da minha mente à medida que digito. Porém, como não se deve confiar de olhos fechados na tecnologia, me vejo na obrigação de depois passar partes importantes do que digitei para o papel. Isso deveria ser feito por todos, pensando no nosso próprio bem (risos).
Eu tento manter meus rascunhos divididos entre o papel físico e o computador. É mais seguro. Também é válido dizer que muitos dos rascunhos que faço começam primeiro no bloco de notas do meu celular (o que me salva em muitas ocasiões em que não estou nem com papel, nem com computador).
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativo?
Minhas ideias partem da união de quatro coisas: músicas, livros, filmes e observação do dia a dia. Muito do que escrevo e já escrevi partiu desses elementos. Cada um deles me forneceu ideias incríveis e não poderia negar a influência que tive. Então, meus hábitos sempre estão ligados a ver um filme, ler um livro, ouvir músicas e andar. Em algum momento vou ser captado por um deles e vai me dar uma ótima ideia para escrever ou a solução para um problema que eu esteja querendo solucionar dentro da escrita.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesmo se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
À medida que os anos foram passando eu aprendi a não ter pressa ao escrever, não ser apressado ao querer chegar logo ao desfecho da história. Às vezes, é preciso deixar a história tomar seu próprio tempo em vez de querer passar por cima dos eventos e, consequentemente, perder a chance de escrever ótimos capítulos.
Se eu pudesse voltar no tempo, diria a mim mesmo: Anote tudo, escreva em um papel. Não confie apenas na sua mente, porque ótimas ideias podem se perder.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Gostaria de trabalhar com um projeto onde a narrativa fosse feita em forma de cartas. É uma grande vontade que tenho, mas não me considero, ainda, preparado.
Um livro que gostaria de ler e que ainda não existe é um em que narra a trajetória humana desde o seu surgimento até o ponto em que ela superou suas diferenças discriminatórias e sua indiferença aos menos favorecidos. E no final desse livro quando eu lesse: E TODOS FORAM FELIZES PARA SEMPRE, não seria apenas um final comum típico de contos de fadas, mas representaria o destino final e real da humanidade.