Maria Eugênia Moreira é escritora, autora de “Três Palmos”.

Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Não mantenho rotinas congeladas, para cada dia, um começo! Existem hábitos, porém, que tento manter, como o alongamento e a leitura de 20 páginas de algum livro ou revista antes do café da manhã.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Acho que trabalho melhor no final do dia, quando sento com calma e com a cabeça ainda funcionando. Costumo colocar uma música no ambiente ou um vídeo-poema – qualquer coisa que tenha uma voz diferente da minha – e escrever distraída. Acaba dando certo e sendo menos solitário (risos).
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Escrevo em períodos concentrados, mas estou sempre rascunhando alguma coisa. Sobre metas, já tentei muito estabelecer objetivos e exercícios de escrita diários, mas acabo não sendo honesta com o meu ritmo e por isso nunca dura. Por outro lado, sigo à risca minhas metas de leitura! Vai entender…
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Acho que depende do objeto da escrita. Existem textos mais doídos que outros e, por isso, mais difíceis de serem trabalhados. Por outro lado, existem textos que quase se formam sozinhos e em velocidade surpreendente! Eu costumo juntar e costurar rascunhos que se comunicam e não se cancelam, misturando objetos mas mantendo o sentimento frente a eles. Às vezes dói e demora, outras diverte e demora também. É sempre relativo.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Eu me distraio. Tento sempre encarar a escrita como um desabafo que precisa ser formulado para que se entenda e, com isso, acabo presa em um mesmo texto por meses. Claro que existem as travas que dificultam ainda mais o processo, tal como o medo de não ser bem recebida ou gostada, mas tento encarar isso como sendo partes naturais de todo projeto e também como partes que me escapam qualquer controle. Me frustro muito, claro, mas tenho aprendido a respeitar o punho que segura o lápis, acima de tudo. Sem atropelamentos.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Muitas! Como eu disse, passo meses presa em um único texto, fazendo novos arranjos e mudando os finais. Tenho muita dificuldade em bater o martelo e dizer que o texto está finalmente pronto, tardo ao máximo esse fechamento. Costumo mandar os rascunhos para alguns amigos sempre antes de publicá-los, esperando apontamentos e opiniões e, não raramente, acabo mudando o texto inteiro antes mesmo de receber a resposta sobre a versão enviada.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Tenho uma boa relação com a tecnologia, acredito que ela disponibiliza ferramentas que possibilitam um brincar com as palavras muito interessante. Eu costumo escrever à mão, mas muitas vezes recorro ao computador buscando maneiras de dar corpo ao texto que, com a caneta, parece mais difícil. Acho positivo, também, que no computador a gente faz a escolha da fonte da letra, porque minha caligrafia no papel é desastrosa (risos). Acabo sendo mais legível online.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativa?
Minhas ideias vêm do cotidiano, eu acho. De como ele me afeta e de como me vejo afetando ele também. Não acho que existam grandes hábitos para se deixar afetar pelos acontecimentos do dia, tento apenas me manter sensível. Me mantendo sensível, mantenho uma criatividade, uma fabricação constante de impressões e, consequentemente, mantenho uma escrita acontecendo.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesma se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Acho que a cobrança. Com os anos fui me cobrando menos quanto a forma, a robusticidade e o conteúdo das coisas que escrevo, deixando o processo menos rígido. Hoje em dia escrevo de maneira mais orgânica, menos enfeitadinha (risos). Se eu pudesse, desafrouxava esses nós nos primeiros textos que escrevi, aposto que ficariam melhores! Desenrijecer o punho me ajudou muito.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Queria muito, em algum momento da vida, escrever um bom livro de contos. Gosto muito desse gênero, me arrisco bastante nele, mas acho extremamente complexo a montagem de um livro nessa linha. É uma paquera para o futuro. Sobre o livro que eu gostaria de ler e que ainda não existe, acho difícil responder. Existe livro sobre tudo, escrito de mil maneiras diferentes. Mas, confesso, adoro livros sobre a abundância de culpa nas pessoas, um novo livro sobre o tema seria muito bem vindo!