Maria Eugênia Moreira é escritora, autora de “Urucum” e “Três Palmos”.

Como você organiza sua semana de trabalho? Você prefere ter vários projetos acontecendo ao mesmo tempo?
Costumo organizar a semana usando como critério a importância de cada compromisso para a sua realização. Geralmente acabo me superestimando e pegando mais projetos do que deveria, ficando com os dias cheios – além de tudo, ainda curso psicologia, então minha semana fica uma loucura! Ultimamente eu tenho tentado me atentar mais a isso, pegando um projeto de cada vez ou um punhado um pouco menor (risos).
Ao dar início a um novo projeto, você planeja tudo antes ou apenas deixa fluir? Qual o mais difícil, escrever a primeira ou a última frase?
Sabe, eu sou uma pessoa um tanto ansiosa, então planejar tudo – de cabo a rabo – é a minha especialidade. Não que eu siga sempre o planejamento (risos), mas ele costuma existir, sim. Quanto à segunda pergunta, eu acho que depende. Pessoalmente, e no momento atual, tenho enfrentado grandes dificuldades quanto à finalização dos meus textos, mas tanto a primeira quanto a última frase sempre exigem um pouco mais do escritor: a gente precisa fugir do “era uma vez” e dos piegas.
Você segue uma rotina quando está escrevendo um livro? Você precisa de silêncio e um ambiente em particular para escrever?
Hoje em dia, não. Tenho tentado naturalizar o meu processo de escrita, fazer com que vire um costume cotidiano, sem grandes preparações ou superstições. Tenho me adaptado a escrever em ambientes cheios e barulhentos (como nas salas de aula e nos transportes públicos), o que têm contribuído para a minha escrita, principalmente ao que diz respeito à quantidade de material produzido.
Você desenvolveu técnicas para lidar com a procrastinação? O que você faz quando se sente travada?
Infelizmente, não. Nem tento. Para mim, a procrastinação também é um comportamento (ou um não-comportamento) importante para o processo de elaboração do que pode vir a cair no papel. Já lutei muito contra as travas e as preguiças, hoje em dia lido com tudo isso de maneira mais leve, sem forçar uma produtividade – isso costuma contaminar o texto.
Qual dos seus textos deu mais trabalho para ser escrito? E qual você mais se orgulha de ter feito?
O texto que mais me deu trabalho para ser escrito foi o romance Três Palmos. Não pela escrita em si, mas pelo trabalho psíquico por trás do texto. Cada página era um grito. Difícil escolher um texto que me orgulha mais que os outros, sequer sei se me orgulho de algum deles (risos). Claro, tenho mais afinidade com uns do que com outros, como uma mãe mais próxima de um dos seus cinco filhos. Um deles é o chamado “Rezo por você de madrugada porque sinto vergonha de Deus”, texto que dá início ao meu primeiro livro, Urucum (Editora Penalux, 2020). Esse com certeza é um dos meus textos-xodó.
Como você escolhe os temas para seus livros? Você mantém uma leitora ideal em mente enquanto escreve?
Acho que é mais uma possessão do que uma escolha. Não sei explicar. Basta um gatilho para que um assunto passe dias na minha cabeça e, quando isso acontece, os livros viram produto dessa obsessão. É uma consequência e, tal como as consequências, não existe muito planejamento – tampouco um ideal (de leitora, de gênero discursivo, de nada).
Em que ponto você se sente à vontade para mostrar seus rascunhos para outras pessoas? Quem são as primeiras pessoas a ler seus manuscritos antes de eles seguirem para publicação?
Sinceramente? Muito. Para mim a escrita nunca foi tão individual e secreta assim, não considero nada de muito sagrado nas coisas que escrevo. Costumo deixar rascunhos inacabados por aí: nas redes sociais, nas folhas espalhadas, nos cadernos emprestados. Sou pouco retraída, embora tenha muita vergonha da ideia de ser lida de maneira séria. Costumo, também, enviar rascunhos para amigos escritores e outros amigos interessados, como a escritora Julia Grilo (Cães, Editora Penalux) e o meu amigo-confidente-crítico Luca Nieri.
Você lembra do momento em que decidiu se dedicar à escrita? O que você gostaria de ter ouvido quando começou e ninguém te contou?
Lembro! Eu devia ter uns quatorze, quinze anos. Já ouvia de alguns professores e amigos que escrevia bem para a pouca idade, mas o que me levou para a escrita mesmo foram o hábito de leitura e os nomes do mundo artístico, como Domingos de Oliveira. A primeira vez que ouvi Domingos recitando “O Homem Lúcido”, soube que queria viver tentando dizer coisas tão bonitas e reais como aquelas. O que eu gostaria de ter ouvido quando comecei, porém, é que o mercado editorial é uma bolha – não tão difícil de penetrar, mas difícil de fazer parte. E isso pouco tem a ver com talento e capacidade.
Que dificuldades você encontrou para desenvolver um estilo próprio? Alguma autora influenciou você mais do que outras?
A insegurança com certeza foi a maior dificuldade.É difícil estabelecer um estilo próprio quando não existe segurança suficiente para bancar tal estilo dentro do texto. Demorei para desenvolver esse empoderamento e até hoje ralo com isso. Um autor que com certeza tem grande aparição nos modos com que escrevo e com que me comporto na literatura é o escritor carioca Victor Heringer. Um baita homem!
Que livro você mais tem recomendado para as outras pessoas?
Ela se chama Rodolfo, da Julia Dantas e Faroestes, do gigante Marçal Aquino.
* Entrevista publicada em 10 de julho de 2022.