Maria Edileuza é escritora e embaixadora.

Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Com a instituição do trabalho remoto que nos impôs a pandemia, mesmo trabalhando em casa a maior parte do tempo, tenho buscado manter rotina para o trabalho interno, com horários, reuniões on line com equipe para distribuição de tarefas, discussão de temas e planejamento e avaliação das atividades da Embaixada. Procuro manter o horário de 09:00 às 17:00hs de jornada, embora as diferenças de fuso horário nos obriguem a adaptações.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Começo sempre em torno das 09:00 da manhã, quando me sinto com mais energia. No meu caso, tenho que escrever sobre diferentes temas (política interna dos países sob minha jurisdição (Bulgária e Macedônia do Norte), o que inclui aspectos da economia, educação, cultura saúde (acompanhamento da pandemia), meio ambiente, turismo, eleições e partidos políticos, entre outros. Também acompanho aspectos das relações exteriores desses países, tanto no plano bilateral e regional (contexto balcânico), quanto multilateral (ONU, OTAN, União Européia, entre outros). Assim, busco ler as últimas notícias e publicações antes de escrever. Também tomo um café e tento evitar interrupções enquanto escrevo (no que dificilmente tenho sucesso).
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Escrevo relatórios e informações todos os dias, relativos a pelo menos três temas diferentes. No entanto, quando tenho que escrever artigos mais alentados para publicação, aproveito os finais de semana quando posso evitar interrupções da rotina diária.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
A página em branco é sempre um grande desafio para todos. Assim, antes de começar a escrever, busco esboçar mentalmente a estrutura do texto, de forma a privilegiar a clareza, coerência e objetividade. Assim, ao inicar a escrever a primeira frase, já tenho presente o encaminhamento do raciocínio. As referências e ilustrações que vão surgindo ao longo do caminho da composição de um texto vão sendo incorporadas à estrutura central. Sempre que me deparo com a folha em branco, recordo um poema do escritor modernista espanhol, António Machado que diz: “…Se hace el camino al andar”.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Para contornar as travas, que creio constantes e naturais para todos, busco convencer-me de que somente eu poderei fazer aquilo a que me proponho. Assim, tenho uma espécia de auto-pressão para “deliver”.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Confesso que tenho grande dificuldade com o processo de revisão. Tendo a escrever em “um jato” e recorro a apoio para verificar datas, nomes e “typos”.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
A tecnologia é essencial para tornar mais ágil a pesquisa, a busca de referências, a confirmação de dados, a ilustração de racioncícios. O computador já é parte indissociável de meu processo de escrita.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativo?
Como não escrevo ficção, na maioria das vezes respondo a demandas sobre temas específicos. Busco escrever meus textos sempre com o apoio de dados e informações, muitas vezes com recurso a fontes primárias. A criatividade é exercitada no que diz respeito ao esforço de captar a atenção do leitor para a idéia central do texto.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesmo se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Para mim, a escrita é como um músculo que se exercita. Quanto mais escrevemos, mais fácil se torna o processo. Naturalmente, ao escrever hoje deparo-me com mais fluidez do que no início da minha carreira, quando sempre temos muito mais dúvidas e inseguranças advindas do fato de termos menos conhecimento e experiência. Em compensação, tínhamos a coragem da juventude – tão grande que levamos a vida toda para perdê-la.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
A idade nos leva a um momento em que temos mais passado do que futuro e isso me inspira a escrever sobre o que vivi, pessoas que conheci, culturas que frequentei, momentos de importancia histórica que vivi, coisas sem-importância que me marcaram. Mas isso ficará para depois da aposentadoria.
Vejo hoje que valores que tínhamos como conquistas humanísticas consolidadas, especialmento no que diz respeito a princípios democráticos, direitos humanos (incluindo discriminação racial), preservação ambiental, ciência, estão sendo contestados. Há reflexão sobre o assunto, mas não vejo nada que justifique o desejo que, como humanos imperfeitos, temos de caminhar para trás. Gostaria de ler livros que nos ensinassem que a trajetória do crescimento humanístico poderia dar-se sem retrocessos, sem a negação de todo o patrimônio construído ao longo de tantos séculos.